O ano de 2015 já mudou a rotina de muitos brasileiros. A tão comentada crise econômica, que trouxe mais inflação, juros, dólar caro e desemprego, encurtou consideravelmente a renda da população, que agora tem que se desdobrar para honrar com os pagamentos e não cair na inadimplência.
De acordo com um estudo da CNI (Confederação Nacional da Indústria) divulgado nesta quarta-feira (9), seis em cada dez brasileiros afirmam ter perdido poder de compra nos últimos 12 meses. Segundo eles, essa redução se deve à queda da renda dos trabalhadores (sentida por 42% dos entrevistados), aliada ao aumento dos preços (ou seja, pela inflação e alta dos juros).
Com a queda da renda e do poder de compra, aumentaram as dificuldades para pagar as contas básicas — aluguel, água, luz, prestações de financiamentos etc.
Mais de 60% dos entrevistados disseram que está bem difícil deixar as contas em dia. Segundo a CNI, o percentual dos brasileiros com dificuldades financeiras é o maior desde a crise de 2008.
Com isso, eles estão precisando apertar o cinto. Cerca de 38% dos brasileiros já diminuíram atividades de lazer, como cinema, clubes e teatro, assim como as idas a restaurantes (39% disseram que diminuíram).
Os brasileiros também cortaram os gastos com vestuário, carne vermelha, produtos de beleza, água, contas de telefone e celular, energia elétrica e até medicamentos.
Substituições
Com os preços mais altos, a população também está economizando no supermercado. O estudo aponta que três quartos (ou 72%) dos brasileiros estão trocando produtos por similares mais baratos.
Além disso, 63% dos entrevistados afirmaram também que adiaram a compra de bens de maior valor, como carros, imóveis, eletrônicos e eletrodomésticos.
As despesas com a casa também diminuíram. Mais de 74% disseram ter reduzido os gastos porque o dinheiro estava curto.
“Quanto menor a renda familiar dos brasileiros, maior o percentual dos que reduziram as despesas de casa nos últimos 12 meses: enquanto 66% dos que possuem renda familiar superior a cinco salários mínimos afirmam ter passado por essa situação, esse percentual chega a 81% entre as famílias cuja renda é inferior a um salário mínimo.”
As dificuldades em manter as contas em dia também afetaram a moradia dos brasileiros. Cerca de 16% disseram que tiveram de mudar de casa para reduzir os custos com habitação nos últimos 12 meses.
Novamente, os brasileiros de menor renda foram os mais afetados. Mais de 24% dos que possuem renda familiar inferior a um salário mínimo se mudaram por esse motivo.
Medo do desemprego
A situação no mercado de trabalho também gera insegurança para 76% dos entrevistados. Cerca de 44% disseram que alguém da família perdeu o emprego nos últimos meses.
A pesquisa da CNI mostra que 48% dos brasileiros buscaram trabalho extra para complementar a renda e, em 40% das famílias, pessoas que estavam fora do mercado tiveram de voltar a trabalhar para ajudar com os gastos em casa.
Para escapar das demissões cada vez mais comuns, os entrevistados disseram que estão investindo em educação: 24% dos brasileiros voltaram a estudar devido ao medo de ficarem desempregados. “Essa atitude foi mais comum entre os brasileiros mais jovens”, considerou o estudo.
Futuro mais incerto
Se a percepção do brasileiro já está ruim no presente, para o futuro as coisas pioram. Levando em consideração o cenário atual da economia, o pessimismo em relação ao futuro só aumenta: 83% dos brasileiros se preocupam com a possibilidade de perder o padrão de vida que têm hoje.
“Esse percentual é superior aos verificados em setembro de 2012 e em março de 2009, período da crise econômica internacional”, diz o estudo.
As expectativas sobre o mercado de trabalho também não são nada animadoras: mais da metade dos entrevistados acredita que a situação econômica vai piorar nos próximos 12 meses e 71% acreditam que o desemprego crescerá ainda mais.
Fonte: Brasilspot
Quase 60% dos brasileiros mudaram de vida para driblar a crise econômica
Pesquisa Ibope encomendada pela CNI revela ainda que quase
metade da população buscou algum trabalho extra no último ano.
O Jornal Hoje fala de uma pesquisa que mostra como o brasileiro está enfrentando a crise. Crianças mudam de escola, pais cortam gastos daqui e dali,mas existe uma arma que pode ser bem eficiente neste momento: a criatividade.
O freezer ocupa um lugar de destaque na sala e também no orçamento de uma família no Rio de Janeiro. Desde que Sidney perdeu o emprego na construção civil há três meses, é a revenda de salgadinhos que vem garantindo o pagamento das contas.
“Eu preferia estar trabalhando, entendeu? Eu preferia acordar cedo, sair e enfrentar ônibus, enfrentar tudo, mas chegar lá e ter o meu salário. Mas também não posso reclamar muito da virada que a gente está tendo, não”, conta o operário Sidney Rocha.
Ele e a mulher também estão revendendo bolsas e carteiras de uma fábrica de São Paulo e a clientela é fiel. “Os clientes são amigos, vizinhos, boca e boca e assim está indo”, diz a dona de casa Rita de Cássia Rocha.
Mais da metade da população brasileira está se virando para enfrentar a crise. É gente que já mudou hábitos de consumo ou o planejamento financeiro dentro de casa.
Pesquisa Ibope encomendada pela CNI revela ainda que quase metade da população buscou algum trabalho extra no último ano e em 40% das famílias pessoas que não trabalhavam agora buscam alguma atividade para reforçar o orçamento doméstico.
A pesquisa também mostra que 13% trocaram os filhos da escola privada para a escola pública nos últimos 12 meses. Ana Paula perdeu o emprego depois da licença maternidade do segundo filho. A renda doméstica caiu pela metade e agora é só o marido que sustenta a casa. Para aliviar o orçamento, o jeito é economizar na creche.
“Já que eu estou em casa e ainda não consegui recolocação, a minha ideia é que o bebê fique comigo e eu fique tomando conta dele neste momento”, afirma Ana Paula Santos, gerente financeira.
Fonte: Rede Globo
Mil e um jeitinhos de lidar com a crise
Com alta dos preços, dólar a R$ 4 e crédito caro, brasileiro usa criatividade para enfrentar recessão
BRASÍLIA Driblar os efeitos da crise está exigindo cada vez mais jogo de cintura. Se o cenário parecia difícil em 2015, para este ano não se vê sinal de alívio: economistas apontam que o país terá uma recessão ainda mais intensa do que se previa anteriormente, com retração de mais de 3%. O dólar não dá trégua e continua na faixa dos R$ 4. E os preços devem ficar novamente acima do teto da meta de inflação este ano. Para muitos brasileiros, a saída é recorrer ao famoso jeitinho.
A conta de luz subiu 51% em 2015? Numa das academias mais sofisticadas de Brasília, alguns alunos encontraram a solução. Dobraram a frequência na academia, mas não a dos treinos. As visitas passaram a incluir chuveiradas de água quente, nas quais os cinco minutinhos a mais no banho não pesam no bolso, pois já estão incluídos na mensalidade. E de quebra ainda economizam com xampu, condicionador e sabonete líquido.
— Ninguém consegue manter o padrão de vida na crise, mas o brasileiro se adapta. Já sofreu tanta crise no passado, que aceita o sacrifício — comenta Carlos Thadeu de Freitas, ex-diretor do Banco Central.
A professora de Sociologia da Universidade de Brasília Mariza Veloso diz que o jeitinho brasileiro tem dois aspectos. O lado bom é a criatividade, que evita que a sociedade decaia na crise econômica. Mas, por outro lado, representa a marca cultural de um povo que não aceita a realidade da atual recessão:
— A gente está em crise. E mesmo assim tem muita gente que continua indo para Miami com dólar a R$ 4. Isso é fingir que a crise não existe.
Em dezembro, o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) reconheceu que o Brasil tem um povo resiliente à crise. E que o arcabouço de segurança social criado nos últimos anos, principalmente o Bolsa Família, protege os mais pobres de voltarem à miséria. Desta vez, cada um, porém, tem uma história de como a crise de 2015 mudou os hábitos em 2016.
— Temos que ver se o brasileiro será tão resiliente. Temos o jeitinho que tenta ajustar tudo e ainda fazer carnaval, mas isso vai até quando? — indaga Marceu Dursztyn, sociólogo e professor de Economia da Universidade de Brasília.
A volta da compra do mês
A cesta básica da enfermeira Ana Paula Monteiro Santos, de 32 anos, nunca foi tão básica. Se antes os encartes de promoções de supermercados passavam despercebidos, hoje ela acompanha as ofertas de carne ou presunto.
— A crise fez com que eu me organizasse melhor. Antes, fazia compras semanais. Agora, faço uma grande compra mensal. De 15 em 15 dias, compro frutas e verduras.
Ana Paula cortou todos os supérfluos, como os produtos importados: queijos, vinhos e geleias. Com uma criança recém-nascida em casa, ela não pode beber, o que ajudou no “ajuste fiscal”. Mas a crise tornou os preços de alguns produtos salgados demais:
— Estava aqui olhando os produtos de dieta, mas não dá para comprar. Vários produtos estão muito caros. Voltamos a fazer contas como no passado.
Raiz escura agora é tendência
Pagar até R$ 500 para retocar as mechas louras pesa cada vez mais no orçamento das brasileiras. Por causa da crise, o setor de beleza, que crescia em velocidade maior que a economia, começou a encolher. Mas não a vaidade. A colorista Tânia de Souza, que atende a fashionistas de Brasília, garante que a freguesia não diminuiu, mas diz que as clientes buscam poupar cada vez mais:
— Se antes apareciam de dois em dois meses, agora, o intervalo aumentou para quatro meses.
Ela conta que as clientes não fazem mais a unha no salão em que trabalha: buscam lugares especializados, com serviço mais em conta. Taninha, como é conhecida, lembra que a tendência estampada nas revistas é cabelo com ar natural.
— Agora, mais do que nunca, a raiz escura vai ficar na moda — brinca.
Alô, só pelo WhatsApp
Até o ano passado, tudo ia bem nos negócios do empreiteiro Gustavo Viegas. O empresário do ramo da construção civil gastava cerca de R$ 900 para pagar a conta de celular. Pelo telefone, conversava com os clientes: moradores de áreas nobres de Brasília que queriam casas de alto padrão. A crise interrompeu os negócios e, depois da paralisação da última obra, a saída foi recorrer ao crédito para pagar as contas.
Não foi suficiente. Teve de vender o maquinário, um terreno e uma sala comercial. Abriu um churrasquinho com o irmão em Sobradinho, cidade-satélite de Brasília. Tudo isso por causa da crise. Cortou não apenas os supérfluos, mas também o que era essencial em outros tempos. A conta telefônica, por exemplo, caiu para zero.
— Eu não ligo mais. Só uso WhatsApp.
Quem mexeu no meu queijo?
Inglês de nascimento, mas goiano de coração, o consultor Antony Peter Stevens ainda não se adaptou integralmente a um dos aspectos da vida no Brasil:
— Sempre quis falar uma coisa: o preço do queijo no Brasil é abusivo.
Inconformado com o preço, passou a produzir o próprio queijo em seu sítio, ainda mais depois que o dólar alto deixou as iguarias europeias mais caras. Mas as substituições do consultor britânico não param por aí. Ele limou da lista de compras o uísque escocês e aderiu à cachaça produzida no estado.
— Entre a cachaça e o uísque, fiquei com a cachaça. Hoje, me sinto muito mais em casa — diz.
Mas a adaptação ao gosto local também tem seus limites:
— Não gosto de caipirinha. Isso é coisa de quem está na praia e quer encher a cara.
Não basta suar na academia
O Instagram é a vitrine, mas o mostruário também pode ser conferido no porta-malas. Se o cliente se interessa por alguma peça, leva para provar em casa. O negócio é fechado pelo WhatsApp e o pagamento costuma ser feito por transferência bancária. Foi assim que a personal trainer Lívia Blanquet encontrou uma alternativa para complementar a renda depois de trocar o Rio de Janeiro por Brasília para acompanhar o marido, que passou num concurso público.
Na mudança, Lívia deixou para trás um grupo de 15 alunos. Em Brasília, passou meses apenas com o trabalho de monitora de academia. Quando a crise apertou, tomou providências: aproveitou as viagens ao Rio para comprar malhas e “exportar” a modafitness carioca para a capital do país. Virou microempreendedora individual.
Compra antecipada por causa do dólar
O empresário Andrey Portela tinha 12 funcionários em sua oficina mecânica até outubro, quando passou a sentir os efeitos mais fortes da crise. Com custos em alta, demitiu dois funcionários. E, enquanto o cenário não melhorar, não tem planos de recontratar:
— Vou ficar com essa estrutura por um bom tempo. A minha conta de luz subiu de cerca de R$ 800 mensais para R$ 1.400. Não dá.
A alta constante do dólar fez com que ele antecipasse as compras de óleos e outros produtos importados. Com estoques cheios e sem movimento de clientes, Portela viu o faturamento cair gradativamente até dezembro. Mas tem esperança de transformar a crise em lucro:
— Deve haver uma recuperação agora. O meu negócio é mais vantajoso, porque as pessoas não estão trocando o carro. Vão ter que arrumar o carro antigo.
Dieta rígida de equilíbrio financeiro
Depois de tomar mais crédito do que era capaz de pagar, Silvéria Santana admitiu que precisava acertar as contas para fugir dos juros altos. A auxiliar de escritório não queria ficar na mesma situação que alguns colegas de trabalho que estão superendividados.
Ela decidiu colocar os débitos em dia e refinanciar a fatura atrasada do cartão de crédito. Procurou a instituição financeira e parcelou toda a dívida:
— Estou conseguindo desembolsar normalmente.
No entanto, a medida que tirou as preocupações de Silvéria teve um alto preço. Ela precisou ajustar seu orçamento. Áreas nobres — como saúde e educação — foram as mais atingidas:
— Cortei academia. Não dá para malhar mais. E abandonei o sonho da faculdade.
Fonte: O Globo
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