Justiça tira bebês de famílias em ‘situação de risco’
Justiça tira bebês de famílias em ‘situação de risco’
© Estadão
A Vara da Juventude de Belo Horizonte tem dois meses para explicar o encaminhamento compulsório para abrigos de 120 recém-nascidos sob o argumento de estarem em “situação de risco”. O problema foi atestado pelo Conselho Nacional dos Direitos Humanos das Crianças e Adolescentes (Conanda), da Secretaria de Direitos Humanos do governo federal, e chegou à Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA) e ao Alto Comissariado de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU). No início do mês, foi tema de audiência pública na Câmara dos Deputados, em Brasília.
Em quatro anos, quase quintuplicou o número de bebês separados de suas mães nas maternidades públicas da capital mineira, por ordem da Vara da Infância e da Juventude, e enviados para abrigos. Foram 29 casos em 2013; 72 em 2014; 140 em 2015; e 132 em 2016. Filhos de mães em situação de vulnerabilidade social, os bebês foram, em muitos casos, colocados na sequência para adoção. A escalada dos números chamou a atenção de funcionários da Secretária Municipal de Saúde.
Aline Paula de Oliveira, de 28 anos, conta que foi separada de seu primogênito, Zion, de 6 anos, ainda na maternidade, por ordem da Justiça, por ser dependente química. “Não me deixaram nem amamentá-lo. Eu não estava drogada (na época do parto). O sonho de ser mãe tinha me feito reduzir o consumo de crack.” O garoto foi dado para adoção e hoje a mãe sonha em poder revê-lo.
As denúncias de afastamento compulsório começaram em 2011 em Belo Horizonte. Em 2014, a orientação, até então informal, foi formalizada pelo Ministério Público de Minas, com a publicação de duas Recomendações (n.º 5 e 6), que orientavam “médicos, profissionais de saúde, agentes comunitários, gerentes e responsáveis por unidades básicas (…)” a avisar à Vara da Infância e da Juventude sempre que uma mulher em “situação de risco” fosse dar à luz. O objetivo era saber se a mulher queria dar o filho para adoção e apurar se havia negligência ou se a mãe era usuária de drogas.
Em 2016, as recomendações viraram a Portaria n.º 3. Assinado pelo juiz da Vara da Infância e da Juventude de Belo Horizonte Marcos Flávio Lucas Padula, o texto foi modificado e passou a prever “apuração de responsabilidade criminal” contra quem não a cumprisse. Seriam investigadas infrações do artigo 132 do Código Penal (expor a vida ou saúde de outrem a perigo direto e iminente, com pena de detenção de três meses a um ano) e do artigo 236 do Estatuto da Criança e do Adolescente, o ECA, (impedir ou embaraçar a ação de autoridade judiciária, membro do Conselho Tutelar ou representante do MP no exercício de função, com pena de detenção de seis meses a dois anos).
Foi do próprio Padula a maioria das decisões de afastamento compulsório de bebês. Diante dos protestos, o magistrado suspendeu em agosto deste ano a vigência da Portaria n.º 3.
A explosão no número de casos, envolvendo em geral mães pobres, pretas e pardas, desencadeou acusações de higienismo e preconceito contra a Justiça e de suposto atropelo no processamento regular das adoções. Com as recomendações e, depois, com a Portaria, o Conselho Tutelar (responsável pelas investigações familiares) teria sido afastado das ações. “Não é crime usar droga, não é crime morar na rua”, diz a presidente do Conanda, Fabiana Gadelha, que esteve em Belo Horizonte em setembro e considerou haver irregularidades. “Não há nada na lei que diga que essas mulheres não tenham o direito de dar à luz e sair da maternidade com seus filhos.”
O juiz é alvo de uma reclamação disciplinar apresentada ao Conselho Nacional de Justiça em 3 de outubro e encaminhada à Corregedoria Nacional de Justiça no dia 5, segundo o órgão. A Corregedoria não informou o conteúdo da reclamação, que tramita em sigilo e foi apresentada por uma pessoa – não por uma entidade. Um juiz analisará preliminarmente a reclamação e, se julgar cabível, dará andamento a ela, determinando eventuais diligências que considere necessárias.
No âmbito estadual, a Corregedoria-Geral de Justiça do Estado de Minas Gerais informou, em nota, que “instaurou procedimento para apurar denúncias e verificar se há alguma irregularidade decorrente da aplicação da antiga portaria, que está suspensa”. Segundo o órgão, “uma nova edição da portaria está sendo elaborada com aperfeiçoamentos e estão sendo ouvidas instituições como Ministério Público, Defensoria Pública e representantes do Conselho Nacional de Justiça”.
Padula nega irregularidades. Diz que há “uma campanha de calúnia e difamação” contra a Vara que comanda há anos.
A retirada compulsória de bebês nas maternidades tornou-se mais visível em Belo Horizonte por causa das recomendações e da Portaria, mas não é restrita à capital mineira. Todas as pessoas ouvidas pela comissão do governo federal que investiga os casos de BH relatam que a retirada ocorre em todo o País.
“A questão central nessa história toda é que essa medida vem sendo adotada como se fosse uma solução”, destaca Paulo Silveira, do Movimento Respeito é Bom e Eu Gosto, que atende população de rua, usuários de drogas e pessoas com distúrbios mentais. “É o Estado que não cumpre o seu papel de recolher essa menina, essa mulher. O Estado não permite que ela diga não à gravidez, mas também não permite que diga sim à maternidade.”
Definição. Uma das dificuldades de avaliar o encaminhamento compulsório de bebês a abrigos é a definição de “situação de risco”. Abrange de moradores de rua a pessoas com problemas mentais, passando por dependentes de drogas e vítimas de violência doméstica. Nenhuma dessas condições, por si, pode determinar a separação de mãe e filho. Segundo ECA, somente abuso, maus-tratos e abandono podem afastá-los. Mesmo assim, toda a família extensa da criança – avós e tios, por exemplo – deve ser escutada e considerada como potencial responsável. Além disso, é assegurado o direito pleno de defesa da mãe. Ou seja, ela precisa ser ouvida.
Em nota, a Secretaria de Saúde de Belo Horizonte afirmou que “defende a união familiar até que se comprove a incapacidade da mãe ou do familiar mais próximo de cuidar da criança, ou que se comprove a possibilidade de a criança sofrer danos no convívio com a mãe”. / COLABOROU FABIO GRELLET
Fonte: MSN
Crianças e adolescentes passam
anos à espera de adoção
Muitos chegam aos 18 anos sem nunca ter encontrado uma família.
Campanha na internet mostra os adolescentes que sonham com a adoção.
De acordo com o Cadastro Nacional de Adoção (CNA), do Conselho Nacional de Justiça, há cerca de 7,2 mil crianças aptas para adoção no Brasil. Muitas delas permanecem em abrigos por anos até que sejam recebidas por uma nova família. Outras chegam à maioridade na instituição e precisam procurar outro lugar para morar.
Em um abrigo de Jacareí, em São Paulo, com 16 crianças e adolescentes, está um menino de 11 anos. Ele tinha um ano de idade quando foi vendido pela mãe, que queria dinheiro para comprar drogas. O garoto vive em abrigos desde os três anos, chegou a morar com oito famílias diferentes, mas foi devolvido todas as vezes durante o período de convivência, que é o estágio anterior à adoção.
“A agitação dele e a falta de limite não deixa de ser fruto de tanto rompimento de vínculo ao longo da trajetória de vida. A última devolução aconteceu porque não houve uma adaptação dentro da família. A família não teve informação clara das questões, dessa agitação, não conseguiu lidar com essa demanda, não tinha vínculo fortalecido com ele”, explica o psicólogo Adriano Fonseca.
No mesmo abrigo vive um menino que fugiu de casa porque o padrasto batia nele e ameaçava abusar sexualmente da irmã mais nova. Ele e a irmã foram para o abrigo em 2013. Em 2015, a operária Leila Silva e o marido pediram a guarda provisória dos irmãos: “Como a psicóloga falou pra gente que o que ele precisava era de carinho, amor e atenção, a gente pensou que isso a gente tinha de sobra. Só que a gente não tinha experiência de lidar com traumas. O menino tinha muita dificuldade de ouvir não. Ele gritava, gritava de urrar. Uma vez, uma pessoa na frente de casa viu ele gritando e achou que a gente estava batendo nele, mas não estava. Era uma crise e a polícia chegou, conversou com ele, conversou com a gente. Levei ele em psicólogos, tinha paciência com ele”.
![PREP adoção (Foto: TV Globo) PREP adoção (Foto: TV Globo)](http://s2.glbimg.com/qzBelfuBvcmB8gxI7S93uyzG4M8=/0x0:795x446/400x0/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_59edd422c0c84a879bd37670ae4f538a/internal_photos/bs/2017/v/p/YX2ggVR56hPMmqhwO6bg/adocao-2.jpg)
Durante uma das crises, o marido de Leila chegou a passar mal. Depois de seis meses morando com as crianças, o casal decidiu devolvê-los para o abrigo. “Quando a gente viu que a gente não ia conseguir ser o que eles precisavam, a gente teve que tomar essa atitude, mas dói muito”, desabafa Leila.
“Quando uma família pretendente à adoção recebe uma criança ou adolescente em guarda, tem que receber junto a história inteira dele, o histórico escolar, pedagógico, de saúde, de saúde mental, para o bem e para o mal. Inclusive as notícias mais desagradáveis e preocupantes têm que ser de conhecimento de quem está recebendo a criança para que nunca se alegue que foi enganado”, afirma a promotora de Justiça Renata Rivitti.
Os irmãos acabaram se separando. Hoje, a menina mora com parentes, na Bahia. O menino continua no abrigo e passa os finais de semana com a mãe biológica, que se separou do padrasto agressor.
Maioridade
Abraão mora em abrigos desde os cinco anos de idade. Agora, que completou 18 anos, se prepara para deixar o acolhimento. Ele trabalha como jovem aprendiz em uma empresa que prepara e entrega refeições.
A educadora Simone Ripari foi diretora do abrigo por 11 anos e fala um pouco do jovem: “No começo foi difícil. Ele não queria acordar para trabalhar, então eram brigas, ele xingava, ele achava ruim. Nosso trabalho dentro do abrigo é insistir no adolescente para que com 18 anos, quando não tem mais jeito, quando não tem mais apadrinhamento, adoção, quando não tem mais nada, ele tenha autonomia”.
![PREP adoção (Foto: TV Globo) PREP adoção (Foto: TV Globo)](http://s2.glbimg.com/2G5qV7ECIMPT3EtLwQgFwBZofqw=/0x0:1919x1080/400x0/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_59edd422c0c84a879bd37670ae4f538a/internal_photos/bs/2017/N/b/Xahpf1QJAZB6Bzk2dAyQ/abraao.jpg)
A mãe biológica de Abraão mora no bairro de Cangaíba, um dos mais violentos de São Paulo. Ela toma remédios para depressão e epilepsia e tem 11 filhos. Os três mais novos moram no abrigo com Abraão e apenas um mora com ela, Ezequiel, de 20 anos, que também morou no abrigo até os 18. Ao sair do abrigo, Abraão vai se juntar ao irmão. O pai de Abraão mora na rua, às margens do rio Tietê.
Uma vez por semana, Abraão e outros jovens que também estão saindo ou já saíram do abrigo se reúnem no o Instituto Fazendo História, que tenta ajudá-los a ter uma vida independente. Alice da Silva, de 18 anos, diz que não se sente preparada para sair do abrigo: “Se você tiver um lugar pra ir, você deu sorte. E se você não tiver lugar pra ir, não tiver república, você vai pra onde? Essa é a pergunta que fica. Você pode voltar pra casa da sua mãe, você pode virar mendigo, você pode fazer um monte de coisa”.
Mais chances de ser adotado
Para aumentar as chances de adoção, o Tribunal de Justiça de Vitória decidiu mostrar o rosto de crianças e jovens que sonham com uma nova família, produzindo vídeos para a internet. “A gente quer mostrar que essas crianças que são mais velhas ou que possuem alguma limitação também merecem a chance de ter uma família”, conta Taís Valle, assessora de imprensa do TJ.
Até agora, os vídeos já tiveram mais de 50 mil visualizações. Vinte e duas crianças e adolescentes toparam participar do projeto e 15 despertaram interesse de pretendentes para adoção. Os vídeos ficam no www.esperandoporvoce.com.br. Confira acima alguns dos jovens que participam desse projeto.
O Tribunal de Justiça criou um banco de dados para organizar as informações das crianças e adolescentes que podem ser adotados. Hoje, no Espírito Santo, 110 crianças e adolescentes aguardam adoção, 95 tem mais de 10 anos, 14 tem entre dois e nove e apenas uma tem menos de dois.
Quase todos os interessados em adotar aceita uma criança que acabou de nascer, já os adolescentes praticamente não têm pretendentes. Em 2016, o Cadastro Nacional registrou 1.226 adoções de crianças e adolescentes no Brasil, apenas 13 tinham entre 15 e 17 anos.
Fonte: Rede Globo
Brasil tem 47 mil crianças em abrigos, mas só 7.300 podem ser adotadas
Burocracia e lentos trâmites judiciais fazem com que meninos e meninas demorem para encontrar uma família
![](https://ogimg.infoglobo.com.br/in/21384332-818-39b/FT1086A/420/xfamilia2.jpg.pagespeed.ic.eh87SjDGlE.jpg)
A opção de Rogério Koscheck e Weykman Padinho, casados há dez anos, tirou em 2014 as quatro crianças das estatísticas que assustam especialistas às vésperas do Dia Nacional da Adoção, celebrado amanhã: no Brasil, 47 mil crianças e adolescentes crescem nos abrigos mas, desses, apenas 7.300 estão aptos judicialmente para serem adotados, segundo balanço do Cadastro Nacional de Adoção (CNA) e do Cadastro Nacional de Crianças e Adolescentes Acolhidos (CNCA). Os dados também revelam que, em paralelo a isso, 33 mil pessoas estão habilitadas a adotar.
PREFERÊNCIA POR BEBÊS
Procurador de Justiça da Infância e Juventude, Sávio Bittencourt destaca que a burocracia e a lentidão dos trâmites judiciais fazem com que muitas crianças só possam ser adotadas tarde demais, quando já estão fora dos perfis mais procurados pelos candidatos a pais. Até lá, esses cerca de 40 mil jovens vivem nos abrigos, enquanto famílias esperam anos pela chance de adoção. O procurador lembra que a maioria das pessoas aptas a adotar busca, em geral, um perfil específico: bebês de até 3 anos, brancos e sem doenças congênitas. Apenas 50% dos pretendentes aceitam adotar negros, e somente 6,3% estão dispostos a adotar filhos com 8 anos de idade ou mais.
![](https://ogimg.infoglobo.com.br/in/21384360-5a5-2a7/FT1086A/420/xfamilia3.jpg.pagespeed.ic.PXPSoIAeYZ.jpg)
— A pessoa tem o direito de adotar um bebê, porque quer passar por todas as fases de seu desenvolvimento e acompanhar o seu crescimento. E isso é justo, não pode ser julgado — observa Bittencourt. — Mas por que essas 40 mil crianças, várias ainda bem pequenas, estão nas instituições e não são adotadas? A resposta é simples: a Justiça tem que ser mais rápida. Se a criança não entra no cadastro de adoção, torna-se invisível.
O procurador, que adotou dois de seus cinco filhos, ressalta que a Justiça costuma levar tempo demais para destituir o poder familiar sobre a criança. Isto é, retirar oficialmente a tutela da família biológica.
— Com isso, essas crianças ficam vegetando nos abrigos até se tornarem adolescentes e perderem o perfil de adotabilidade — lamenta ele.
No caso de Rogério e Weykman, o processo foi até rápido, uma exceção.
— Nossas vidas mudaram, as vidas deles se transformaram, sentimentos afloraram. A adoção foi a nossa única opção para realizar a paternidade, mas não imaginávamos que a interação seria tão grande, que a certeza seria inabalável, que poderíamos nos realizar tanto e que seríamos amados com tanta intensidade. É muito amor — relata o casal.
![](https://ogimg.infoglobo.com.br/in/21384366-cf5-2d9/FT1086A/420/xfamilia4.jpg.pagespeed.ic.PWW3uVNW5p.jpg)
Outras crianças não tiveram a mesma sorte. Há sete anos, Caio (nome fictício), de 10 anos, vive na ONG Dona Meca, na Taquara, Jacarepaguá, Zona Oeste do Rio. O menino tem paralisia cerebral (encefalopatia crônica não progressiva) e foi abandonado pela família.
— Seus pais, de Japeri, município da Região Metropolitana do Rio, são usuários de drogas e não tinham condições de cuidar dele. Atualmente, temos 18 crianças na mesma situação — conta Rosângela Chacon, responsável pela ONG.
A mais nova moradora da instituição, com 6 meses de vida, é Maria Clara, que também tem paralisia cerebral e precisa de uma sonda para se alimentar. Ela e outras 17 crianças, segundo Rosângela, já estão em condições legais de serem adotadas.
Presidente da Comissão Nacional de Adoção do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), a advogada Silvana Moreira, que adotou um jovem de 16 anos, acredita que é preciso parar de tratar os genitores negligentes, que abusam e maltratam os filhos, como “coitados”. Outro erro, para ela, é tratar adotantes como pessoas boas e caridosas, já que criam filhos de outros.
— Não adotamos para fazer caridade, adotamos para termos filhos e esses filhos nos trazem muito mais felicidade do que se possa imaginar. Para fazer caridade, fazemos doações a abrigos e às demais causas sociais — compara.
Fonte: O Globo
Justiça propõe prazo máximo de oito meses para processo de adoção
Iniciativa do governo federal visa diminuir espera, que hoje pode chegar a seis anos
![](https://ogimg.infoglobo.com.br/in/20933613-177-b1e/FT460A/adocao.jpg)
As alterações incluem ainda a criação da figura do padrinho afetivo — que já existe em projetos estaduais, mas não consta na lei federal — e estabelecem prioridade para a adoção de meninos e meninas com deficiência ou problema de saúde e de grupos de irmãos. O conjunto de propostas é fruto de uma consulta pública realizada pelo ministério entre outubro e dezembro do ano passado, na internet e em audiências. Qualquer brasileiro pôde sugerir mudanças na lei de adoção, e os pontos de consenso foram incluídos nessa proposta, chamada de anteprojeto. Agora, ele será enviado para votação no Congresso e só entrará em vigor após ser sancionado pelo presidente Michel Temer.
As principais mudanças, em especial a limitação do tempo gasto com os trâmites da adoção, são vistas com bons olhos por especialistas.
— Enquanto a criança espera a burocracia, ela fica sendo filha do abrigo. E não tem pai pior do que o abrigo — pontua a advogada Silvana Monte Moreira, presidente da Comissão Nacional de Adoção do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM).
Ela explica que essa demora costuma ser causada pela dificuldade de destituir o poder da família biológica sobre a criança. No caso de órfãos, o trâmite é fácil, mas, quando os pais estão vivos, o Estado tenta de tudo para que a criança volte para a família original. Isso é um aspecto complicador, segundo ela, porque muitas vezes os pais biológicos não têm condições de cuidar daquele filho. Em vários casos, eles sequer são encontrados.
Foi o que aconteceu com Beatriz, adotada aos 4 anos por Armando e Katya Char. Ninguém conhecia o paradeiro da mãe biológica da menina e, por isso, o processo acabou se estendendo mais do que o necessário. Foram nove meses, tempo considerado até curto para os moldes atuais da lei, mas que poderia ter sido menor.
— Acho que colocar prazo é sempre melhor do que ter prazo nenhum, embora esses limites de tempo sejam difíceis de cumprir na prática. Retirar a criança definitivamente da família biológica nem sempre é rápido — diz Armando.
PADRINHOS OFICIAIS
Para o promotor de Justiça Rodrigo Medina, se o anteprojeto for aprovado, isso será um ganho para o país em vários aspectos. Além do esforço por uma maior celeridade do processo, ele destaca a importância de se padronizar o apadrinhamento afetivo, que é voltado para aquelas crianças e adolescentes que não têm perspectiva de serem adotados. Alguns porque já estão com idade avançada, outros porque têm algum problema de saúde grave, por exemplo. Os padrinhos afetivos devem assinar um termo do abrigo onde a criança ou o adolescente se encontra e se comprometer a levá-lo para passear nos fins de semana, feriados escolares e férias.
— O mais importante deste tipo de programa é que a criança crie vínculos e possa ter alguma referência de família, alguma convivência comunitária — ressalta Medina, que coordena as promotorias da Infância e Juventude na área protetiva do Ministério Público do Rio de Janeiro. — Em alguns casos, o apadrinhamento afetivo até termina em adoção. E quando isso acontece é ótimo, porque sempre se trata de alguém que normalmente não seria adotado.
Ele destaca, no entanto, um ponto polêmico da proposta, com relação ao prazo que a mãe biológica tem para desistir de colocar o filho para adoção, depois de ter manifestado o desejo. Hoje, ela pode desistir até o último dia do processo, enquanto no anteprojeto consta que só pode haver essa desistência no máximo dez dias após a destituição do poder da família biológica sobre a criança.
— Hoje, é um prazo alargado demais, mas, na proposta, acredito que ele seja curto demais, rígido — avalia Medina.
Segundo o Cadastro Nacional de Adoção (CNA) do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), existem 7.167 crianças e adolescentes para adoção no Brasil, e mais de 38 mil pessoas querendo adotar.
Fonte: O Globo
You have to Login