Um relatório da ONG Human Rights Watch (HRW) diz que Israel está obrigando ilegalmente quase 7 mil imigrantes da Eritreia e do Sudão a deixar o país.
Segundo a ONG, o governo israelense vem negando solicitações de asilo a esses cidadãos, além de prendê-los irregularmente.
No início do ano, cidadãos africanos que solicitavam asilo em Israel realizaram protestos sobre o tratamento a qual eram submetidos.
Israel diz que suas políticas sobre imigrantes ilegais e refugiados respeitam as leis internacionais.
O governo do premiê Binyamin Netanyahu reitera que muitos africanos não são solicitantes de refúgio, mas imigrantes econômicos que veem Israel como um destino atrativo por se tratar de um país desenvolvido e onde eles podem encontrar emprego.
‘Invasores’
Em 2006, eritreus e sudaneses começaram a chegar a Israel em grandes números por meio da Península do Sinai, no Egito.
Segundo estatísticas oficiais, de 2006 a dezembro de 2012, 37 mil eritreus e 14 mil sudaneses já haviam entrado no país.
A HRW diz que, nos últimos oito anos, as autoridades israelenses vêm empregando várias medidas para incentivá-los a abandonar Israel.
As medidas incluem “detenção por prazo indeterminado, obstáculos para acessar o sistema de asilo de Israel, rejeição de 99,9% de solicitações de asilo de eritreus e sudaneses, políticas ambíguas na concessão do direito do trabalho, e acesso restrito ao sistema de saúde público”, alega o relatório.
Em setembro de 2014, a Suprema Corte de Israel considerou ilegal uma emenda a uma lei anti-imigração que possibilitou às autoridades prender por prazo indeterminado indivíduos que entrassem ilegalmente no país.
Em retaliação à decisão judicial, o Knesset, o Parlamento de Israel, aprovou outra emenda à lei. Ela estabeleceu um centro de detenção no deserto de Negev (sul de Israel) para onde seriam levados os supostos “invasores”.
Desde então, centenas de eritreus e sudaneses foram obrigados a se apresentar no local, onde vivem em condições que, segundo a HRW, violam as leis internacionais sobre prisões arbitrárias.
As autoridades israelenses alegam que os imigrantes não estão detidos e podem sair por algumas horas durante o dia.
No entanto, eles são obrigados a se apresentar três vezes por dia e dormir lá durante a noite. O único meio de deixar a penitenciária seria ou ter a solicitação de refúgio aprovada pelo governo ou abandonar de vez o país.
Alta rejeição
Em fevereiro de 2013, o governo de Israel permitiu a cidadãos eritreus e sudaneses a apresentar pedidos de asilo em números significativos. No entanto, em março deste ano, autoridades revisaram apenas mais de 450 casos, e a taxa de rejeição beirou os 100%, informou a HRW.
“Destruir a esperança do povo de buscar proteção ao forçá-los a um beco sem saída e então alegar que eles estão voluntariamente deixando Israel é claramente uma atitude abusiva”, afirmou Gerry Simpson, autor do relatório da Human Rights Watch.
“O governo de Israel não dá qualquer outra alternativa a eritreus e sudaneses senão viver no medo de passar o resto de seus dias trancafiados em uma prisão no deserto ou correr risco de ser detido a qualquer momento ou mesmo sofrer abusos quando voltarem para casa”.
A HRW diz que Israel está violando o princípio internacional de ‘não-repulsão’, que proíbe países de devolver refugiados e solicitantes de asilo aos países onde suas vidas ou liberdade estejam sendo ameaçadas.
Em resposta ao relatório, o ministro das Relações Exteriores de Israel afirmou, por meio de um comunicado, que o país “trata imigrantes ilegais entrando em seu território de acordo com a lei internacional, incluindo o tratado das Nações Unidas sobre refugiados”.
“Imigrantes ilegais podem apresentar um pedido de solicitação de refúgio e também podem apelar da decisão tomada pelas autoridades de Israel em relação a seu status aos tribunais do país”, acrescentou a nota.
O comunicado informa ainda que os imigrantes “não foram expulsos” e aqueles que deixaram o país o fizeram “por sua própria vontade”.
Armazéns de crianças africanas’ geram polêmica em Israel
Organizações de direitos humanos dizem que creches podem ter até 100 crianças em más condições de higiene
Dentro do que pode ser um abrigo antibombas transformado em apartamentos em Tel Aviv, o centro financeiro de Israel, há um espaço escuro, úmido e malcheiroso. Aqui, música é ouvida a todo o volume para abafar o choro de um grupo que, algumas vezes, chega a 100 crianças, a cargo de apenas duas babás.
É neste local que imigrantes africanas oferecem serviços de creche a preços módicos para milhares de outros africanos que se refugiaram em Israel.
Estes “armazéns de bebês” – também chamados de “estacionamentos de crianças” – têm sido denunciados pela imprensa local e por organizações de direitos humanos, por conta da superlotação e pelas condições precárias de operação.
Há dezenas de estabelecimentos do gênero em Tel Aviv. No início do ano, cinco bebês morreram em creches improvisadas em apenas um mês e meio.
A organização beneficente Unitaf, que patrocina projetos para o cuidado de menores sem cidadania israelense em Tel Aviv, criou creches e centros para crianças em idade pré-escolar, mas diz que ainda é preciso muito mais para atender à demanda dos refugiados.
Sem direitos
De acordo com a ONU, Israel abriga cerca de 53 mil refugiados africanos, a maioria vindos de forma ilegal pela fronteira com o Egito. Pelo menos 36 mil seriam da Eritreia e 14 mil, do Sudão.
Eles buscam o país porque é o único da região com um alto padrão de vida e aonde é possível chegar caminhando.
No entanto, Israel poucas vezes lhes concede asilo político, deixando a maioria deles em situação vulnerável, à margem da sociedade.
Para ganhar a vida, os imigrantes trabalham longas horas em diversos empregos, algumas vezes em locais muito longe de onde vivem. Por isso, precisam deixar seus filhos aos cuidados de outros.
Como muitos não podem pagar creches autorizadas pelo governo com o pouco dinheiro que recebem, recorrem aos “armazéns”, cujas babás não têm o treinamento nem a equipe necessária para cuidar adequadamente dos menores.
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Iris Alter, da Unitaf, disse à BBC que alguns bebês chegam a ficar horas dentro de berços em condições insalubres e sem os acessórios apropriados.
“Só podemos imaginar o efeito adverso que essas babás podem ser sobre o desenvolvimento destas criaturas”, afirma.
De acordo com Alter, há falta de estímulo ou contato físico e, muitas vezes, as crianças veem televisão o dia inteiro. Também não é possível alimentar a todos e muitos sofrem de má nutrição.
“Normalmente deve haver uma babá para cada três a seis crianças e ela deve ser supervisionada por outro profissional. Mas nestes lugares pode haver uma, duas ou, no máximo, três, encarregadas de 20 a 50 bebês”, diz Alter.
Única alternativa
Alter explica que, em Israel, não há educação nem cuidado público para crianças até os três anos de idade.
Mesmo os cidadãos israelenses que têm filhos pequenos e precisam trabalhar precisam encontrar uma solução privada. Mas, enquanto eles podem pagar creches privadas ou contar com a ajuda de seus pais, os imigrantes sem cidadania tampouco têm acesso à seguridade social.
“Muitas vezes o pai ou a mãe ficam sós porque seu cônjuge foi deportado e eles não sabem ou não aprenderam a cuidar de crianças muito novas”, diz.
As mulheres que se oferecem para cuidar dos menores são trabalhadoras imigrantes, geralmente de Gana, que também tentam ganhar a vida.
Para pagar seus aluguéis, comer e mandar algum dinheiro para a família em seu país de origem, acabam tentando administrar muitos bebês, mesmo sem preparo adequado para isso.
“Elas não fazem isso de forma criminosa, nem para se aproveitarem da situação. É o resultado da pobreza e da falta de oportunidades”, afirma Alter.
Apesar de serem, de modo geral, anti-higiênicas e mal cuidadas, estas creches sem licença não são completamente ilegais. Mesmo assim, não contam com qualquer tipo de supervisão.
As autoridades locais não as fecham porque são a única alternativa econômica para as famílias sem documentos.
“É preciso apresentar outra solução. Se fecham uma creche, imediatamente abrem outra sem que soubéssemos onde.”
A Unitaf afirma que está tentando fazer com que as mulheres que administram estas creches clandestinas sejam transferidas para centros bem equipados e administrados pela prefeitura, em que elas poderão ter capacitação, apoio e supervisão para realizar seu trabalho.
Fonte: BBC
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