Judiciário paulista: “A elite da elite financiada com dinheiro público”
Estudo analisa a dinâmica do governo tucano para se perpetuar no poder
A advogada Luciana Zaffalon apresentou os resultados de sua pesquisa de doutorado, defendida em fevereiro na FGV-SP, sobre o impacto das disputas corporativas do Sistema de Justiça nas disputas políticas do Estado de São Paulo, em um contexto de fascismo social.
Foram analisados centenas de documentos e projetos de lei, relativos às três instituições analisados, compondo um minucioso e importante diagnóstico sobre a captura do poder Judiciário pelo poder político em São Paulo. O estudo, inclusive, mostra o imbricamento entre os interesses corporativos e os políticos e partidários, em um contexto onde as carreiras são compostas por membros vitalícios em um governo sem alternância partidária no estado, desde 1994.
Em um espaço com forças políticas tão fortes, capazes de se consolidar em um projeto partidário e hegemônico no Estado de São Paulo, seria ingenuidade imaginar que essa força política não opere dentro do sistema de Justiça”, aponta a advogada ao salientar a “obscuridade”, a “perspectiva de privilégio” e de “proteção das elites” enquanto marcas do sistema da Justiça paulista.
Enquanto isso, o encarceramento em massa da população mais pobre se torna “regra do nosso sistema de Justiça”. O mecanismo é notório: blinda-se as elites enquanto à sociedade civil “se reservam as periferias, a prisão ou a morte”.
Cooptação via benefícios remuneratórios
Os dados apresentados por Luciana ao longo da conferência falam por si. Ao analisar os projetos de lei, entre janeiro de 2011 a junho de 2016, relativos ao TJSP, MPSP e DPESP, na Assembleia Legislativa de São Paulo (ALESP), ela descobriu, por exemplo, que no momento da aprovação da Lei Orçamentária de São Paulo, a ALESP transfere a sua atribuição de aprovar as complementações orçamentárias para o governo do Estado.
Ou seja, as negociações relativas a essas complementações que, no caso do Judiciário, dizem respeito a uma série de benefícios, são realizadas no gabinete do governador. “Isso cria a dinâmica de alimentação de um imbricamento muito profundo entre disputas remuneratórias e disputas políticas rigorosamente como regra”. Para termos uma dimensão do que isso significa, em 2017, o Judiciário paulista abocanhou 21% das suplementações orçamentárias do Estado de São Paulo.
Em relação às reformas corporativas aprovadas na ALESP, o PSDB e, em particular, o governador de São Paulo lideram a apresentação de projetos relativos à organização do sistema de Justiça ou benefícios remuneratórios, explicitando o “robustecimento corporativo e de vantagens das carreiras jurídicas viabilizado por propostas diretas do governo do Estado”.
Os projetos propostos pelo MPSP e TJSP, por sua vez, não apenas “se dedicavam ao apetrechamento das instituições do Judiciário, mas fomentavam a rotina de negociação direta de suplementação orçamentária com o governo, com a criação quase invariável desses benefícios e desses fortalecimentos institucionais”.
O resultado, aponta, é “uma espiral elitista de formação corporativa e institucional”. Segundo Luciana, “é frente aos atos de vontade do governador que o funcionamento aristocrático da justiça local tem se concretizado, viabilizando a evolução da organização corporativa do poder em detrimento da cidadania”.
Salários acima do teto constitucional
As folhas de pagamentos do MPSP, inclusive, dimensionam a “espiral elitista”. Em 2015, somente 60 dos 1.920 registros salariais dos promotores paulistas não superaram o teto constitucional como média mensal, ou seja, apenas 3,1% da carreira recebeu abaixo do teto constitucional de R$ 33.762,00. “E eu não estou contabilizando 13° e férias”, apontou Luciana.
Naquele ano, o rendimento mensal médio de um promotor de Justiça do Estado de São Paulo chegou a 46 mil reais, e a soma dos complementos remuneratórios (benefícios e penduricalhos) ultrapassou 62,5% da remuneração padrão. Na Defensoria Pública do Estado de São Paulo, por sua vez, o rendimento mensal médio foi de R$ 26.980,00. E com base em dados do CNJ, Luciana aponta uma despesa média mensal de R$ 45.906,00 com magistrados na Justiça paulista.
Para dar uma dimensão do que significam esses números, ela citou os dados da PNAD de 2015. No Brasil, apenas 2,3% das pessoas ganharam acima de 8 mil reais naquele ano. No Estado de São Paulo, foram somente 3,3% da população. E se considerarmos apenas os funcionários públicos com ensino superior, o índice não ultrapassa 12% com ganhos mensais acima de 8 mil reais.
Quando a gente olha o teto constitucional, estamos falando um patamar de rendimento acima do qual se encontram somente uma parcela ínfima da população: 0,8% no Brasil e 0,10% em São Paulo. É a elite da elite financiada com dinheiro público via projetos propostos pelo governo do Estado”, apontou.
Enquanto isso…
Em sua pesquisa, Luciana também analisou os pedidos de suspensão de decisões judiciais solicitados pelo governador paulista ao Tribunal de Justiça. O resultado impressiona: em 100% dos casos, quando o governador pedia a aplicação do teto constitucional, o pedido foi recusado. Por outro lado, 82% dos pedidos relativos à licitações e contratos públicos foram atendidos, assim como 87% dos pedidos relativos à privação de liberdade, leia-se pedidos da Fundação Casa ou do sistema prisional.
Em 13 dos 15 processos que trataram de temas relacionados à privação de liberdade os efeitos das de primeira instância foram suspensos a pedido do Governo do Estado”, destaca. A justificativa na solicitação da suspensão de direitos aos presos? “Há um prejuízo público em fazer um gasto público não previsto no orçamento original”. E isso acontece, destaca a advogada, “mesmo que o Tribunal fique com 21% de toda complementação orçamentária de São Paulo”.
São casos, por exemplo, de observância do Estado da Criança e do Adolescente relativos à superlotação e problemas com os banheiros e ventilação na Fundação Casa; de instalação de equipe mínima de saúde em unidade prisional onde 60 pessoas haviam morrido por questões de saúde; de interrupção de novos presos e transferência dos que ali estavam por conta de condições de insalubridade nas carceragens; de superlotação e até de garantia de banho em temperatura adequada.
Eu fico com complementação para garantir os benefícios corporativos, mas os presos não vão ter equipe mínima de saúde porque isso vai ser um rombo no orçamento não previsto”, destaca. Apontando que o aprisionamento em massa da população mais pobre é “regra do funcionamento da nossa Justiça”, Luciana analisou a escalada das prisões no Estado, sobretudo após a aprovação da Lei de Drogas, que fez com que a polícia continuasse prendendo as mesmas pessoas mas, agora, com penas mais longas.
Nos últimos dez anos houve um aumento dramático da população carcerária”, destaca, apontando também o aumento, cada vez maior, de assassinatos por policiais em São Paulo. Uma média de 2,3 pessoas oficialmente mortas por dia, em 2015, pelas polícias do Estado de São Paulo.
Lembrando que a Constituição de 1988 garante que o controle externo das polícias compete ao Ministério Público e que as policias – civil e militar – estão sob a gestão da Secretaria de Segurança Pública de São Paulo, Luciana alertou para o fato de “estarmos no sétimo secretário da SSP que é promotor de Justiça”, ou seja, “o MP que devia fazer a fiscalização passou a ser o gestor da polícia”.
O que resulta disso é dramático: em 90% dos casos de letalidade cometida por policial, o MP pede arquivamento dos processos que é concedido pelo Tribunal de Justiça ou pelo Judiciário de primeira instância. Soma-se a isso a “seletividade racial, territorial e social do controle estatal exercido por meio do direito penal”.
Atuando sobretudo nas periferias, as prisões cometidas pela PM se dão sem nenhum controle. “Os flagrantes quase invariavelmente são convertidos em penas de prisão” e a PM, em geral, atua como única testemunha nestes casos, sem que a alegação policial no momento da prisão passe por algum tipo de revisão. “A categorização ou é mantida ou agravada até o momento de fixação da pena. Tudo só vai piorando para as pessoas que são presas nestas condições”.
* Com a experiência profissional de quatro anos na Ouvidora Externa da Defensoria Pública do Estado de São Paulo e sete anos na coordenação do Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDD), ela se debruçou sobre a dinâmica das relações entre o governo paulista e as instituições de Justiça – Tribunal de Justiça (TJSP), Ministério Público (MPSP) e Defensoria Pública (DPESP) – do Estado de São Paulo.
Fonte: Blog do AFR
46 mil é o salário médio dos Promotores paulistas
Para o corregedor nacional do Ministério Público, a falta de reajuste periódico de subsídio fomenta a criação de penduricalhos
Gratificações, auxílios e indenizações pagos a membros do Ministério Público de São Paulo fizeram com que 97% deles recebessem, em 2015, vencimentos acima do teto do funcionalismo público, estipulado em R$ 33,7 mil. O dado é de pesquisa realizada na Fundação Getulio Vargas de São Paulo pela pesquisadora e advogada Luciana Zaffalon. Chamadas informalmente de “penduricalhos”, essas verbas são previstas em lei ou em decisões judiciais. Na prática elevam vencimentos da categoria muito acima do limite constitucional.
Parte desses pagamentos é alvo de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) da PGR (Procuradoria-Geral da República).
A ADI questiona o pagamento de indenizações por atividades consideradas próprias da carreira, como plantões e juizados especiais. Em nota, a PGR informou que a ADI também contesta lei que permite ao procurador-geral de Justiça do Estado prover gratificações por meio de ato administrativo.
De acordo com a Constituição da República, subsídios e vantagens de agentes públicos devem, em regra, ser definidos por lei, não por atos administrativos“, diz a nota da PGR, que moveu ações contra a Promotoria de Santa Catarina e o Judiciário do Mato Grosso por pagamentos considerados abusivos.
Em manifestação encaminhada ao Supremo Tribunal Federal, o procurador-geral de Justiça, Gianpaolo Smanio, argumentou que as gratificações são constitucionais e remuneram atividades extraordinárias. O ministro Ricardo Lewandowski, relator da ação no STF, rejeitou o pedido de liminar da PGR para a suspensão desses pagamentos, mas deu sequência à ação “devido à relevância da matéria e o seu especial significado para a ordem social e a segurança jurídica”. Em 31 de março, o ministro requereu informações a Smanio e à Assembleia Legislativa.
Além da ADI, a Promotoria paulista é objeto de investigação do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP).
A partir de denúncia, corregedores analisaram se o regime de distribuição de processos nas procuradorias de Justiça é automático, como deveria ser. Mudanças nesse regime poderiam gerar acúmulo de processos, o que demandaria mutirões, quando promotores recebem diárias extras pelo serviço. O resultado da investigação do CNMP sai em maio.
O corregedor nacional do Ministério Público, Cláudio Portela, diz que o pagamento de diárias não poderia ser responsável pelo volume de vencimentos acima do teto apontado pela FGV.
Ele afirma que indenizações, em geral, “buscam dar uma melhorada no salário” da categoria. Para Portela, a falta de reajuste periódico de subsídio fomenta a prática. “Criam esses monstrinhos, que dificultam o entendimento [da remuneração da categoria].”
A rubrica “Vantagens”, por exemplo, presente em quase todas as faixas salariais, foi classificada, em nota enviada à reportagem pelo Ministério Público de São Paulo, como “situações personalíssimas de vantagens que o membro já recebia antes de 2003”, ano em que foi estabelecido o teto dos funcionários públicos.
Em “Outras Indenizações” está o pagamento de “férias indeferidas por absoluta necessidade do serviço“. Os membros da Promotoria paulista têm direito a duas férias por ano, além do recesso de 20 dias na virada do ano.
Há ainda auxílio-moradia até para proprietários de imóveis na comarca de atuação.
Fonte: Folha de São Paulo
LEGALIDADE
Norma Cavalcanti, presidente da Associação Nacional dos Membros do Ministério Público, diz que essas verbas “são legais e reconhecidas pelos governos dos Estados e pelo STF”. “Enquanto a lei não for declarada inconstitucional, tem de ser cumprida”, diz.
Segundo o artigo 37 da Constituição, nenhum servidor federal ou ocupante de cargo eletivo pode receber remuneração superior à dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Na redação atual do artigo, verbas indenizatórias não são contadas dentro deste limite.
Desde novembro de 2016 tramita no Senado Federal a Proposta de Emenda Constitucional 63, que inclui verbas indenizatórias no cômputo da remuneração até o teto.
Segundo o senador José Aníbal (PSDB-SP), que apresentou a proposta, a fórmula atual é a “senha” para a criação de benefícios “falsamente indenizatórios” que contornam a proibição de remuneração acima do teto.
OUTRO LADO
O Ministério Público de São Paulo afirmou em nota que nenhum membro recebe vencimentos acima do teto constitucional. O texto informa que pagamentos indenizatórios reembolsam despesas de promotores no cumprimento da função e, por isso, não constituiriam remuneração.
Sobre a ação em que a PGR questiona a natureza de indenizações pagas, além do mecanismo pelo qual elas são definidas pelo próprio Procurador-Geral de Justiça, o Ministério Público destacou que o pedido de liminar para interromper esses pagamentos foi negado pelo ministro Ricardo Lewandowski.
Segundo a nota, isso indicaria que “a tese do ilustre chefe do Ministério Público da União não procede”. A ação será votada em plenário pelo tribunal.
O órgão também afirma que o modelo de distribuição de processos às procuradorias, objeto de investigação, segue o critério constitucional que prevê o repasse automático e imediato dos casos.
Fonte: Folha
Supersalários do MP de S.Paulo. Direito ou privilégio?
Vale-livro, auxílio-moradia e supersalários somam até R$ 130 mil por mês
Em setembro, o governo de São Paulo encaminhou para a Assembleia Legislativa do Estado a proposta de orçamento do Ministério Público (MP) para 2017. A previsão é destinar R$ 2,3 bilhões para manter funcionando a estrutura criada para defender os direitos dos cidadãos paulistas. Um orçamento três vezes maior do que o previsto para a Secretaria de Cultura e o dobro do que será destinado para pastas como Agricultura, Meio Ambiente ou Habitação. É com esse dinheiro que o MP vai cobrir gastos com água, luz, telefone, salários – e os polpudos benefícios destinados a procuradores e promotores.
A remuneração inicial de um promotor público em São Paulo é de R$ 24.818,71. Na última etapa da carreira, o procurador de justiça, o salário chega a R$ 30.471,11. São valores que seguem o teto constitucional: promotores e procuradores paulistas recebem, no máximo, 90,25% do salário de um ministro do Supremo Tribunal Federal.
Mas os vencimentos não terminam por aí. Somam-se benefícios como vale-alimentação, auxílio-moradia, auxílio-livro, auxílio-funeral, pagamento de diárias, remunerações retroativas, duas férias anuais. A Lei Orgânica do Ministério Público de São Paulo, de 1993, prevê 16 auxílios extras que, apesar de serem considerados legais, ajudam a ultrapassar, em muito, o teto constitucional.
As informações sobre os rendimentos dos membros do MP estão disponíveis no Portal da Transparência. Veja abaixo a lista dos 20 membros mais bem pagos do MP paulista em outubro:
Na prática, dos 2015 membros do MPSP que receberam salário em outubro, 1243 receberam a partir de R$ 38.900, ou seja, 61,7% do total. É um valor acima dos R$ 33.763 pagos aos ministros do STF, mais os extras. Se prosperar o entendimento de que “teto é teto” e os “extras” não deveriam estar nem na conta dos ministros do Supremo, a proporção de promotores e procuradores que receberam acima do teto constitucional sobe para 79,8%. Foram 1.608 promotores e procuradores que receberam mais do que o salário teto de R$ 33.736.
A Comissão foi instalada, em novembro, no Congresso Nacional, para propor um fim aos “supersalários” de funcionários públicos.
A folha de pagamento do MPSP de outubro é repleta de exemplos de “supersalários”. Naquele mês o promotor de justiça de entrância final Milton Theodoro Filho, lotado na capital, recebeu o maior valor da folha: R$ 129.469,78. Foram R$ 28.947,55 de salário bruto (sem descontar a contribuição previdenciária e o imposto de renda) e R$ 89.979,35 de indenizações (incluídos R$ 5.087,73 auxílio-moradia e vale-alimentação). Além disso, há mais R$ 9.179,62 de valores retroativos da Parcela Autônoma de Equivalência (PAE), resultado de uma decisão de 1992 do Supremo Tribunal Federal (STF) que equipara os salários do Judiciário com os do Congresso Nacional.
No mesmo mês, o promotor Julio César Palhares, que serve em Bauru, no interior paulista, recebeu R$ 118.480,60. Desse montante, R$ 28.947,55 referem-se ao salário bruto, R$ 82.281,19 a indenizações não discriminadas, à exceção de R$ 5.087,73 de auxílio-moradia e vale-alimentação.
Orlando Bastos Filho, promotor em Sorocaba, foi o terceiro membro com maiores vencimentos no mês, recebendo R$ 107.025 brutos. Nesse valor estão incluídos R$ 64.901,22 de indenizações não discriminadas e R$ 7.864,41 retroativos da PAE. Em 2015, Bastos Filho acirrou os ânimos dos vereadores do município ao iniciar uma investigação sobre seus gastos com despesas de telefone, carro oficial e itens de escritório.
O professor de ética e filosofia política na Unicamp Roberto Romano estuda o poder Judiciário e defende o papel do MP como instituição de garantia da democracia brasileira. Mas critica: “Eu acho que o Ministério Público, justamente porque é o zelador da lei, o fiscal da aplicação da lei, deveria renunciar a esse tipo de acréscimo ao seu salário, sobretudo porque não corresponde à experiência de todos os demais funcionários do estado”.
Para Antônio Alberto Machado, promotor aposentado, as altas remunerações do MP estão diretamente associadas a práticas conservadoras: “As carreiras jurídicas, em geral, se tornaram muito atrativas de algumas décadas para cá. Há 40 anos não era assim. Isso fez com que os membros dessas carreiras tivessem um padrão remuneratório equivalente ao que a gente chama de classe A. A leitura que eu faço é que essas carreiras jurídicas estão ‘sitiadas’. Foram tomadas por essas classes média, média alta, classe alta que têm um valor de mundo conservador e que estão julgando as classes de baixo”.
Promotores e procuradores têm a prerrogativa de legislar sobre os próprios vencimentos. Alguns dos valores e critérios para o pagamento de cada um desses extras são definidos por resoluções e atos normativos que cabem ao procurador-geral de justiça do estado. Foi um ato normativo de 2003 que definiu, por exemplo, que o valor de uma diária corresponde a 1/30 do salário bruto de um promotor em início de carreira. Em 2016, corresponde a R$ 827,30. O valor extra é pago quando o promotor tem de substituir um colega de trabalho.
Um ato normativo de 2014 definiu que promotores e procuradores cedidos para outros órgãos continuam tendo direito a receber o auxílio-moradia. Trata-se de um complemento à lei orgânica que já garante que membros do MP que se afastem do cargo para ocupar cargos eletivos, por exemplo, possam continuar recebendo os vencimentos do órgão se abrirem mão do outro salário. É o que garante ao deputado Fernando Capez continuar na folha de pagamento do MP. A troca vale a pena. Enquanto um deputado estadual tem remuneração de R$ 25.322,25, os vencimentos de Capez em outubro chegaram a R$ 40.497. Como secretários do governo de São Paulo, os procuradores Mágino Barbosa e Elias Rosa receberiam R$ 19.467,94. Porém, ao manterem os salários do MP, eles receberam, em outubro, respectivamente R$ 56.911,63 e R$ 47.685,94.
Auxílio-moradia
O maior benefício é o auxílio-moradia, no valor de R$ 4.377 mensais. A ajuda financeira foi autorizada por meio de liminar do ministro do STF Luiz Fux em setembro de 2014 e se estende a membros da magistratura e dos ministérios públicos de todo o país. À diferença do que ocorre com todos os outros funcionários públicos – até mesmo dos congressistas –, o benefício se destina também para quem tem residência própria e vive na mesma cidade em que atua. Ficam de fora apenas aposentados e licenciados.
Segundo a folha de pagamento de outubro de 2016, disponível no Portal da Transparência do MPSP, dos 2.084 promotores e procuradores públicos na ativa, pelo menos 1.593 recebem o auxílio (76%). O custo anual para os cofres públicos é de aproximadamente R$ 69,7 milhões. O valor daria para atender mais de 14 mil famílias com o programa Auxílio-Aluguel da prefeitura de São Paulo, de R$ 400 mensais.
Mas a despesa não fica por aí. O adicional foi tratado como retroativo pelo ministro Luiz Fux. Assim, promotores e procuradores tiveram direito a receber os “atrasados” dos cinco anos anteriores à liminar, ou seja, desde 2009. Para a maioria da classe, isso significou uma bolada de mais de R$ 262 mil que vem sendo paga em parcelas regulares desde então.
Outro auxílio que ajuda a compor o orçamento anual dos promotores é o auxílio-livro. Uma ajuda extra de até R$ 1.700 por ano, criada em 2010 com o objetivo de garantir a atualização técnica dos promotores e procuradores.
Entre 2010 e 2013, o advogado Rodrigo Xande Nunes trabalhou como oficial de Promotoria dentro do MP, cuja tarefa era solicitar verbas indenizatórias para os promotores e procuradores que assessora. “Bastava o promotor apresentar uma nota fiscal de qualquer livraria com a descrição ‘livro’ para assegurar o reembolso. Vi livros de doutrina jurídica que iam parar nas mãos de sobrinhos do promotor que estavam cursando faculdade de direito, ou romances virarem presentes de aniversário”, lembra.
Depois de ter deixado o cargo de oficial de Promotoria, Rodrigo Xande seguiu carreira como advogado. É justamente por estar do lado de fora que ele se dispõe a falar o que pensa sobre os benefícios, que acredita afastarem a categoria da realidade dos brasileiros: “É impossível garantir direitos para quem vive cercado de tantos privilégios”, argumenta.
Uma das instituições mais aguerridas na defesa de benefícios é a Associação Paulista do Ministério Público (APMP). O escritório da associação ocupa o 11º andar da sede do MPSP e é presidida pelo ex-candidato a procurador-geral Felipe Locke. Procurado pela Pública, ele não concedeu entrevista para a reportagem.
O presidente da APMP tem, no entanto, se posicionado publicamente sobre o tema. Segundo texto publicado na página da associação em outubro, sobre a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 62 que derruba a vinculação automática dos salários de agentes públicos à remuneração dos ministros do Supremo, ele escreveu: “Sem recursos nossas instituições não funcionam e sem Ministério Público e a Magistratura, corrupto não vai para a cadeia. Esses projetos têm o mesmo objetivo da PEC 37 [proposta derrubada pelo Congresso que propunha limites ao poder de investigação de promotores e procuradores], acabar com o poder de investigação, deixando os corruptos à solta”.
Ao mesmo tempo em que a APMP faz campanha contra a PEC 62, também exerce pressão pela aprovação do Projeto de Lei Complementar (PLC) 27, que eleva os salários dos ministros do Supremo para R$ 39,2 mil em janeiro de 2017. Mas nestes tempos em que o governo federal fala em limitar gastos públicos, a luta corporativa da APMP ficou mais difícil.
Mais direitos
Agora, a nova demanda da classe é garantir ainda mais benefícios.
A Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) discute, em regime de urgência, o pagamento de planos de saúde de caráter vitalício para os membros do MPSP. O PLC 52/15 foi apresentado pelo então procurador-geral Márcio Elias Rosa e acolhido pelo então recém-eleito presidente da Alesp e promotor afastado Fernando Capez. O PLC 52 já foi aprovado pelas Comissões de Constituição e Justiça e de Finanças, Orçamento e Planejamento e está pronto para ser votado pelo plenário desde dezembro de 2015.
Fonte: BLog d o AFR
Mais de 90% dos magistrados do Rio receberam acima do teto em março
Oitocentos e quarenta e três juízes e desembargadores do Rio de Janeiro receberam vencimentos superiores ao teto constitucional no mês de março. Trinta e quatro ganharam mais de R$ 80 mil. O salário mais alto foi da diretora de um Fórum, que faturou R$ 129.253 mil. Dois meses antes, em janeiro, o contra-cheque de um juiz chegou a registrar R$ 241 mil.
Ao todo, dos 871 magistrados do estado, apenas 28 não ultrapassaram, em março, o limite de R$ 33.763, valor determinado pela Constituição Federal para o pagamento da categoria e que corresponde a cerca de 90% dos rendimentos de cada ministro do Supremo Tribunal Federal.
Só em março, a folha de pagamento de juízes e desembargadores totalizou R$ 39.620.635,75, o que corresponde a 50.279 salários mínimos. Outra comparação que ajuda a dimensionar o peso dos supersalários para o Erário mostra que o gasto de março com os juízes é superior ao valor total do custeio mensal da UFRJ. A maior universidade federal do Brasil desembolsa R$ 36,5 milhões por mês para manter toda sua infra-estrutura — seu orçamento anual é de R$ 438 milhões.
Os dados são de levantamento feito pelo DIA nas folhas de pagamento do Tribunal de Justiça. A pesquisa se concentrou nos três primeiros meses de 2015 e mostra que os ganhos não são eventuais. Em todos os meses pesquisados, 90% dos vencimentos ultrapassaram o teto. A reportagem optou por não revelar os nomes dos juízes, mas os valores dos rendimentos são públicos de acordo com a Lei de Acesso a Informação.
Penduricalhos
Oficialmente o salário de um juiz gira em torno de R$ 27.500, mas há uma prática sistemática de agregar aos vencimentos uma série de benefícios que, somados turbinam os ganhos. Em março, a recordista dessa prática recebeu R$ 92.503 em ‘vantagens eventuais’. São benefícios como a venda de férias, bonificação por dar aulas, abono de permanência, licença, acúmulo de cargos e auxílio moradia.
A magistrada também ganhou R$ 9.232 das chamadas ‘indenizações’ — elas financiam transporte, mudança, alimentação e moradia — todo mês, os juízes, independentemente de onde moram e trabalham, recebem R$ 4.300 de auxílio-moradia.
Para o diretor do Sindicato dos Servidores do Tribunal, Alzimar Andrade, os magistrados ganharem acima do teto prejudica a imagem do TJ perante à população. “Há uma discrepância enorme entre o salário dos juízes e dos servidores. Nenhum servidor ganha nem perto disso. O orçamento é o mesmo, e os magistrados abocanham boa parte dele”, disse Alzimar. Segundo ele, a média salarial do servidor do TJ é R$ 4 mil.
Para o ex-presidente da OAB-RJ, deputado Wadih Damous (PT), os salários dos magistrados são inconstitucionais. “Desde a época da OAB, eu denunciava isso. Estes penduricalhos são usados para extrapolar o teto”, afirma o advogado. “O teto constitucional deve ser respeitado e os juízes do Rio, não respeitam. Isso passa uma péssima impressão para o cidadão comum, que tem um nível de salário muito abaixo dos juízes”, pondera Wadih.
Outro lado
Por meio de sua assessoria de imprensa, o Tribunal de informou que os rendimentos não são ilegais, já que os aditivos estão previstos em lei (leia matéria ao lado). O TJ afirma que um dos benefícios que mais pesa no orçamento, a acumulação de cargos, ocorre em função do déficit de cerca de 100 juízes.
Novos ganhos: vale locomoção
O Tribunal de Justiça do Rio aprovou no final de abril mais um benefício para os juízes: o auxílio-locomoção. Ele será válido para todos os juízes, independentemente de onde trabalham ou moram. Segundo a assessoria de imprensa do Tribunal, ainda não há valor estipulado para benefício, nem quando ele começará a valer.
Porém, fontes que participaram da reuinão garantem que ele deve girar em torno de R$ 1 mil. Na última segunda-feira, o governador Luiz Fernando Pezão sancionou uma lei aprovada pela Assembleia Legislativa do Rio (Alerj) que garantiu o auxílio-educação de até R$ 2.860,41 para juízes e funcionários do TJ custearem a educação dos filhos entre 8 e 24 anos (R$ 953,47 por cada um).
O custo da medida é estimado em R$ 130 milhões anuais, pagos pelo Fundo Especial do Tribunal de Justiça do Rio (TJ-RJ).
OAB condena supersalários do Judiciário
O presidente da OAB-RJ, Felipe Santa Cruz, criticou os valores altos dos salários dos magistrados. Ele afirma que os supersalários e benefícios acima do teto atingem a população dependente da Justiça.
“Eles impactam limitando a expansão do Judiciário no Estado, principalmente na área mais sensível para a sociedade: na primeira instância, que vive sucateada pela falta de estrutura, de juízes e de serventuários”.
O presidente da OAB também afirmou que “as remunerações distorcidas”, que colocam o Tribunal de Justiça no teto da Lei de Responsabilidade, esgotam as fontes pagadoras e reduzem investimentos.
“Quantos mais gastos em auxílio, menos será destinado para a melhoria da estrutura na primeira instância, gerando grande carência ao cidadão fluminense”, disse.
TCE criticou ganhos no TJ
Mutos dos benefícios que compõem os supersalários do Judiciário do Rio de Janeiro não estão previstos na Lei Orgânica Nacional da Magistratura, que trata da organização do Poder Judiciário. Eles são possíveis graças uma lei estadual aprovada pela Assembleia Legislativa (Alerj) e sancionada pelo então governador Sérgio Cabral. Uma das possibilidades da lei é vender as férias, já que os juízes tem direito a tirar 60 dias por ano. Outro penduricalho são bonificações por acumular cargos e por desempenhar funções de chefia no Tribunal.
Estes tipos de bonificações em forma de indenizações já foram proibidos pelo Conselho Nacional de Justiça, através de resolução. A lei estadual também já foi questionada pela Procuradoria Geral da República, que entrou com uma ação de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal. Relator do processo, o ex-ministro Carlos Ayres Britto votou pela inconstitucionalidade, mas o ministro e ex-desembargador do Rio, Luiz Fux, pediu vista em 2012 e caso ainda não foi julgado.
Na semana passada, o DIA revelou que uma auditoria do Tribunal de Contas do Estado (TCE) constatou que 17 desembargadores e juízes do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro receberam indevidamente salários acima do limite
Fonte: O Dia
Promotores e procuradores querem também a extensão do auxílio-moradia para seus colegas aposentados. Em outubro de 2015, o Colégio de Aposentados da APMP reiterou o pedido que já vem sendo feito desde 2013 à Procuradoria-Geral, apelando para o princípio da simetria para justificar a ampliação da benesse.
Privilégio nos detalhes
Em novembro de 2015, o MPSP fechou um contrato para o fornecimento de copinhos de água mineral para a instituição. Ao custo de R$ 71.724, garantiu o fornecimento de 11.904 copinhos de 200 ml com água mineral por mês, durante um ano. Porém, o produto é usado para a hidratação apenas de parte dos servidores, os promotores e procuradores. A regra, em vigor desde 2011, ganhou forma em um comunicado interno da diretoria geral do órgão.
Levantamento mostra que juízes ganham o dobro do salário de ministros do STF
Os deputados federais receberam, no sábado (8/8) uma espécie de levantamento de membros de carreiras jurídicas cujas remunerações ultrapassam, e muito, o teto remuneratório do serviço público. São juízes federais e procuradores da República que chegam a receber mais de R$ 60 mil, contados, além do salário, os benefícios que recebem sob a cifra de indenização em decorrência do serviço.
De acordo com o texto, intitulado O Teto virou Piso, “juízes e membros do Ministério Público recebem remunerações estratosféricas”. Pelo que diz o artigo 37 da Constituição Federal, os funcionários públicos devem ser remunerados em parcela única, sempre limitados ao salário do ministro do Supremo Tribunal Federal, hoje em R$ 37,4 mil.
No entanto, segundo o autor do texto, o procurador federal Carlos André Studart Pereira, que escreveu a pedido da Associação Nacional dos Procuradores Federais (Anpaf), essas verbas têm sido pagas de maneira disfarçada, como se fossem indenizações — e por isso não estariam sujeitas à parcela única ou ao teto remuneratório. “Foram criadas várias espécies de auxílios: auxílio-livro, auxílio-saúde, auxílio-educação, auxílio-transporte, auxílio-táxi etc”, diz o procurador. No Senado, o texto foi enviado a Fernando Collor (PTB-AL).
De acordo com o levantamento feito pelo procurador, alguns casos destoam mais que outros. Há o juiz federal em Curitiba que, em determinado mês, recebeu R$ 64 mil, contando salário, auxílios e benefícios. Outro, levou R$ 73 mil. Outro, afastado da jurisdição, nesse mesmo mês ganhou R$ 52,5 mil.
No caso do Ministério Público Federal, há procuradores com remunerações de R$ 48 mil. Outros, com atuação em segundo grau, que ganham quase R$ 65 mil por mês.
Além de um alerta ao Congresso, o texto de Studart é uma defesa da PEC 443, que vincula o salário dos advogados da União e procuradores federais ao do ministro do STF. Ele afirma que o MP consegue os benefícios “com o poder e a influência que tem”, e o Judiciário, “invocando a simetria”, também consegue. “A advocacia pública tenta, mas sem a necessária autonomia é difícil conseguir algo eficaz”, afirma. “Quem sobra? Ora, o Poder Legislativo.”
Fora da lei
É uma discussão jurídica de efeitos práticos. Remuneração de servidor público depende de lei, sempre de iniciativa do chefe do poder em questão. Já verbas indenizatórias independem de lei. Basta que haja “situação jurídica merecedora de reparação, com base no poder da autotutela”, conforme explica artigo da procuradora federal Marina Fontoura de Andrade.Nessas situações jurídicas estariam a necessidade de benefício para pagar transporte, para comprar livros e estudar matérias relacionadas à atividade-fim do juiz ou do procurador e até para andar de táxi, já que determinada vara não tem carro oficial.
“A mais nova benesse” relatada pelo procurador federal é a “gratificação por exercício cumulativo de função” para juízes federais. Criado pela Lei 13.093/2015, o benefício é concedido a juízes que acumulam funções, como a de titular e substituto de uma vara, ou varas eleitorais.
Esse benefício é de um terço do salário do juiz, limitados a cada 30 dias de acúmulo de funções. De acordo com a Resolução 341/15, do Conselho da Justiça Federal, que regulamenta a lei, no entanto, quando esse acúmulo de jurisdição ultrapassar os 30 dias, esses dias serão remunerados com folgas, que obedecem ao teto de 15 dias e não podem ser vendidas. “O que deveria ser vantagem eventual — a ser gozada nas férias e demais afastamentos do colega — degenerou-se em aumento salarial”, diz o texto de Studart, citando artigo do colega Luciano Rolim.
Fator estoque
Studart também aponta que a regra do CJF determina que os juízes federais têm um “limite” de acervo de mil processos, mais um “limite” de mil processos novos por ano. Passando disso, o acervo será dividido com outro juiz sempre que o número chegar a múltiplos de mil.Considerando que em 2010 foram 5,9 milhões de processos para 1,7 mil juízes federais, segundo o CJF, todos eles têm, em tese, direito à redistribuição de seus trabalhos.
Pedro Canário é editor da revista Consultor Jurídico em Brasília.
Fonte: Consultor Jurídico
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