Mensagem do Grupo Arcturiano
Por Marilyn Raffaele

Queridos, vocês estão começando a ver muitas mudanças em seu mundo. Tentem não manter conceitos a respeito de como essas mudanças devem parecer para serem válidas, mas, ao invés disso, aprendam a serem observadores silenciosos de tudo ao seu redor. Observem as reações das pessoas e ouçam o que elas estão dizendo. Notem o furor crescente dos políticos lutando para manter vocês onde eles querem que vocês estejam: no medo e na antiga energia. Notem como a publicidade parece ter que se tornar cada vez mais alta e irritante.

Todas as formas da energia antiga e densa estão tentando muito se manter apesar da Luz da consciência sempre crescente fluindo para a Terra nesta época. Aqueles ainda se agarrando firmemente às projeções baseadas no medo da consciência não-desperta estão simplesmente inconscientes e ainda desinteressados em saber que há modos de viver mais evoluídos e mais fáceis.

Essas almas queridas continuam a empreender intensa resistência para mudar na esperança de se manterem e manterem o mundo no que é conhecido como lucrativo, utilizando ferramentas que não ressoam mais com muitos. A maioria de vocês está descobrindo que tem se tornado muito fácil ver através do absurdo… vocês não vivem mais nesse nível.

No seu curso da busca espiritual vocês aprenderam que eram criadores e que as pessoas criam suas próprias situações. Isso fez muito estudante sério observar os “problemas” em sua vida como falhas espirituais, como sinais que ele não estava entendendo a verdade corretamente. É altamente provável que todo “problema” em sua vida foi criado intencional e perfeitamente por você para aprender e crescer. Neste ponto da jornada não há acidentes.

É tempo de silêncio e confiança. Deem-se permissão de não fazer absolutamente nada e apenas ser. Conceitos antigos prendem a humanidade à crença que tempo passado sem fazer nada reflete preguiça. O resultado é um mundo cheio de pessoas que perderam o contato e a consciência de seu próprio espaço interior calmo de descanso e renovação correndo todos os dias. Passem tempo na natureza mesmo que seja apenas um pequeno parque na cidade. Procurem locais sem distrações e ruído onde vocês podem simplesmente ser. Aprendam a apenas ouvir ao silêncio.

No meio da atarefada vida familiar e profissional, encontrar um tempo calmo normalmente é muito difícil. Entretanto, se vocês fizerem o esforço, vocês logo se descobrirão capazes de se centrar mais facilmente e mais rapidamente e que vocês levarão uma paz com vocês durante todo o seu dia. Há aqueles que levantam no meio da noite para contemplação e meditação porque é seu único tempo silencioso.

Muitos de vocês estão cientes de datas específicas sendo dadas para a primeira onda de ascensão. Não liguem a ascensão a uma data específica. O que isso significa é que nesta época aqueles preparados para entrar em energias dimensionalmente superiores estarão entrando. Acreditar que somente pode acontecer numa determinada data é mentalidade tridimensional. Na verdade, muitos de vocês já estão nelas ou estão entrando e saindo delas.

Não tenham medo, vocês não estão partindo, mas estão mudando enquanto nos corpos físicos para uma nova ressonância que vocês reconhecerão por uma nova consciência. É por isso que a limpeza das energias antigas desta e das vidas passadas tem sido tão necessária.

Não esperem de repente ver toda guerra parar, pois ainda há muitos que ainda não estão preparados para ir além de tais experiências tridimensionais. Entretanto, vocês mesmos não estarão na guerra, a menos que escolham estar porque a guerra não faz mais parte de sua consciência.

Tem havido alguns no exército que descobriram após se comprometerem que seu estado de consciência tinha evoluído para além da matança e violência e então eles se encontram no meio de lutas internas intensas envolvendo culpa, confusão e uma sensação de fracasso. Alguns deles, não vendo outro modo, escolheram o que parecia ser sua única opção – suicídio.

Esses queridos acreditavam no que lhes era dito ao invés de confiar em sua intuição e da experiência aprenderam uma lição poderosa sobre poder pessoal e escolha. Este conhecimento eles trarão firmemente intacto para sua próxima vida quando eles serão os pacificadores.

Alcançar uma consciência de Unidade se manifesta como uma mudança na atitude e crenças sobre os chamados “inimigos”. As notícias frequentemente são simplesmente propaganda do medo continuamente focando em algum “inimigo” para obter a aceitação geral do público de ação militar e vigilância adicional.

Sempre se lembrem de que o “inimigo” também é uma expressão do Divino, mas não tão evoluídos como vocês. Muitos encarnaram apenas poucas vezes e por ignorância permitiram-se ser hipnotizados por quadros de separação e dualidade. Também na ignorância de quem e do que são eles entregaram seu poder pessoal para aqueles que proclamam ter todas as respostas certas, mas que, por sua vez, usam esses seguidores para obtenção de poder pessoal, limitado e egoísta. Todos eventualmente despertarão como devem despertar, mas isso pode não ocorrer por muitas vidas.

O tempo parece estar passando mais e mais rápido, deixando todos se sentindo frenéticos com a necessidade de realizar muitas coisas a cada dia. Isto é porque a energia tem se tornado mais refinada e mais alta em sua vibração deixando menos da antiga e mais lenta à qual vocês estavam acostumados. Vocês descobrirão nesta energia nova e mais alta, que mesmo que vocês podem parecer ter uma lista sem fim de coisas com que lidar, elas são feitas mais facilmente e de modos mais rápidos. As soluções parecem se manifestar quando necessário.

Vocês podem estar descobrindo que pessoas, locais e crenças que antes faziam vocês reagirem com crítica e julgamento simplesmente não parecem mais importantes. Filmes, livros, música, revistas, programas de TV, alguns esportes e outros entretenimentos previamente adorados não prendem sua atenção como já prenderam. “Entretenimentos” que focalizam nas pessoas de modos preconceituosos ou sarcásticos não atraem, mas são reconhecidos como sendo um comportamento não evoluído baseado no sentido de separação.

O Grupo Arcturiano deseja que vocês saibam que o clima entrará numa época de calma. Está chegando uma época de descanso para o mundo dos esforços que agarram tantos.

Os incêndios, enchentes e climas extremos é o modo de Gaia continuar a remover o remanescente da antiga energia inflamada o que é necessário para sua ascensão. Esses eventos estão servindo também para despertar muitos de uma vez. A antiga energia do “ter e não ter” não serve bem quando todos se encontram no mesmo nível e lidando com as mesmas questões. Todas as experiências terrenas em todas as vidas foram pelo único propósito de levar eventualmente cada alma à realização do UM que está na sua forma mais pura: Amor.

Os refugiados que vocês veem diariamente fugindo da violência e da guerra estão servindo para trazer mais profundamente a atenção do mundo à percepção da Unidade, que todos estão conectados independentemente da língua que falam ou da cor da pele. Essa questão está forçando a atenção e ajudando a despertar muitos que vivem a partir de uma consciência de “não é problema meu” e consideram que os eventos estão ocorrendo em outro lugar e não têm nada a ver com eles. Essas imagens também estão proporcionando um exemplo perfeito de como a guerra e a violência não resolvem nada.

Sempre se lembrem de que todas as almas escolhem ou são ajudas na escolha das experiências necessárias para seu despertar. Experiências de aprendizagem são permitidas apenas quando um indivíduo obtém a força evolucionária necessária para lidar com a experiência e aprender com ela. Há almas espiritualmente evoluídas que parecem ter uma questão problemática atrás da outra e se perguntam por quê. É porque nesta época energeticamente poderosa a maioria de vocês veio com uma lista inteira das lições de vida necessárias para sua conclusão a fim de mudar para a energia da ascensão. Se vocês não fossem totalmente capazes disso, vocês não teriam sido autorizados a trazer tantas lições.

Nós queremos encerrar a mensagem com algumas palavras sobre honra. Honestidade e honra são extremamente importantes quando se faz escolhas e se tem opiniões pessoais. Quando uma ação flui do sentido mais alto de certo de uma pessoa (mesmo que ela seja totalmente da mentalidade tridimensional) ela está se permitindo estar aberta para mudar e ter um entendimento superior de suas crenças e ações.

É imperativo que qualquer um que é sério quanto à jornada espiritual seja extremamente honesto consigo mesmo: “Estou seguindo esta crença ou ação específica porque ela me faz sentir e parecer importante? Ela me dá a sensação de superioridade? Eu não questiono, mas sigo porque sempre foi desse modo? Eu tenho medo de que se eu discordar de minha família, igreja, amigos, pais, eu serei excluído?”

Essas são perguntas que qualquer um sério sobre o crescimento espiritual precisa se fazer com respeito a quaisquer crenças persistentes ou rigidamente mantidas sobre qualquer coisa. “Eu acredito nisso porque me foi revelado como verdade, ou porque me disseram? É medo de perder minha credibilidade como um professor espiritual, um conselheiro, um pai, um amigo fazendo-me continuar em algum sistema de crença que eu superei?”

Honra, honestidade e intenção pura precisam fazer parte de todas as ações tomadas e crenças mantidas se for para crescer e aprender e ascender.

Aqueles que realmente sabem mantêm a verdade que eles conhecem secreta, silenciosa e sagradamente no interior e não sentem necessidade de gritá-la de um palanque ou mudar alguém ou alguma coisa.

Nós somos o Grupo Arcturiano

Fonte: Site Cura e Ascensão

Diante de crise migratória, Alemanha reintroduz controles de fronteiras

Mais cedo, governo interrompeu tráfego de trens a partir da Áustria e disse estar perto de atingir o seu limite


Imigrantes andam na plataforma após chegarem de trem em uma estação em Munique, na Alemanha – MICHAELA REHLE / REUTERS

 

— Neste momento a Alemanha está introduzindo temporariamente controles nas fronteiras internas. O foco será a fronteira com a Áustria — disse Maizière. — O objetivo dessas medidas é limitar os fluxos atuais para a Alemanha.

O tráfego de trens da Áustria para o território alemão já havia sido interrompido, segundo um porta-voz da empresa ferroviária austríaca OEBB. O meio de transporte é o principal usado pelos imigrantes para viajarem de um país para o outro. Por causa de sua prosperidade relativa e postura acolhedora, a Alemanha foi eleita o destino mais desejado dos refugiados.

 

— É verdade: a falta de ação europeia para a crise de refugiados está agora empurrando a Alemanha até o limite de sua capacidade — disse o ministro da Economia Sigmar Gabriel ao site do “Der Tagesspiegel”.

O governo alemão já havia anunciado a expectativa de receber 800 mil novos requerentes de asilo neste ano. A postura foi elogiada pela Cruz Vermelha, que apontou Merkel, como a liderança na crise que divide a União Europeia. Enquanto isso, a Alemanha se tornou um ímã para muitas pessoas que fogem da guerra e da pobreza na Síria e em outras partes do Oriente Médio, Ásia e África.

Naufrágio na costa grega deixa ao menos 34 mortos, quatro deles bebês

Outras 68 pessoas caíram na água, mas foram resgatadas com vida, enquanto 29 nadaram até uma praia


Refugiado sírio resgata bebê após naufrágio na costa da Grécia – ALKIS KONSTANTINIDIS / REUTERS

Ao menos 34 refugiados se afogaram após um naufrágio na costa da Grécia em 13/9/15 informou a guarda costeira grega, entre eles, quatro bebês e dez crianças, informou a agência de notícias grega “Anampa”. Outras 68 pessoas caíram na água, mas foram resgatadas com vida, enquanto 29 conseguiram nadar e chegar em segurança a uma praia da ilha

— Um barco de madeira que os transportava naufragou a cerca de três milhas (4 km) a leste de Farmakonisi início no domingo — disse uma porta-voz da guarda à Reuters.

Segundo as autoridades gregas, os refugiados viajavam em um barco de madeira que tinha partido da Turquia. Ainda não foram divulgadas as idades ou nacionalidades das vítimas, mas a agência grega divulgou que quatro delas eram bebês, dez crianças, seis mulheres e oito homens.

 

As ilhas gregas têm recebido nos últimos meses um número sem precedentes de refugiados que fogem de países do Oriente Médio e África e buscam uma vida melhor na Europa. Só neste domingo, um fotógrafo da Reuters viu 10 botes chegando em um período de 90 minutos.

O acidente coincidiu com um pedido do primeiro-ministro grego interino, Vasiliki Thanou, para que a União Europeia adote uma política abrangente para lidar com o número crescente de refugiados que chegam à Europa, principalmente pela Grécia, Itália e Hungria.

 

— A Grécia implementa estritamente os tratados europeus e internacionais, sem ignorar a humanidade ou solidariedade— disse Thanou, em visita à ilha de Lesbos, considerando “inaceitáveis” as críticas em relação a forma como Atenas lida com a crise.

No sábado, a chanceler alemã, Angela Merkel, pediu ao governo grego que melhore os mecanismos para proteger suas fronteiras. Merkel solicitou também um diálogo com a Turquia para um trabalho conjunto ante os imigrantes que fazem a perigosa travessia no Mediterrâneo no caminho à Europa.

O mais recente relatório da Organização Internacional para as Migrações (OIM) revelou que mais de 430 mil imigrantes cruzaram o Mediterrâneo para a Europa em 2015, um número recorde que representa mais que o dobro do total de todo o ano passado. A OIM, sediada em Genebra, estimou em 432.761 o número de pessoas que fizeram a perigosa travessia, enquanto 2.748 se afogaram. Ainda segundo a instituição, a estimativa é que 309.356 pessoas chegaram à Grécia até 10 de setembro, enquanto 121.139 foram para a Itália, 2.166 para a Espanha e 100 em Malta.

Fonte: O Globo

Milhares de refugiados atravessam da Hungria para Áustria e Alemanha

Mais de seis mil já foram para Viena, de onde devem partir para o território alemão; franceses apoiam chegada


Refugiados saem no último trem de sábado para Viena: dia feliz para os migrantes saindo da Hungria – Vladimir Simicek / AFP
 

 

 

 

 

A polícia alemã informou, neste sábado, que o país deve receber até dez mil refugiados durante o dia neste sábado, após acordo entre autoridades locais e da Áustria com a Hungria para que imigrantes possam cruzar fronteiras. Pelo menos seis mil já haviam chegado, de acordo com os últimos números do país.

– Nós ainda não temos números confiáveis, mas esperamos que hoje cheguem de cinco mil a dez mil refugiados – disse o porta-voz da polícia Stefan Sonntag à Reuters, neste no sábado.

Ele acrescentou que as autoridades ainda estão se articulando para conseguir acolher os refugiados.

Centenas de imigrantes procedentes da Hungria, via Áustria, já chegaram à estação de Munique, no sul da Alemanha, na manhã deste sábado. Dezenas de trens devem se somar aos matutinos durante a tarde. Quase 400 pessoas chegaram à capital da Baviera durante a manhã e espera-se que outros cheguem à tarde, incluindo um “trem especial com entre 400 e 500 pessoas à bordo”, explicou um porta-voz da polícia em Munique.

Na chegada de muitos refugiados a Munique, cidadãos da região recepcionaram o grupo com aplausos.

— Isto deve ser um sinal de o quão atrapalhada a situação na Europa se tornou, Espero que mostre que as coisas não podem continuar como estão — afirmou o ministro de Relações Exteriores austríaco, Sebastian Kurz.

Um menino refugiado brinca com um policial na estação de Munique, na Alemanha – MICHAEL DALDER / REUTERS
 

 

 

 

O mesmo tom de recepção aos migrantes foi adotado na França. Em Paris, ao menos 7 mil pessoas foram às ruas para apoiar o acolhimento de refugiados. Também pediram o fim da guerra na Síria.

“Abram as fronteiras!” “Direito de asilo aos perseguidos!”, diziam os cartazes, ou “Não em meu nome!”, numa crítica aos governos mais reticentes a acolher os refugiados.

Na Áustria, autoridades informaram que 6.500 imigrantes, muitos deles da Síria, entraram no país até o início da tarde deste sábado. Ao menos 2.200 deles já estão a caminho da Alemanha. Parte dos refugiados chegaram ao território austríaco em ônibus fornecidos pela Hungria. O país, no entanto, informou que não vai mais ceder veículos para a fronteira.

Iniciativas em apoio a refugiados mostram lado solidário na Europa

Sensibilizados com tragédias, voluntários lançam iniciativas para ajudar famílias atravessando continentes


Acolhimento. Jovens distribuem frutas a refugiados em Berlim. Enquanto governos ainda discutem como resolver a crise migratória, pessoas se coordenam através da internet para oferecer hospedagem, alimentor e roupas a i – HANNIBAL HANSCHKE / REUTERS
 

 

 

BERLIM – As imagens de uma criança morta numa praia da Turquia, de um caminhão numa estrada austríaca com 71 corpos e do campo de refugiados em plena estação ferroviária de Budapeste comoveram o mundo e despertaram na Europa uma das maiores ondas de solidariedade desde a Segunda Guerra, num momento em que governos e as próprias populações ainda se dividem sobre o tema. Na Alemanha, na Áustria e na Hungria, os abrigos de refugiados foram invadidos por doações de cidadãos comuns: são roupas, brinquedos, alimentos e dinheiro, de quem não esperou os órgãos oficiais para agir.

— Os europeus abriram seus lares e seus corações para os fugitivos — disse Herbert Langtheiler, da ONG Coordenação do Asilo da Áustria, responsável por organizar doações privadas.

No sábado, a Áustria recebeu 6.500 refugiados vindos da Hungria; e a Alemanha, mais 2.200 — com expectativa de fechar o dia em sete mil. Na França e na Espanha, milhares de pessoas saíram às ruas pedindo a abertura das fronteiras aos refugiados. Mais de mil vienenses ofereceram moradia aos imigrantes por meio do Facebook. Outros doaram seu tempo, com programas de lazer para as crianças. O time Áustria Viena anunciou que uma vez por semana vai integrar jovens refugiados em treinos de futebol. Contagiado pela onda de solidariedade, o premier da Finlândia, Juha Sipila, disse que em janeiro porá sua casa de campo à disposição dos refugiados.

— Todos devemos pensar no que podemos fazer — disse ele, cujo país espera receber mais de 30 mil pedidos de asilo este ano, contra 3.600 em 2014. — Um solicitante de asilo merece um tratamento humano e uma genuína atitude de boas-vindas da nossa parte.

Aposentada oferece quarto em Viena

Mesmo no Reino Unido, o país que tinha até agora uma política mais restritiva, começa a surgir uma pressão popular sobre o governo. Uma petição está reunindo cem mil assinaturas a serem enviadas ao Parlamento. No texto, os britânicos afirmam: “Não podemos aceitar que os fugitivos corram risco de vida para escapar de conflitos terríveis para viver em circunstancias desumanas e inseguras na Europa.”

Mas há também os britânicos que iniciaram uma ajuda espontânea e direta aos fugitivos. O professor universitário Michael Stewart criou um grupo do Facebook para que os usuários compartilhem seus lares.

— O poder da rede social une o povo através da Inglaterra e da Europa para algo extraordinário — disse ao jornal “Independent”.

Langtheiler, que trabalha há mais de dez anos com apoio a refugiados, confessa que nunca viu na Europa fenômeno semelhante. Enquanto os governos debatem as cotas, os europeus não hesitaram em iniciar uma das maiores ondas de solidariedade desde 1945. Ao contrário de ocasiões anteriores, quando os doadores eram ricos que contribuíam por meio de organizações da Igreja, hoje a ajuda parte de pessoas da classe média e até de baixa renda, e é prestada quase sempre de forma direta. É o caso da aposentada vienense Maria Schmitt, de 61 anos, que vive num apartamento de dois quartos e ofereceu um deles para abrigar uma família da Síria.

Cada cidade alemã organizou nas últimas semanas ações espontâneas de ajuda, coordenadas por meio do Facebook. Em Berlim, a ONG Pro Asyl recebe uma avalanche de ofertas. Nos últimos dias, pediu aos doadores que deixassem de mandar roupas porque os abrigos de refugiados já tinham vestimentas demais. Rupert Neudeck, de 76 anos, lembra a própria infância ao ler as notícias das tragédias no Mediterrâneo. Nascido em Gdansk, hoje Polônia, Neudeck tinha 5 anos quando a família — ele, os dois irmãos e a mãe — ia embarcar no navio Wilhelm Gustloff, em janeiro de 1945, fugindo do avanço do Exército soviético no fim da Segunda Guerra. Chegaram atrasados e perderam a viagem. O navio foi torpedeado, causando 9.500 mortes. A família chegou à parte ocidental da Alemanha em outro navio. Mas a experiência marcou a vida de Neudeck. Nos anos 1970, ele fundou a ONG Cap Anamur, resgatando milhares de vietnamitas do mar, os chamados boat people.

— Para um refugiado traumatizado com a guerra e com a perigosa fuga para a Europa, o material não é o mais importante. O mais importante é o status, que oferece à pessoa a sensação do “aqui eu posso ficar” e o calor humano da população local — disse Neudeck.

Para muitos, sobreviventes dos horrores do Estado Islâmico e das horas de pânico em embarcações precárias ao atravessar o Mediterrâneo, nem as manifestações de solidariedade da população local ajudam a superar o trauma. Na Europa, precisam ainda enfrentar governos resistentes a acolhê-los, movimentos de extrema-direita que atacam abrigos e países do Leste que resistem a uma divisão de refugiados, mostrando que o pesadelo não termina na chegada.

Húngara usa Facebook para doações

Em Berlim, cerca de cem psiquiatras e psicólogos atuam no tratamento pós-traumático de 500 refugiados. Segundo Doris Felbinger, porta-voz do centro, que é financiado por doações e pela prefeitura, apenas 10% das solicitações são atendidas. Com o aumento do número de refugiados na cidade, ela prevê o aumento dos pedidos.

Para o cientista político Wolf Dombrowski, tragédias como as últimas costumam ter o efeito de despertar o sentimento coletivo de solidariedade. Sobretudo a Áustria e a Alemanha reagem com sensibilidade porque têm ainda na consciência coletiva o sentimento de culpa pelos horrores praticados pelo regime nazista.

Após a Segunda Guerra, os dois países foram também os que mais receberam fugitivos — pessoas que perderam suas pátrias na nova arquitetura europeia pós-1945. Uma das que conseguiram segurança na Alemanha foi a avó de Zsuzsanna Zsohar. Hoje a húngara dedica-se à ajuda a refugiados com a ONG Migration Aid.

— Nós não conseguimos resolver o problema, mas tentamos reduzir o sofrimento — contou. — Avisamos via Facebook do que os fugitivos precisam, como água mineral, sanduíches e cobertores para os que nos últimos dias estiveram confinados na estação ferroviária de Budapeste.

Na “marcha dos desesperados”, de imigrantes que fugiram a pé em direção à Áustria, cidadãos comuns continuaram oferecendo ajuda, sobretudo água e alimentos. Para o cientista político Hajo Funke, da Universidade Livre de Berlim, a crise mudou radicalmente a Europa. Há ainda a minoria neonazista disposta a atacar abrigos de refugiados, sobretudo na Alemanha. Mas a maioria foi tomada pelo sentimento de solidariedade.

— Os europeus passaram a sentir empatia com os fugitivos — disse.

Alemanha disponibiliza mais US$ 6,7 bilhões para acolher imigrantes

Opositores acusam Angela Merkel de criar precedente perigoso ao abrir fronteiras alemãs


Imigrantes recebem comida ao chegar na estação ferroviária em Hegyeshalom, na Hungria – LEONHARD FOEGER / REUTERS
 

 

 

 A Alemanha vai disponibilizar mais € 6 bilhões (US$ 6,7 bilhões ou R$ 25 bilhões) para acolher o grande fluxo imigrantes que chegam ao país, cerca de 20.000 só neste final de semana, informou nesta segunda-feira o grupo da coalizão no poder. Metade dessa quantia será enviada para o governo federal e o restante para os estados e municípios, que se encarregam dos abrigos aos refugiados. A medida, no entanto, é alvo de críticas pelos opositores, que acusam a chanceler Angela Merkel de criar um precedente perigoso ao abrir as fronteiras alemãs.

— O que vivemos agora é algo que continuará nos preocupando nos próximos anos, nos mudará e queremos que a mudança seja positiva — disse Merkel a jornalistas, comemorando o fato do país ser associado ao sentimento de esperança. — É algo muito valioso se observarmos nossa história.

A expectativa é que nesta segunda-feira, mais de 10.000 pessoas cheguem ao território alemão, segundo as autoridades. No final de semana, milhares de refugiados exaustos foram recebidos por pessoas com cartazes de boas-vindas em estações ferroviárias na Alemanha, com várias declarações de apoio aos migrantes.

Na chegada às cidades de Dortmund, Frankfurt e Munique, adultos e crianças encontraram também voluntários com alimentos, roupas e cobertores. Os imigrantes alcançaram o país depois de longa jornada, passando pela Hungria e pela Áustria — com um improvisado corredor humanitário. Muito deles querem chegar à Alemanha, que prevê a entrada de 800.000 solicitantes de asilo neste ano, quatro vezes mais que os 200.000 em 2014.Mas as autoridades da Baviera, região que recebeu a maioria dos imigrantes, disseram que estão a ponto de ruptura.

— Estamos bem no nosso limite — disse Christoph Hillenbrand, o presidente do Governo da Alta Baviera, ressaltando que ficou surpresa com a quantidade de pessoas que chegou no domingo

Em Bade-Wurtemberg, no Sudoeste do país, um incêndio em um abrigo a refugiado deixou cinco feridos. Duas pessoas sofreram ferimentos nas pernas depois de pularem de uma janela para escapar das chamas, enquanto três foram tratados por inalação de fumaça, informou a polícia. As autoridades ainda investigam o que iniciou o fogo no centro de imigrantes, que abrigava 80 pessoas.

Em dia de solidariedade, milhares de refugiados têm recepção calorosa na Alemanha

Adultos e crianças são recebidos com cartazes de boas-vindas, países vizinhos ajudam com corredor e líderes fazem apelos

por O Globo / Com agências internacionais
/ Atualizado
Pequeno migrante sorri a caminho da estação de Hegyeshalom, na Hungria: país está facilitando travessia Foto: SRDJAN ZIVULOVIC / REUTERS

Pequeno migrante sorri a caminho da estação de Hegyeshalom, na Hungria: país está facilitando travessia – SRDJAN ZIVULOVIC / REUTERS
 

 


Milhares de refugiados exaustos foram recebidos por pessoas com cartazes de boas-vindas em estações ferroviárias na Alemanha, neste domingo, dia de solidariedade pelo continente europeu, com várias declarações de apoio aos migrantes. Na chegada às cidades de Dortmund, Frankfurt e Munique adultos e crianças encontraram também voluntários com alimentos, roupas e cobertores. Os migrantes alcançaram o país depois de longa jornada, passando pela Hungria e pela Áustria — com um improvisado corredor humanitário.

Até o meio da tarde, cerca de seis mil refugiados já tinham chegado à Alemanha, a maior parte à região da Baviera, no sul do país. De acordo com a polícia federal, dez mil pessoas devem entrar no país neste domingo. No sábado, oito mil imigrantes entraram na Alemanha, a maioria de trem ou ônibus.

— Muitos imigrantes não estão entendendo porque é que há todo esse tumulto e me perguntam o que essas pessoas querem – disse a voluntária Lara Sabbagh à AFP — Eles não entendem imediatamente que estamos aqui para ajudá-los.

— É claro que temos limitações para receber os migrantes, mas não estamos questionando isso. O que me pergunto é como os acomodaremos, e como daremos garantia de que estarão seguros em Munique e na Alemanha — contou em coletiva de imprensa o prefeito Dieter Reiter.Em uma Europa dividida sobre o que fazer com a crise migratória, a pior desde o fim da II Guerra Mundial, a Alemanha relaxou regras para o acolhimento de refugiados.

No sábado, cerca de dez mil migrantes chegaram à Áustria. Deles, oito mil seguiram para a Alemanha, de acordo com autoridades. Neste domingo, o fluxo continua, com expectativa de 12 mil chegando ao país.

A Hungria anunciou que está facilitando o uso dos sistemas nacionais de transportes para que os migrantes se desloquem com mais facilidade em direção à Áustria. No sábado, o país disponibilizou ônibus e trens separados para os refugiados, buscando não misturá-los à população que normalmente utiliza os serviços. Na média, a saída de um trem para a fronteira está ocorrendo poucos minutos depois da chegada à estação de Keleti.

Um grupo voluntário começou a fazer doações de sapatos para os refugiados chegando à estação de Keleti.

 

DO VATICANO AO FUTEBOL E AO CINEMA

Pela manhã, o Papa Francisco se juntou à onda de solidariedade na Europa. O Pontíficie declarou que 0 o Vaticano receberá duas famílias de refugiados e conclamou paróquias, mosteiros e conventos na Europa a fazerem o mesmo.

Em Estocolmo, o premier sueco, Stefan Löfven, pediu um sistema de cotas “permanente e obrigatório” na União Europeia (UE), coincidindo com uma manifestação a favor dos refugiados.

Seguindo o exemplo do Bayern de Munique e do Real Madrid, o Roma anunciou que arrecadará fundos para o Alto Comissariado para Refugiados da ONU (Acnur) e organizações como Save the Children, Comitê Internacional de Resgate e Cruz Vermelha.

No Festival de Cinema de Veneza, onde atores e diretores partilharam suas angústias e pediram tolerância.

— Sou um mexicano vivendo na Europa e sempre me senti bem-vindo. Gostaria que hoje e no futuro a mesma recepção pudesse ser estendida a outros imigrantes — disse o diretor mexicano Alfonso Cuarón, que preside o júri do festival italiano.

NA FRANÇA, MAIORIA É CONTRA REGRAS MAIS BRANDAS

Embora milhares tenham ido às ruas em Paris no sábado para apoiar o acolhimento de refugiados, uma pesquisa divulgada neste domingo indica que a maioria dos franceses é contra a flexibilização de regras para refugiados. O levantamento feito pelo Odoxa para o jornal Le Parisien-Aujourd’hui mostrou que 55% dos mil entrevistados se opõem a normas mais brandas.

Chegam a 44% os que acham que a França está sendo tão hospitaleira com os migrantes quanto a Alemanha. Seis em cada dez pessoas disseram que apoiariam a participação da França em uma coalização para enviar tropas terrestres para a Síria para lutar contra o Estado islâmico.

Estação de Dortmund estava cheia neste domingo – INA FASSBENDER / REUTERS
 

 

REINO UNIDO USARÁ PARTE DE ORÇAMENTO DE AUXÍLIO

Já o Reino Unido anunciou que usará parte do seu orçamento de auxílio internacional para ajudar a cobrir os custos de acomodação de refugiados chegando da Síria. A medida foi anunciada pelo ministro das Finanças, George Osborne, neste domingo, numa tentativa de conter as preocupações do público com o impacto nos serviços locais.

O orçamento para ajuda internacional equivale a 0,7% do Produto Interno Bruto (PIB).

– A ajuda internacional que temos…pode proporcionar suporte no primeiro ano para esses refugiados, pode ajudar os conselhos locais com coisas como moradia – disse Osborne à BBC.

Cameron não disse quantos refugiados receberia, mas uma porta-voz da agência de refugiados das Nações Unidas afirmou quatro mil sírios serão acolhidos na Grã-Bretanha.

Imigrantes são recebidos com cartazes de boas vindas na estação de Dortmund – INA FASSBENDER / REUTERS
 

 

Fonte: O Globo

Artigo: O suplício dos refugiados, vergonha mundial

Quando têm chance, as crianças se recuperam. Pena que as oportunidades sejam tão poucas


Os pequenos Abdul Rahman e Miran Ali vieram do Afeganistão e dormem ao relento na ilha grega de Leros – Lefteris Pitarakis / AP
 

 

O mundo enfrenta a maior crise de refugiados desde a Segunda Guerra Mundial: são 60 milhões de pessoas desalojadas, sendo quatro só na Síria. E os líderes mundiais abdicaram de qualquer responsabilidade perante essa população desafortunada, metade da qual é composta de crianças. A situação tem uma triste semelhança com a dos que tiveram que fugir da violência nazista: também naquela época a maioria dos governos lhes virou as costas e milhões morreram na penúria.

Estamos atolados em uma série de políticas míopes, mesquinhas e cruéis. As poucas instituições mundiais dedicadas a ajudar esse grupo praticamente não têm recursos, seja porque as lideranças não as subsidiam ou porque não atenderam aos seus pedidos de investimento. As nações ricas e poderosas tampouco estão fazendo sua parte; os EUA, por exemplo, receberam até agora menos de mil sírios.

Recentemente o Programa Alimentar Mundial foi forçado a cortar o valor da cota reservada a cada família refugiada no Líbano para US$13/mês; em janeiro esse valor era US$27.

 

No Iraque, a ONU anunciou que uma “falta de fundos paralisante” foi a causadora da suspensão de serviços de saúde para um milhão de pessoas. Isso significa que centenas de milhares de crianças não serão vacinadas contra a pólio e o sarampo, dando brecha para o reaparecimento dessas doenças em uma região já praticamente devastada. O Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados calcula que 700 mil crianças sírias nos países vizinhos não estejam na escola por pura falta de dinheiro. Uma das consequências imediatas foi o salto no trabalho infantil, com meninas no início da adolescência (ou até mais jovens) sendo forçadas a se casar.

No ano passado visitei uma escola para refugiados administrada por voluntários em Reyhanli, cidadezinha na fronteira da Síria com a Turquia. Durante o intervalo, um professor me mostrou fotos terríveis do que aconteceu com alguns de seus ex-alunos na Síria, quando o regime usou armas incendiárias em um complexo escolar. Enquanto tentávamos segurar o choro, duas meninas se aproximaram, alegres, querendo brincar com o par de luvas de boxe que um dos voluntários tinha arrumado. Nesse instante o professor escondeu o telefone com as imagens dos pequenos queimados, os corpinhos encolhidos nas macas, enrolados em gaze. No pátio, um grupo de garotas jogava futebol, gritando de prazer a cada bola chutada a gol, feito ou não.

Quando têm chance, as crianças se recuperam. Pena que as oportunidades sejam tão poucas.

Dos quatro milhões de refugiados sírios, cerca de dois estão na Turquia e um, no Líbano. E a guerra na região pode se ampliar: os turcos já anunciaram que vão abrir a base aérea de Incirlik para as operações norte-americanas contra o Estado Islâmico e começaram uma campanha de bombardeio contra os insurgentes curdos no Iraque. Essa mesma insurgência na Turquia, que dura quatro décadas, já matou 40 mil pessoas, embora uma trégua frágil se mantenha há alguns anos. A retomada da luta em grande escala representaria um desastre ainda maior para o país e para a região.

Do outro lado da fronteira, perto da escola que visitei, um campo de refugiados se vê em ruínas. De vez em quando, alguns voluntários arriscam a vida para levar comida aos infelizes que lá estão – e apesar das inúmeras demonstrações de boa vontade e heroísmo pessoal, há um limite para o que esses jovens conseguem fazer. Para receber, alimentar, imunizar, reassentar e ajudar tanta gente, só em um nível institucional, com organizações mundiais. No momento, praticamente todo o peso se divide entre alguns poucos vizinhos – Turquia, Líbano e agora a Grécia –, que recebem uma ajuda insignificante de fora, quando recebem. Não surpreende que tantos refugiados arrisquem a vida para chegar à Europa.

Uma crise desse tamanho não pode ser solucionada com heroísmo individual, por mais admiráveis que sejam as intenções. Grandes números de pessoas não podem ser acolhidas através de instituições beneficentes, por mais bem intencionadas que sejam.

Há questão de duas semanas, uma adolescente palestina cuja família pode ser deportada da Alemanha perguntou a Angela Merkel, em um alemão perfeito, por que sua família não podia ficar e por que ela não podia ir à escola para estudar como os outros. A chanceler respondeu, em um discurso seco: “Às vezes, a política é dura. Você sabe que nos campos de refugiados palestinos no Líbano há milhares de pessoas. Imagine se falássemos que todos podem vir… não conseguiríamos dar conta.” Com isso, a menina caiu no choro e Merkel foi pega de surpresa. Suas tentativas de consolar a garota foram registradas e compartilhadas no mundo inteiro.

 

Não basta dizer que “a política é dura”.

Claro está que os nossos líderes não estão correspondendo à gravidade do momento. Nós podemos e devemos forçá-los a fazer a coisa certa. Se distribuído adequadamente, o custo não será alto para ninguém. O mundo de hoje é muito mais rico que o da Segunda Guerra Mundial e o conflito não é global. Em 2014, o orçamento total do Programa Alimentar Mundial foi de míseros US$5,4 bilhões; o do ACNUR, US$8 bilhões. Para colocar esses valores em contexto, a capitalização de mercado da Amazon, há pouco tempo, pulou para US$40 bilhões, após o fechamento do pregão normal, depois de anunciar que seus serviços de hospedagem de aplicações foram um pouco mais lucrativos que o esperado. Pelo visto, salvar milhões de crianças fugidas da guerra não vale uma fração de uma noite de especulação de uma única empresa.

No mês passado o mundo perdeu um herói discreto: Nicholas Winton, que salvou quase 700 crianças, na maioria judias, da Tchecoslováquia, realocando-as com famílias britânicas antes da invasão de Hitler. O que não foi mencionado na homenagem feita à incrível vida que levou – ele nunca quis ser reconhecido pelas boas ações – foi o remorso profundo por milhares de pequenos que não pôde salvar. E os governos do mundo de hoje as ignoram completamente. Será que não aprenderam nada desde então?

Polícia da Macedônia lança bomba de gás lacrimogêneo contra imigrantes na fronteira

Pelo menos oito refugiados ficaram feridos nos confrontos. Governo declarou estado de emergência na quinta-feira


 

Mais de 1.000 imigrantes pressionaram os policiais na fronteira entre a Grécia e a Macedônia nesta sexta-feira, levando ao menos dez pessoas a desmaiarem depois de serem pisoteadas. A cena ocorreu depois que a polícia macedônia permitiu que centenas de pessoas ao relento desde quinta-feira entrassem, seguindo uma ordem do governo. Segundo o ministério do Interior, o país só tem capacidade de receber uma pequena parcela dos refugiados que tentam chegar a partir da Grécia. Enquanto isso a ONU pediu que o governo preste assistência às “pessoas presas no lado grego da fronteira” e respeite os imigrantes.

— Nós estamos permitindo a entrada de um número de pessoas que corresponde à nossa capacidade de transportá-los e de dar cuidados e tratamento médico adequado — informou o porta-voz do ministério do Interior, Ivo Kotevski.

Segundo testemunhas que falaram à Reuters, as pessoas gritavam enquanto os trabalhadores médicos corriam para os que desmaiaram ou ficaram feridos. A fronteira foi reaberta temporariamente horas depois de forças especiais da polícia da Macedônia dispararam bombas de efeito moral para dispersar os milhares de imigrantes na fronteira do país, que declarar estado de emergência no dia anterior

 

Segundo as autoridades, cerca de 3.000 pessoas passaram a noite ao relento e teriam tentado avançar contra policiais após o fechamento da fronteira na cidade de Gevgelija, o que teria provocado a reação dos agentes. Pelo menos oito pessoas ficaram feridas nos confrontos.

Depois que os agentes lançaram bombas de gás lacrimogênio, multidões correram e tentaram se proteger. Testemunhas contaram que um jovem estava sangrando com um ferimento causado pelo que parecia ser estilhaços das granadas disparadas diretamente contra os clandestinos. Os policiais, apoiados com veículos blindados, colocaram arame farpado nos trilhos de trem onde as pessoas estavam atravessando a pé.

Imigrante com bebê nos braços fica preso em arame farpado enquanto tenta atravessar da Grécia para a Macedônia – Darko Vojinovic / AP
 

O Alto Comissariado da ONU para Refugiados (Acnur) expressou preocupação com a força usada pela polícia para dispersar os refugiados. Em resposta o chanceler Poposki informou que a fronteira não será fechada no futuro.

Os imigrantes, muitos deles com bebês e crianças pequenas, passaram a noite fria em um campo de terra com pouca água e sem comida. Alguns comeram milho que pegaram de plantações próximas.

— Eu não sei por que estão fazendo isso conosco — disse o iraquiano Mohammad Wahid. — Eu não tenho passaporte ou documento de identidade. Eu não posso voltar e não tenho para onde ir. Eu vou ficar aqui até o fim.

  • Migrante tenta proteger seu filho pequeno de conflitos que deixaram feridos na fronteira macedônia…Foto: Darko Vojinovic / AP

  • Do lado grego, um refugiado descansa, em busca de travessia para o guardado lado macedônioFoto: ALEXANDROS AVRAMIDIS / REUTERS

  • Refugiados esperam por autorização para cruzar a fronteira em IdomeniFoto: Darko Vojinovic / AP

  • Policiais e refugiados iniciaram confronto após impaciência com superlotação e lentidão para…Foto: SAKIS MITROLIDIS / AFP

  • Em Gevgelija, policiais fecharam cerco e contiveram manifestantes com bombas de gás lacrimogêneo e…Foto: ROBERT ATANASOVSKI / AFP

  • Refugiada passa com seu bebê por bloqueio perto de linha ferroviáriaFoto: Boris Grdanoski / AP

  • Alguns ficaram encurralados no cerco, que teve dez feridosFoto: OGNEN TEOFILOVSKI / REUTERS

  • Após confusão, funcionários da ONU chegaram ao local para ajudar migrantesFoto: OGNEN TEOFILOVSKI / REUTERS

  • Funcionário da agência de refugiados da ONU tentam orientar multidão em fúriaFoto: Boris Grdanoski / AP

1 de 9

AnteriorPróximo

Um homem sírio de 18 anos disse à Reuters que conseguiu atravessar durante a noite para a Macedônia, mas outros que estavam com foram capturados e levados de volta para o lado grego.

— Eu corri rapidamente e escapei — disse ele. — Eles pegaram meu irmão e a maioria dos outros e os mandaram de volta para a Grécia.

A Macedônia se tornou um importante ponto de trânsito para os imigrantes que tentam chegar embarcar em trens para a Sérvia ou Hungria, a partir de onde pretendem seguir ao Norte da Europa, principalmente para Reino Unido ou Alemanha. Nos últimos dois meses, 44.000 pessoas já teriam viajado pelo país, com o registro de cenas caóticas nas estações ferroviárias.

Imigrantes tentam passar para a Macedônia a partir da Grécia, mas são barrados por policiais – SAKIS MITROLIDIS / AFP
 

Por dia, a crise dos refugiados em Gevgelija, no Sul do país na fronteira com a Grécia, atingiu números impressionantes, entre 1.500 a 2.000. Mas o fluxo foi interrompido nos últimos dias depois do fechamento da fronteira. Enquanto isso, grupos de mulheres, homens e crianças, em sua maioria sírios, resistem nas altas temperaturas sem ter abrigo nem acesso a serviços básicos.

O governo macedônio também instalou um gabinete de crise para traçar um plano de ação que permita gerir a entrada massiva de imigrantes. Na quarta-feira, o governo alertou para a situação “alarmante” do país e pediu aos Estados vizinhos que enviassem vagões vazios para transportar os refugiados para o Norte, já que não havia trens suficientes. No entanto, a agência de refugiados das Nações Unidas pediu para o governo fazer mais, ressaltando que é necessário um local para acomodar os imigrantes.

Os refugiados são em sua maioria cidadãos da Síria, Somália, Paquistão, Afeganistão e Iraque, que fogem da pobreza, perseguições e conflitos em seus países.

Leia mais sobre esse assunto em http://oglobo.globo.com/mundo/policia-da-macedonia-lanca-bomba-de-gas-lacrimogeneo-contra-imigrantes-na-fronteira-17257457#ixzz3jgPVxQCF
© 1996 – 2015. Todos direitos reservados a Infoglobo Comunicação e Participações S.A. Este material não pode ser publicado, transmitido por broadcast, reescrito ou redistribuído sem autorização.

Macedônia desiste de conter migrantes, e cinco mil entram na Sérvia

Ônibus e trens levaram refugiados ao norte após dias de distúrbios causados pelo fechamento da sua fronteira ao sul


Migrantes caminham ao longo de ferrovia passando em frente às forças policiais da Macedônia prestes a cruzar a fronteira da Grécia com o país, próximo à vila de Idomeni, no domingo, 23 de agosto de 2015 – ALEXANDROS AVRAMIDIS / REUTERS
 

 

O fluxo é intenso, e a Grécia transportou de barco lotadas de refugiados das ilhas para o continente. Um recorde de 50 mil pessoas chegou ao território grego pelo mar da Turquia só em julho.

O ministro da Defesa da Sérvia, Bratislav Gasic, em visita a um centro de acolhida de migrantes na fronteira com a Macedônia, disse que 5.000 pessoas haviam entrado durante a noite.

Longas filas se formavam, e imigrantes do Oriente Médio, África e Ásia esperavam pelos documentos para legalizar sua viagem através da Sérvia, para depois cruzar a pé para a Hungria e para a zona sem fronteira Schengen da Europa.

Número de migrantes ilegais chegando à Europa em julho supera o triplo de 2013: 108 mil

Com mais de 340 mil refugiados desembarcando pelo mar, recordes de 2014 são quebrados; Grécia rebate ONU


Crianças afegãs esperam refúgio em ilha grega: crise só aumenta – Lefteris Pitarakis / AP
 

 

Quase 108 mil migrantes entraram ilegalmente na União Europeia em julho, segundo dados da agências de fronteiras do bloco, a Frontex. A quantia, composta principalmente por sírios que tentam atravessar da Turquia para a Grécia, superou com facilidade a de julho de 2014 (70 mil) e mais de três vezes a de 2013

De acordo com a Frontex, os recordes foram nas ilhas gregas no Mar Egeu, com 50 mil imigrantes chegando principalmente da Turquia. O destino tem sido mais procurado no verão pela maior facilidade de chegar à União Europeia, assim como o Mediterrâneo.

Quase 340 mil imigrantes já desembarcaram na UE desde o início do ano, principalmente através de Itália, Grécia e Hungria. São 175% a mais que no período equivalente de 2014, quando o ano inteiro — que já quebrara recordes — teve 280 mil chegando.

 

 

A UE afirma que quase 626 mil pessoas solicitaram asilo no mês passado. Apenas a Alemanha já vislumbra 750 mil pedidos neste ano.

Os aumentos drásticos na crise migratória se devem principalmente à intensificação dos conflitos no Oriente Médio e em regiões da África. Somente Síria e Eritreia concentram a maior parte dos refugiados que arriscam as vidas no mar.

GRÉCIA CRITICA QUESTIONAMENTOS

Apenas na Grécia, 21 mil imigrantes desembarcaram na semana passada. O país vive um caos migratório em pleno período de indefinição total da economia.

Um porta-voz da agência de refugiados da ONU (Acnur) em Genebra disse que o país precisava mostrar “muito mais liderança” para lidar com a crise. Mas as autoridades gregas disseram que precisavam de uma melhor coordenação dentro da União Europeia.

“Esse problema não pode ser resolvido através da imposição de processos legais rigorosos na Grécia, e, certamente, não levando os barcos de volta”, disse a porta-voz do governo, Olga Gerovassili. “A imigração também não pode ser abordada através da construção de cercas.”

Em Idomeni, fronteira grega com a Macedônia, refugiados atravessam campos de girassois em busca de refúgio – Joe Sinclair / AFP

Na Eslováquia, refúgio para migrantes se aplica apenas a cristãos

Governo nega tratar-se de uma política discriminatória, e afirma que refugiados muçulmanos não se integrariam


Imigrantes sírios esperam na fronteira greco-macedônia, buscando refúgio em outros países – YANNIS BEHRAKIS / REUTERS

 

Após uma série de declarações contraditórias sobre o número de imigrantes que a Eslováquia consegue acolher — o plano de Bruxelas, rejeitado pelos Estados-membros da União Europeia, previa uma cota obrigatória de 1.200 pessoas por país — o primeiro-ministro Robert Fico aceitou receber até 200 refugiados. Mas com uma condição: que todos sejam cristãos. As famílias, já identificadas pelo governo, seriam sírias (apenas 10% da população do país é cristã).

— Poderíamos acolher 800 muçulmanos, mas não temos nenhuma mesquita na Eslováquia. Como vão ser integrados se eles não gostariam de estar aqui? — justificou à BBC o ministro de Interior eslovaco, Ivan Metik, negando tratar-se de uma política discriminatória. — Realmente queremos ajudar a Europa, mas somos um país de trânsito. As pessoas não querem ficar na Eslováquia.

Em junho, a União Europeia concordou em realocar 40 mil solicitantes de asilo sírios e eritreus que chegaram às costas italianas e gregas. Sem citar diretamente a declaração do premier, a Comissão Europeia lembrou, por meio de sua porta-voz, Annika Breidthardt, que tratados europeus “impedem qualquer tipo de discriminação”.

 

 

Mas o país não é o único que pretende escolher os acolhidos. Com 7,8% de muçulmanos, o governo búlgaro já afirmou que teme ver “perturbado o equilíbrio étnico do país” com o plano europeu.

Em maio, a primeira-ministra polonesa, Ewa Kopacz, também disse que a Polônia só pretendia receber 60 famílias cristãs — dois meses depois, no entanto, aceitou abrir as portas a dois mil imigrantes vindos da Síria e do Norte de África, sem especificar religião.

Fonte: O Globo

Vivendo sob o céu de Paris

Imigração e crise aumentam presença de sem-teto nas ruas da capital francesa


Originário da Sardenha, na Itália, Jimie está há 41 anos na França, e dorme nos subterrâneos da linha 13 do metrô parisiense. – Fernando Eichenberg / O Globo

Numa gelada manhã de final de novembro do ano passado, numa Paris já de ares natalinos em pleno inverno europeu, Pascal, 54 anos, assentado na laje fria da calçada na rua Odessa, no bairro Montparnasse, recebeu uma esmola de fazer acreditar na existência de Papai Noel: € 800 de uma só vez.

— O homem disse que havia ganhado na loteria, e deu essa bolada na minha mão. Em apenas quatro horas, havia juntado € 1.217 — conta ele, com inesquecível exatidão numérica, acomodado na mesma esquina afortunada, agora no agosto do verão parisiense.

Pascal não trabalha, mas cumpre com rigor o horário de sua jornada. Diariamente, se instala às 8h em seu imutável ponto de mendicância, de onde só sai no início da tarde. Mas nem todo dia é de surpresas natalinas. Naquela manhã, havia acumulado € 14 em moedas em seu copo de plástico. Por muitos anos — ele diz não lembrar quantos —, Pascal viveu na rua. Mas há alguns meses dorme todas as noites no albergue da associação Espace Solidarité Insertion, na avenida René Coty.

Um homem se aproxima e lhe pergunta se gosta de presunto, ao mesmo tempo lhe passando uma sacola de supermercado garnida de alimentos e suco de laranja. Uma mulher da vizinhança lhe cumprimenta e deposita uma moeda em seu copo. Mas ao avistar no interior algumas moedas de centavos, esbraveja: “Como alguém tem coragem de oferecer centavos como esmola?”. Calmamente, Pascal explica que o doador havia sido uma criança. “Ah bom, criança pode”, se desculpa a mulher despedindo-se, e contando que está atrasada para a sessão do cinema contíguo.

Nascido na região de Calais, Pascal desembarcou na capital francesa aos 16 anos. Chegou a trabalhar como pâtissier, mas sofreu um problema na mão e não conseguiu mais emprego.

— O que vou fazer? Como vou trabalhar? Eu era um bom pâtissier. Você tinha de ver minhas tortas. Hoje, com o que ganho aqui dá pra viver, sempre vem alguma coisinha, seja no inverno ou no verão. Mas no inverno é melhor — reconhece.

Pascal é um SDF, emblemática sigla correspondente a um crescente problema social na França: as pessoas Sem Domicílio Fixo. Os sem-teto passaram a integrar a paisagem da cidade diante da indiferença de parisienses e do espanto de turistas. O mais recente e minucioso estudo feito pelo Instituto Nacional de Estatísticas e Estudos Econômicos (Insee, na sigla em francês), em conjunto com o Ateliê Parisense de Urbanismo (Apur), apontou, no período de dez anos a partir de 2001, um aumento de 84% de SDFs na capital francesa. Em 2012, havia 28.800 mil sem-teto adultos em Paris, número equivalente a 43% do total no país. A pesquisa revelou ainda que um terço deles possuía algum tipo de emprego, e que 56% eram estrangeiros. Como parte da política do município de ajuda aos sem-teto, Paris foi dividida em quatro setores, cada um deles monitorado por uma associação de caráter social: Emmaüs Solidarité (Norte), Aurore (Oeste), Aux Captifs la Libération (Leste) e Les Enfants du Canal (Sul).

Sentado na mureta em frente à entrada principal da estação ferroviária Gare Montparnasse, Jimie, 55 anos, expressava uma mistura de irritação e abatimento. Nos últimos dias, havia passado as noites nos subterrâneos da linha 13 do metrô parisiense.

— Eu durmo mal no metrô, meus olhos doem não sei por que, e estou doente — queixava-se.

Um colega seu da rua, em um momento de desatenção, deixou que furtassem a sacola com os seus documentos . Jimie estava enraivecido:

— Eu pedi para ele olhar para mim por apenas cinco minutos! E quando voltei alguém havia levado e ele não viu.

Originário da Sardenha, na Itália, Jimie está há 41 anos na França, mas quase nunca trabalhou, e atravessou os anos entre a rua, albergues públicos e alojamentos provisórios. Recentemente, conseguiu um quarto em um hotel barato, o qual acabou perdendo por falta de recursos para pagar, e agora depende do 115. Os três algarismos são a senha mágica para os SDFs que almejam pernoitar em algum abrigo. O número de telefone funciona 24h, e o serviço direciona os sem-teto para algum estabelecimento gerido pelo Estado ou por alguma associação que possua uma vaga disponível para aquela mesma noite. Mas obter um lugar muitas vezes se assemelha a uma travessia do deserto.

— Tento ligar quando consigo, mas está quase sempre ocupado, e quando alguém atende me diz que não há leitos — diz Jimie, desolado.

Cheik Sylla e Davide D’Adorante, funcionários da associação Aurore — em atividade desde 1871 no auxílio a pessoas em situação de precariedade e de exclusão social na França — procuram reconfortá-lo em sua ronda ao encontro dos sem teto. A missão de Cheik, originário do Senegal, e Davide, da Itália, é de principalmente ganhar a confiança dos SDFs e tentar ajudá-los na medida do possível em suas demandas.

— Não queremos impor nada. A iniciativa tem de partir deles. Mas tentamos lhes abrir caminhos e alternativas — explica Cheik.

Naquela manhã, ele e Davide deram a Jimie uma cartela mensal para que pudesse jantar gratuitamente em um dos sete restaurantes solidários da rede de estabelecimentos criada pelo Centro de Ação Social de Paris, gerido pela Subdireção de Solidariedade e de Luta Contra a Exclusão Social (SDSLE). Mas sua tentativa de lhe obter uma cama para aquela noite foi frustrada.

Na parte lateral da estação, na rua du Départ, entre a entrada da garagem do supermercado Monoprix e o bar-café l’Atlantique, Phillipe, 60 anos, pode ser avistado todos os dias pela manhã, sentado em uma banqueta alta, suas duas muletas encostadas na parede. Foi um SDF desde os primeiros dias de vida, nascido de um parto na rua, no 14° distrito da cidade. Nos últimos anos, dormiu muitas noites ali mesmo, protegido pelo muro na parte interna da garagem.

— Mas é preciso dormir com um olho bem aberto — alerta.

Sua história, verdadeira ou não, é digna de um filme. Phillipe conta que por dez anos integrou a unidade de paraquedistas das forças especiais do exército francês. Sua deficiência, diz, é consequência de uma bala recebida na perna durante uma operação no Afeganistão. Mais do que isso alega não poder revelar, por conta do “segredo de defesa nacional”. Fora do serviço militar, foi experimentar a vida em Londres, na companhia de um amigo, que o teria convencido depois a se aventurar em Nova York.

— Fomos juntos. Tínhamos US$ 3,5 mil cada um. Gastamos tudo lá praticamente em uma só noite. Conseguia algum dinheiro depois com uns trabalhos. Então conheci minha mulher, mas ela morreu no atentado na segunda Torre Gêmea, em 2001. Em 2004 retornei para a França, mas nunca me recuperei da perda dela.

Transeuntes que moram nos arredores lhe cumprimentam, perguntam como vai, e uma mulher lhe oferece alguns croissants embrulhados em papel. Segundo Phillipe, certa vez uma casal do prédio ao lado do local onde se instala todos os dias lhe deu a chave de casa para que ele cuidasse do gato do apartamento no período de férias.

— Eles confiaram em mim, e ainda me deixaram comida na geladeira por uma semana — conta, com orgulho.

Ele diz recolher entre € 140 e € 160 diários de esmolas. Quanto atinge esta soma, retorna mais cedo para o albergue onde atualmente está alojado.

— Estou bem no albergue. Quando cheguei lá, dividia um dormitório com mais sete SDFs. Agora mudei para um quarto em que somos quatro no total. Mas, por vezes, eu pago uma noite de hotel para poder lavar minha roupa e assistir aos jogos de rúgbi na TV.

No extremo oposto da estação, na rua de l’Arrivée, Lotz, 55, postado em uma das escadarias de acesso à Gare Montparnasse, cumpre um horário germânico em busca de alguma esmola: chega todos os dias às 8h20, e vai embora às 14h. Em sua cabeça, porta sempre um boné com as cores e o nome de algum país diferente. É seu hobby de colecionador. Nesta semana, estava com um de Portugal, depois de ter usado por alguns dias outro da Espanha. Alemão de nascimento, ele viajou em 1998 para a França, de onde nunca mais saiu. Por seis anos trabalhou como um empregado faz-tudo em um restaurante ali mesmo nas proximidades da estação, e depois passou para um outro vizinho, onde permaneceu por dois anos.

— Mas sempre trabalhei clandestinamente, nada declarado, eles não queriam contrato, então não tenho direito a nada. Por meses dormi na rua ali num esconderijo naquele edifício (indica o outro lado da rua). Ajeitava umas folhas de papelão, tinha um saco de dormir…

Hoje, Lotz desembolsa € 320 por um quarto alugado em uma habitação de propriedade da SNCF, a rede ferroviária francesa. E neste verão, seus amigos da companhia de trem conseguiram passagens de graça para que possa ir visitar suas duas filhas que moram na Alemanha. Para poder pagar o aluguel, ele tem atualmente um trabalho parcial como distribuidor de jornais.

— E as esmolas são para gastar com a vida — explica.

Na França desde 2007, onde vgeio estudar o idioma francês, a chinesa Wenjing Guo iniciou seu contato com a Aurore para realizar um estudo sociológico sobre as razões pelas quais SDFs recusam a ajuda social e por vezes preferem permanecer na rua, e a partir de 2012 passou a trabalhar de forma permanente como funcionária da associação.

— O SDF por vezes aceita a a ajuda social para sobreviver fisicamente, e a rejeita para sobreviver psicologicamente — diz Wenjing. — Aceitar, por um lado, é entrar em categorias oficiais estabelecidas pelo Estado, ser estigmatizado por um carimbo administrativo. Há varios elementos subjetivos que atuam. O SDF não quer ser oficalmente excluído socialmente e prefere menater esta “liberdade”. È uma questão de legitimidade e ilegitimidade. O auxílio social implica com que entrem em uma burocracia oficial vista como algo ruim. Por isso é algo que depende muito de como evolui nossa relação com cada um deles, o diálogo estabelecido.

Wenjing testemunha in loco a precarização recrudescida pela crise dos últimos anos e o aumento constante do índice do desemprego, além do crescente núemro de imigrantes.

— Há uma pauperização da população em geral. O SDF não surge do nada, existe um processo que leva pessoas a uma situação extrema. Muitas delas estão perdendo suas moradias. E também somos levados a considerar cada vez mais a questão da imigração. Atendemos cada vez mais estrangeiros sem perspectiva de retorno a seus países. Isso alterou o nosso trabalho cotidiano. Um sem teto já é estigmatizado, e ainda mais sendo estrangeiro…

A maior quantidade de sem-tetos nas ruas na cidade é uma questão “complexa” para os parisienses, segundo sua avaliação:

— É uma presença que incomoda, porque nos lança uma imagem violenta de um mal da sociedade, e nos remete a nossa impotência. Alguns dizem que deve se encontrar uma solução, e outros só os querem fora de vista, se livrar do problema, o que impede uma reflexão mais global.

Moussa Djimera, originário da Mauritânia, está na França desde 1991, e começou a atuar em trabalhos sociais em 1995. Atualmente, coordena duas equipes de contato com sem-tetos nos setores leste e oeste da capital francesa. Ele diz já já ter presenciado “um pouco de tudo” em sua experiência pessoal, e ressalta o grande número de SDFs com problemas psíquicos e/ou de alcoolismo, o que dificulta o trabalho de reinserção.

— Um sem-teto se salvou graças a uma doença. No hospital, lhe disseram que poderia escolher entre continuar a viver ou continuar a beber e morrer. Estava com uns 35 anos. Aos poucos foi aceitando ajuda, um alojamento, achou um trabalho estável. Mas continuou a visitar seus ex-companheiros de rua na Gare de Lyon. Era a sua referência — conta.

Moussa alerta para um problema aque se acentua, e define as novas ondas de imigração como o fenômeno de “um vulcão que explode”, decorrente de um agravamento da pobreza em regiões do planeta e de guerras e conflitos políticos.

— As pessoas fogem para salvar sua pele e também da miséria. Todo este quadro favorece os extremismos na Europa. Mas depois da tempestade vem a bonança. Eu espero pela bonança, mas é um combate diário — diz, sem perder o otimismo.

Num dos quartos do prédio dos fundos da associação Aurore, no número 72 da avenida Denfert Rochereau, Alain, 61 anos, se recupera há três meses de uma cirurgia. Ao lado de sua cama, está uma cadeira de rodas e a prótese de uma perna, do joelho até a extremidade, em pé sobre sua base. Na pequena mesa, distinguem-se apenas dois objetos: sua escova de dentes e um livro, “Dissolução”, de C.J. Sansom, uma intriga policial, política e religiosa na Inglaterra reformista de 1537. Aos 25 anos, Alain partiu do Togo, na África, para a França, e desde então a rua acabou sendo sua morada a maior parte do tempo. Durante uma década, se tornou um conhecido sem teto nos arredores da avenida de Versalhes, no chique 16° distrito de Paris. Na rua, acabou pegando um infecção, e teve a parte inferior da perna esquerda amputada. O hospital Georges Pompidou, onde foi atendido, acabou lhe oferecendo a prótese no valor de €1.800. Ele discute animadamente sobre tudo, da crise na Grécia aos atuais protestos dos agricultores franceses. Alain está satsifeito no albergue, não quer voltar a viver na rua. Deitado, se desculpa por recusar que seja fotografado:

— Não sabia que teria foto. Não me preparei, estou feio, desarrumado.

Fonte: O Globo

Na Grécia, as novas Lampedusas

ONU alerta para caos no país, que recebeu 50 mil imigrantes ilegais em julho, e pressiona França

A imagem é cada vez mais comum pelas ruas e parques públicos de Atenas: sem abrigo, dezenas de refugiados e imigrantes — incluindo famílias com idosos e crianças pequenas — dormem ao relento. Cerca de 400 deles vivem no parque central de Pedion Areos Tou, um dos maiores da capital grega, situação que se repete em outras cidades de trânsito de migrantes como Budapeste, na Hungria; Viena, na Áustria; Calais, na França; e Belgrado, na Sérvia. Mas o impressionante aumento de 750% no número de imigrantes na Grécia, ponto de entrada mais usado na Europa, acendeu o alerta do Alto Comissariado da ONU para Refugiados (Acnur), que estima que 124 mil refugiados chegaram ao país este ano — 50 mil só em julho. O que equivale a mais da metade dos 224 mil de todo o continente em 2015. O Acnur classificou a situação de “caos total” e pediu ação urgente do governo grego para contornar a situação.

Do total, cerca de 60% são provenientes da Síria — a grande maioria vem de países em conflito ou que sofrem violações dos direitos humanos. Cidadãos da África Subsaariana também estão entre os recém-chegados, que incluem ainda afegãos e iraquianos. Chefe do Acnur na Europa, Vincent Cochetel encontrou nas ilhas gregas uma situação aterradora e disse nunca ter visto nada parecido em 30 anos de atividade:

— Em trinta anos de experiência humanitária, jamais vi uma situação assim. É uma vergonha total — afirmou Cochetel após visitar as ilhas de Lesbos, Kos e Chios, aonde chega a maioria destes imigrantes. — Em termos de água, de salubridade, de assistência alimentar, é totalmente inadequado. Na maior parte das ilhas, não há capacidade de recepção, pessoas estão dormindo sob qualquer forma de teto. Depois são transferidos a Atenas; mas não há nada esperando por eles lá.

  • Guarda Costeira italiana ajuda a desembarcar migrantes: fluxo de refugiados não diminuiFoto: GIOVANNI ISOLINO / AFP

  • Muitas crianças e bebês acompanham tentativas de travessia dos paisFoto: GIOVANNI ISOLINO / AFP

  • Autoridades levam mulheres após 381 serem resgatados em barco que naufragouFoto: Carmelo Imbesi / AP

  • Em Pozzallo, na Sicília, cenas de sufoco têm sido recorrentesFoto: GIOVANNI ISOLINO / AFP

  • Na operação, autoridades tiveram que resgatar imigrantes a nadoFoto: – / AFP

  • Já na Hungria, um muro com toda a fronteira sérvia tem causado polêmicaFoto: Sandor Ujvari / AP

  • Da Macedônia, muitos tentam entrar ilegalmente na Sérvia, buscando asilo na União EuropeiaFoto: DIMITAR DILKOFF / AFP

  • Refugiados esperam para entrar na estação de GevgelijaFoto: DIMITAR DILKOFF / AFP

  • Em Atenas, a chegada da migrantes que alcançam as ilhas gregas é tida como insustentávelFoto: Yorgos Karahalis / AP

  • A grave crise econômica forçou o premier Alexis Tsipras a pedir apoio internacional na distribuição…Foto: ANGELOS TZORTZINIS / AFP

  • Outro lugar onde o drama migratório não tem fim é Calais, Norte da FrançaFoto: PETER NICHOLLS / REUTERS

  • Enquanto muitos esperam para tentar cruzar em direção ao Reino Unido, até escolas são improvisadas…Foto: PETER NICHOLLS / REUTERS

Governo grego apela à UE

Uma das grandes dificuldades é justamente como transferir os milhares de refugiados para a capital grega. Depois de dias de penosa travessia do Mediterrâneo, os refugiados são obrigados a percorrer a pé dezenas de quilômetros até a próxima localidade — polícia e governos de algumas ilhas chegaram a proibir o auxílio aos refugiados ou seu transporte para cidades mais próximas.

— O nível de sofrimento que vimos é insuportável. As pessoas vão para lá pensando que chegaram à União Europeia. Mas a forma como são tratadas é inaceitável — afirmou Cochetel.

Há também uma necessidade urgente de aumentar a capacidade de recepção em todo o continente para requerentes de asilo e crianças desacompanhadas (atualmente são 1.100 lugares). Ontem, o Acnur fez um apelo à Grécia para controlar a situação nas ilhas. E alertou que os Estados-membros da União Europeia também devem fazer mais para compartilhar o fardo do país que vive uma crise econômica sem precedentes. O pedido de ajuda foi reproduzido pelo premier grego, Alexis Tsipras, que lembrou que a infraestrutura do país não consegue suportar milhares de imigrantes:

— Agora é hora de ver se a União Europeia é a União Europeia da solidariedade ou é a União Europeia que tem todos tentando proteger suas fronteiras — desafiou.

A falta de estrutura do país para o enorme fluxo de refugiados dos últimos meses foi um dos temas de uma conversa esta semana entre Tsipras e o comissário europeu para as Migrações, Dimitris Avramopoulos. O governo anunciou que criará nos próximos dias uma entidade para receber e gerir o apoio financeiro de emergência de Bruxelas e responder à crise humanitária.

Na última quinta-feira, outra reunião a nível ministerial começou a preparar a atualização do plano de ação nas ilhas de fronteira e o deslocamento temporário dos refugiados que se encontram num dos parques de Atenas. Em comunicado conjunto, o Departamento de Direitos Humanos do Syriza, partido do premier, e a organização de juventude da legenda, pediram que o apoio do governo seja dirigido a estas redes de solidariedade, que “mostram que há outro caminho numa Europa que tem somado fracassos criminosos na gestão política da crise nas suas fronteiras”.

No que diz respeito à crise migratória em Calais, a agência para refugiados convocou a França a apresentar um plano de emergência, lembrando que o país tem obrigações com os cinco mil clandestinos que tentam chegar ao Reino Unido a partir do porto francês. E pediu que o governo de François Hollande revise sua forma de registrar pedidos de asilo — trâmite que exige sete semanas, enquanto em muitos países da Europa o processo é feito em um dia. Ontem, dias após o naufrágio de uma embarcação que deixou mais de 200 mortos — que segundo sobreviventes estavam trancados no porão — uma operação de resgate salvou 600 pessoas.

Infográfico – Editoria de Arte

Travessia infernal

Autoridades levam mulheres após 381 serem resgatados em barco que naufragou – Carmelo Imbesi / AP

A fuga das difíceis condições em seus países de origem se transforma num pesadelo nas mãos dos contrabandistas de pessoas, antes de uma viagem na qual os migrantes que tentam chegar à Europa cruzando o Mediterrâneo enfrentam condições subumanas acompanhadas da incerteza de que chegarão ao destino com vida.

Hamidou, um adolescente de 17 anos, deixou o que classifica como “um grande conflito” no Mali, e após uma viagem de mais de cinco meses nos quais foi levado por gangues de criminosos para a Argélia e a Líbia para realizar a temida travessia.Lá, encontrou um novo cenário de caos e violência.

— Na Líbia, fomos espancados e tivemos armas apontadas contra nossas cabeças — conta o adolescente. — Nos obrigaram a trabalhar para poder viajar.

Com a família de Hamidou viajava um bebê, que passou dois dias sem água ou comida, e foi resgatado — ao lado de 300 migrantes, entre eles várias grávidas e 27 crianças que desacompanhadas — no porto siciliano de Messina.

— Estávamos apavorados, mas estamos felizes por ter chegado à Itália — afirmou o adolescente.

Férias solidárias

A grave crise econômica forçou o premier Alexis Tsipras a pedir apoio internacional na distribuição de refugiados – ANGELOS TZORTZINIS / AFP

 

A paradisíaca Ilha de Lesbos, na Grécia, recebe neste verão uma leva diferente de estrangeiros. O destino de férias dos sonhos para muitos europeus tornou-se também mais uma das portas de entrada de imigrantes que atravessam o mar da Turquia rumo à Grécia.

Na falta de abrigos suficientes, o cenário de refúgio, ao relento, contrasta com as praias de águas cristalinas e montanhas fantásticas, levando muitos turistas a assumirem um papel diferente: em vez de passarem o dia tomando sol, distribuem comida, água e medicamentos.

Tocada com a situação dos refugiados, a holandesa Angelique Bos cancelou o voo de volta com o marido e os quatro filhos para ficarem mais 17 dias distribuindo biscoitos, água e abraços.

— Sempre senti pena dos refugiados quando os via na televisão. Mas agora é diferente. Nós os conhecemos — conta.

O casal britânico Laura Ferris e Pete Oldroyd, além de distribuir comida, brinca com as crianças e limpa o campo de refugiados.

— Essas pessoas passaram por tanta coisa. É de partir o coração. (Do Washington Post)

Odisseia subterrânea

Outro lugar onde o drama migratório não tem fim é Calais, Norte da França – PETER NICHOLLS / REUTERS

 

Andando durante todo o dia, na escuridão, desviando de trens em alta velocidade e fugindo de guardas, o imigrante sudanês Abdul Rahman Haroun percorreu os 50 quilômetros do túnel do Canal da Mancha, entre a França e o Reino Unido, até ser preso pouco antes da entrada britânica, dez horas depois. Foi a primeira vez que alguém chegou tão longe no túnel. Um alarme disparou no “intervalo 5” em Calais sinalizando uma anomalia, e o tráfego foi suspenso nos 17 km do trecho, enquanto a polícia revistava a área — o que provocou atrasos de até duas horas.

Encontrado próximo à entrada britânica, na noite de terça-feira, Haroun, de 40 anos, foi acusado de “causar obstrução usando a ferrovia”, e irá se apresentar para julgamento em agosto:

— Este tipo de invasão criminosa no túnel é muito rara e é ilegal, além de extremamente perigosa — afirmou um porta-voz da Eurotunnel. — Ele não só correu um risco significativo de ser seriamente ferido ou morto, como também perdeu todas as chances de solicitar asilo ou encontrar trabalho no Reino Unido.


A França que abre as portas aos imigrantes

Na contramão de autoridades, grupo de voluntários mobiliza famílias de 20 cidades para oferecer moradia temporária a estrangeiros

Drama. Migrantes andam em Calais tentando entrar no Eurotúnel para cruzar o Canal da Mancha: problema tratado com repressão pelas autoridades Foto: AFP/6-8-2015
Drama. Migrantes andam em Calais tentando entrar no Eurotúnel para cruzar o Canal da Mancha: problema tratado com repressão pelas autoridades – AFP/6-8-2015

Nem tudo é descaso ou repressão no tratamento aos imigrantes e refugiados na França. Em meio ao recrudescimento das políticas de segurança nas fronteiras e à indiferença com os imigrantes amontoados nas cercanias de Calais, o Serviço Jesuíta aos Refugiados (JRS, na sigla em inglês), associação católica internacional fundada em 1980, tem procurado combater a xenofobia crescente e a mudar o olhar francês em relação a estrangeiros em dificuldades. Criado há seis anos na França, o JRS aplica desde 2010 no país seu programa “Welcome en France” (Bem-vindo à França). A ideia é acolher estrangeiros que tenham solicitado ao governo francês o status legal de refugiado, mas que não conseguem abrigo do Estado enquanto aguardam a conclusão de seu processo.

O sistema funciona por meio de uma rede de famílias dispostas a hospedar um refugiado por um período máximo de um mês. Se neste prazo sua situação ainda não obteve um desfecho legal — seja a aprovação ou a reprovação de sua demanda —, o hóspede passará à família seguinte, e assim sucessivamente.

— Começamos há cinco anos com uma rede de quatro ou cinco famílias, e hoje há cerca de 110 famílias no total em quase 20 cidades da França, como Paris, Lyon, Marselha, Bordeaux e Toulouse. Aqui mesmo em Marselha, iniciamos em 2012 com quatro famílias, e atualmente somos 14 — diz Michel Croc, presidente do JRS francês desde 2011.

Diante do importante número de pedidos de asilo — 68 mil em 2014, com um índice de apenas 22% de aprovação (bem abaixo da média europeia de 45%) — e do esgotamento da capacidade de alojamento por parte dos serviços públicos, o projeto se tornou uma prioridade para a associação.

— Para nós, é inadmissível que pessoas em busca de asilo fiquem na rua. Nossa política é: não vamos assumir o lugar do Estado, mas vamos mostrar que pessoas, famílias, podem fazer alguma coisa — explica o presidente.

O JRS estabeleceu uma parceria com órgãos em contato com as autoridades, que repassam à associação católica requerentes de asilo sem teto. Mulheres sozinhas ou famílias geralmente obtém mais facilmente um alojamento do governo, e o JRS acolhe em maioria homens solitários.

O primeiro efeito da experiência notado pelo dirigente da associação é um alteração da percepção da família anfitriã em relação ao seu hóspede.

— É algo que verificamos com toas as famílias que participam do projeto: muda muito o olhar de todos os envolvidos, também dos amigos deles. É desta forma, aliás, que ampliamos nossa rede. As pessoas ao redor consideram a iniciativa bastante simpática e também querem participar. O requerente de asilo se torna uma “pessoa”, e também um amigo — resume.

Esperança. Michel Croc e John, um queniano que ele abrigou em sua casa – Divulgação

O presidente do JRS, engenheiro aposentado, já acolheu junto com sua mulher Elisabeth, ex-professora de matemática, ambos de 65 anos, quatro refugiados em sua casa em Marselha: Ilyes, argelino de 19 anos; John, queniano, de 35; e dois paquistaneses, Ismain, de 21, e Zahid, de 35. Ele também admite ter sido pessoalmente sensibilizado pela experiência.

— Em primeiro, descartamos completamente estas pessoas como ladrões ou marginais. E, depois, nos damos conta que a fronteira entre o asilo político e a imigração econômica não é assim tão clara. Em países ditatoriais, quem não está a favor do governo pode perder seu trabalho, seus direitos. Não se pode dizer que há de um lado os exilados políticos e, de outro, os imigrantes econômicos que vêm buscar fortuna na Europa — defende.

DEFESA DO ASILO UNIFICADO

Neste contexto, Croc condena recentes declarações de autoridades francesas e britânicas em plena crise de enfrentamento na questão dos milhares de imigrantes em Calais que procuram passar clandestinamente pelo Eurotúnel para a Grã-Bretanha.

— Os ministros do Interior britânico e francês disseram que os imigrantes creem que as ruas da Europa são pavimentadas de ouro. É algo terrível fazer este tipo de declaração — criticou.

Zihad, segundo conta Croc, é originário do oeste do Paquistão, numa área controlada por chefes locais e sob a ameaça dos talibãs. Em seu país, integrava uma ONG com um ação de escolarização de crianças, principalmente de meninas, o que desagradava especialmente os talibãs. Após os assassinatos de seu pai e de seu irmão, ele decidiu fugir. Escondido no fundo falso de um caminhão para atravessar os percursos mais perigosos da viagem, conseguiu chegar até a cidade de Lyon, e em território francês fez o pedido de asilo.

— Em seus três últimos dias de viagem na Europa, não pôde deixar em nenhum momento seu esconderijo no caminhão, e quando finalmente saiu, estava em um estado deplorável. Finalmente hospedado por uma família do JRS, desabafou: “Sou novamente um ser humano”.

Já Ismain foi até o Irã, depois de barco até a Turquia, e então chegou em Nice, no Sul da França. No Paquistão, fazia parte de uma equipe médica de vacinação, o que não era bem visto. O argelino Ilyes teve seu pedido de asilo recusado pelo governo francês, e “hoje deve estar em algum lugar da França, sem papéis,” diz Croc. O queniano John, depois de passar famílias do JRS, conseguiu uma ocupação na associação de caridade Emmaus, onde vende roupas e faz outros tipos de trabalhos.

— Tomávamos cuidado com quem era muçulmano, não servíamos carne de porco, mas eles também não pediam comida halal. Eles confraternizavam com nossos amigos. Uma vez levamos John para uma colheita de azeitonas, ele adorou. Um dos paquistaneses ajudava o filho de uma das famílias em seus deveres de inglês, jogavam futebol juntos. Foram sempre convivências felizes.

O dirigente do JRS não acredita que reforçar os instrumentos e as ações de segurança nas fronteiras é a solução para os problemas da entrada maciça de imigrantes nas fronteiras da Europa,ou dos confrontos em cidades como Calais.

— Nossa visão é a de que nenhuma ação de força vai parar os imigrantes. São pessoas que foram expulsas de seus países pelo medo ou pela fome, e nada vai fazer com que parem. Acreditamos que é necessário criar vias de acesso seguras e legais para eles.

Croc defende a instituição de “um regime de asilo unificado na Europa”.

— Como cada país tem sua própria lei em relação a isso, há a famosa regra de Dublin que obriga ao refugiado pedir asilo no país em que desembarcou. Hoje quem decide por onde o imigrante vai entrar é o atravessador. Em um regime unificado, o imigrante poderia pedir asilo neste ou naquele país por que tem família ali, ou é anglófono. E isso reduziria fenômenos como o de Calais. Sem falar que tudo isso favorece muito o extremismo na Europa.

O JRS possui apenas três funcionários assalariados na França, e funciona basicamente na base do voluntariado e de doações privadas.

— Não aceitamos ajuda financeira do Estado. Isso nos permite manter nossa liberdade de palavra — justifica Croc.

Fonte: O Globo

Os lucros são enormes; os riscos, limitados; a demanda, inesgotável: o transporte clandestino de imigrantes da África à Europa, através do Mediterrâneo, atrai cada vez mais grupos mafiosos poderosos e organizados, estimam especialistas e autoridades.

O volume de negócios anual, avaliado pelo Escritório das Nações Unidas contra a Droga e o Crime (UNODC) em 7 bilhões de dólares, interessa aos traficantes internacionais, mas também transforma os chefes de guerra, clãs ou redes locais em ricos atores da criminalidade transfronteiriça.

Em seu relatório de 2014 sobre o tráfico de pessoas, a UNODC afirma que os fluxos transfronteiriços estão ligados em geral ao crime organizado.

Quando se tornam complexos, os fluxos podem ser facilmente sustentados por grandes grupos criminosos bem organizados.

O transporte de clandestinos através da África e do Oriente Médio, e depois do Mediterrâneo, foi durante muito tempo obra de pescadores, de famílias de contrabandistas ou de tribos que atravessam o deserto desde os tempos das caravanas de sal, mas as somas que representam atualmente atraem cada vez mais as grandes máfias.

– “Agência de viagens” –

“Até 2013, os imigrantes nos diziam que faziam a viagem por etapas, e em cada etapa mudavam de atravessadores e pagavam um novo preço”, explica à AFP Arezo Malakooti, da agência consultora Altai, que trabalha, entre outros, para a Organização Internacional para Migrações (OIM).

“Desde 2014, vemos cada vez mais migrantes que pagam por toda a viagem, de seus países até o destino. Falei com palestinos que me disseram que haviam pago sua viagem como se tivessem adquirido um pacote em uma agência de viagens. Isso demonstra que existem redes que administram toda a filial, ou ao menos que há um alto grau de cooperação entre diferentes redes”, afirma Malakooti.

A chegada maciça ao mercado da migração clandestina de sírios que fogem da guerra, membros da alta classe média e, portanto, mais ricos que os africanos que fogem da miséria, levou os traficantes a multiplicar suas ofertas.

“Vemos nas redes sociais campanhas de publicidade agressivas”, afirma Arezo Malakooti, que está terminando um relatório sobre a migração ilegal no Mediterrâneo.

“Há páginas no Facebook com os preços, os locais de partida, do tipo ‘um barco parte amanhã de tal porto’, as tarifas com opções”: “pagando mais você pode ter uma viagem mais segura, com coletes salva-vidas ou um lugar na parte superior. Se você está no fundo e o barco afunda, certamente se afoga”.

– “Uma rede mundial” –

Em um relatório, a ONG Global Initiative Against Transnational Crime, com sede em Genebra, escreve: “os atravessadores eram tradicionalmente moradores com certas competências ou certos contatos, e que agiam sozinhos (…) mas recentemente constatamos que estas atividades passaram a ser mais sofisticadas e são cada vez mais obra de redes profissionais”.

“A história das migrações, em particular através do Mediterrâneo, é a de uma profissionalização progressiva dos atravessadores”. Agora, a ação dos atravessadores vai de uma atividade artesanal a operações muito profissionais, e frequentemente uma combinação de ambas”, acrescenta o documento.

Joel Milman, porta-voz da OIM em Genebra, afirma que estas redes “têm vínculos entre elas, porque vemos, por exemplo, mulheres que passam pela Líbia e que encontramos posteriormente empregadas na prostituição nas ruas das cidades europeias”.

O desmantelamento recente na Itália de redes de atravessadores e a detenção de alguns deles, que tentavam passar despercebidos entre os imigrantes e entrar na Europa, permitiu entender melhor quem são os autores deste crime organizado.

Em dezembro de 2014, a justiça italiana anunciou a detenção de 11 pessoas, todas eritreias, que formavam uma rede mafiosa em Itália, Líbia, Eritreia e em outros países do norte da África. Seu chefe, instalado na Alemanha, supervisionava uma organização responsável por ao menos 23 viagens à costa italiana durante o verão de 2014. Naquele ano, mais de 170.000 migrantes chegaram à Itália. Cada embarcação, tendo chegado ou não ao seu destino, representou dezenas de milhares de euros aos traficantes.

Mais 638 imigrantes foram resgatados nesta segunda-feira (20) em alto-mar após seis operações de socorro diferentes, informou nesta terça-feira (21) a Guarda Costeira da Itália em comunicado.

Os imigrantes viajavam a bordo de seis barcos em águas da costa da Líbia e receberam assistência do navio “Fiorillo” da guarda-costeira, de uma embarcação mercante e da Marinha italiana.

As primeiras 93 pessoas resgatadas, entre elas 12 mulheres e duas crianças, foram levadas na noite passada à ilha de Lampedusa, no sul do país.

Atualmente a Guarda Costeira presta socorro a um pesqueiro lotado de imigrantes a 80 milhas ao sul da Calábria, para onde também se dirigem dois navios mercantes.

O fluxo de imigrantes procedente do litoral norte-africano em direção à Itália parece não ter fim, em grande parte, devido às boas condições do mar.

Centenas de mortos

Em 19/4/15, um pesqueiro naufragou na costa da Líbia. A Agência da ONU para os Refugiados (Acnur) estima que 800 pessoas morreram na tragédia. Apenas 28 sobreviveram.

De acordo com as declarações de alguns sobreviventes, 700 e 950 pessoas estavam na embarcação. Cerca de 50 eram crianças e havia também outras 200 mulheres a bordo. Até agora foram localizados 28 corpos do mar, todos transferidos ao porto de Valletta, em Malta.

Vários sobreviventes afirmaram que a causa do acidente foi a colisão do navio pesqueiro no qual viajavam clandestinamente com a embarcação mercante portuguesa enviada para socorrê-los em alto-mar.

De acordo com depoimentos de pessoas que escaparam da tragédia, o capitão do barco deixou de conduzi-la para se esconder entre os imigrantes no momento no qual o navio “King Jacob”, de pavilhão luso, chegava próximo ao pesqueiro, informou a imprensa local.

Isso pode ter provocado uma colisão entre as duas embarcações, ocasionando o naufrágio.

O capitão do navio acidentado, de nacionalidade tunisiana, e seu ajudante sírio foram presos e acusados de homicídio múltiplo, naufrágio e de apoiarem à imigração ilegal por conduzirem a embarcação que afundou no litoral de Malta.

O promotor de Catânia, Giovanni Salvi, disse que ambos foram reconhecidos através de fotografias pelos sobreviventes que estavam a bordo do navio “Gregoretti”.

Segundo a primeira reconstrução dos fatos feita pelas autoridades, os imigrantes, ao verem a chegada de ajuda, foram todos para o mesmo lado da barcaça, fazendo-a virar, o que provocou o naufrágio.

O novo acidente provocou uma grande comoção na Itália e na União Europeia. O presidente do Conselho Europeu já convocou uma reunião extraordinária dos chefes de Estado e de governo do bloco para abordar a situação.

Cerca de 700 imigrantes estão desaparecidos nas águas do Canal da Sicília após o naufrágio do pesqueiro no qual viajavam com destino à Itália, confirmou neste domingo (19) a porta-voz do agência da ONU para refugiados (Acnur) na Itália, Carlotta Sami.

Sami explicou que um dos 28 sobreviventes do naufrágio assegurou que na embarcação viajavam cerca de 700 pessoas. Se estes números forem confirmados, será “a pior tragédia jamais vista no Mediterrâneo”, afirmou a porta-voz

Segundo um testemunho, relatado por Sami, a guarda costeira italiana recebeu um pedido de socorro durante a noite no qual lhes avisaram que o barco no qual viajavam estes imigrantes estava em perigo.

Perante a impossibilidade de chegar a tempo, a guarda costeira pediu ao navio português King Jacob, que navegava perto da região, para desviar até o local do acidente.

Quando o navio português se aproximava da embarcação na qual viajavam os imigrantes, estes “se colocaram todos no mesmo lado da embarcação e provocaram seu afundamento”.

A embarcação portuguesa iniciou então os trabalhos de resgate, enquanto se deslocavam para o local naves da guarda costeira italiana, da guarda de finanças e da marinha militar, bem como da marinha de malta, pois a tragédia aconteceu em águas próximas à ilha.

Neste momento, as embarcações da Itália e de Malta trabalham na busca de sobreviventes. Nas últimas duas semanas, 2 acidentes semelhantes no Mediterrâneo deixaram cerca de 450 mortos, de acordo com a agência France Press.

Fonte: Yahoo

Espanha: Com crise, síria cogita voltar a Damasco

Decepcionada com a vida na Espanha, Rudaina continua buscando emprego – Divulgação

 

— É melhor voltar para a guerra do que continuar aqui sem fazer nada, só estudando espanhol — conta, resignada.

Se os refugiados pudessem escolher, a Espanha (que absorve só 1% dos asilados da UE, mas que será o terceiro país a receber mais sírios, depois de Alemanha e França), não estaria entre as primeiras opções. O motivo é que, embora comece a ter sinais de recuperação, ainda vive a forte crise iniciada em 2008.

A taxa de desemprego continua alta (23%) e, desde 2011, o orçamento para refugiados sofreu cortes, com mil vagas em todo o país e uma enorme lista de espera: há 12 mil solicitações ainda sem resposta. Seis meses é o prazo dado pela lei para resolvê-las, mas a maioria já ultrapassou o limite, conta María Jesús Vega, porta-voz da Agência da ONU para Refugiados (Acnur).

— Há algumas nacionalidades, como malienses, ucranianos e iraquianos, que estão com as solicitações congeladas há três anos — afirma Vega. — É preciso mudar a forma de trabalhar. Estamos deixando muita gente na rua.

O Ministério de Interior não dá vazão ao incremento na chegada de refugiados. Com o aumento de 2.500 pedidos de asilo em 2012 para seis mil somente no primeiro semestre deste ano, o agendamento para dar entrada na solicitação está demorando seis meses. Nesse período, o refugiado está tão desprotegido quanto um imigrante irregular, podendo ser detido ou expulso.

— A Espanha não oferece oportunidades a quem vem de fora porque quem está aqui também não tem. O mercado de trabalho não absorve sequer a mão de obra nacional — conta Mónica López, coordenadora estatal da área de acolhida do Comissão Espanhola de Ajuda ao Refugiado (CEAR).

A falta de trabalho e as dificuldades com o idioma são apenas dois de vários problemas. Rudaina conta — com um inglês perfeito e esforçando-se para incluir frases em espanhol — que o mais angustiante é ter a mesma sensação de quando chegou a Getafe, um município a 15 quilômetros ao sul de Madri, dois anos atrás.

— É muito ruim ser um refugiado. Todos pensam que você é inferior. Em Damasco, tínhamos bons trabalhos, uma boa vida, mas ninguém entende isso — conta. — Além do mais, há muito preconceito com árabes e, inclusive, medo.

Rudaina, como boa parte dos sírios que chegam à Europa, era de classe média, com um alto nivel cultural. Ela tem 34 anos e é formada em Literatura inglesa, Direito e Tradução. Em Damasco, era funcionária da ONU. Atualmente, tenta trabalhar como professora de inglês. Teve um, temporário, em uma escola de idiomas, onde seu salário era de € 200. A irmã, que tinha um cargo de chefia em um banco, ganha o mesmo valor por 60 horas mensais como empregada doméstica e babá. A outra irmã, que deixou o filho na Síria, conseguiu um emprego em uma loja, por € 300 euros ao mês. Assim, tentam pagar o aluguel de € 600 euros de um apartamento em Madri, embora muitos meses tenham que bater à porta de igrejas, pedindo dinheiro para as contas.

— Ser refugiado é um estigma. Te exploram porque sabem que você não tem escolha e acabará aceitando — explica Rudaina, que conseguiu seu visto de trabalho, renovável em cinco anos, depois de um ano com a chamada “carteira vermelha”, o documento de refugiado sem autorização de trabalho.

Cerca de cinco mil pessoas moram hoje na Espanha com o status de refugiadas e foram atendidas dentro do sistema de asilo espanhol, cuja responsabilidade é do Estado, mas do qual três ONGs — CEAR, Cruz Roja e Accem — participam, com programas que incluem desde alojamento e alimentação, até aulas de espanhol e formação profissional, passando por assistência médica e colégio para os crianças.

Rudaina chegou à Espanha de avião, passando por Líbano e Kuwait, mas, grande parte deles entram por terra, em Melilla, depois de superar a fronteira marroquina. Entre as dificuldades que enfrentam estão as máfias, que podem cobrar cerca de € 500 para que os refugiados cruzem a fronteira marroquina ou € 1.500 por um passaporte marroquino alugado, que deverá ser devolvido ao chegar a Espanha.

— Há muitas famílias separadas em Melilla, porque alguns membros não conseguiram passar pela fronteira. Há crianças que cruzam com marroquinos, sem parentes. A situação é de muito risco, de perigo. No ACNUR advogamos pelo acesso ao território espanhol e ao procedimento de asilo sem impedimentos — explica María Jesús Vega.

Depois de uma saída traumática de seus países de origem e de uma viagem extremamente complicada, o centro de refugiados se transforma, segundo conta a coordenadora estatal da área de acolhida do CEAR, em um espaço de segurança, do qual os asilados custam a querer sair. Como uma espécie de empurrãozinho, para que não fiquem enfurnados, as atividades, pela manhã e pela tarde, são fora do centro, onde sempre fazem todas as refeições. A ONG oferece cursos, passeios a museus, excursões a cidades históricas e procura convênios, por exemplo, com o conservatório ou com clubes, para que músicos e atletas possam ensaiar e treinar.

Mas, atualmente, com as enormes filas de espera e com um lento e longo processo para tentar formalizar a documentação de asilado, conseguir uma vaga em um centro de refugiados é como ganhar na loteria. A previsão é que, com um aumento de orçamento, haja um incremento de 50% no número de vagas ainda este ano. Mesmo assim, com um total de 1.500 vagas, pouco se solucionará.

Para tentar agilizar os trâmites de asilo, que segundo afirmou o ministro de Interior, Jorge Fernández Díaz, superará os 18 mil até o final do ano (sem contar com os 16 mil sírios que chegarão de outros países da UE), o governo anunciou, nesta sexta-feira, que contratará 200 novos funcionários.

— A Espanha está preparada e tem os deveres de casa feitos — afirmou o ministro.

Alemanha: farmacêutica tenta recomeço com estágio

Rayan está estagiando na Alemanha – Divulgação

BERLIM – Na Alemanha há nove meses, a farmacêutica síria Rayan Matemir, de 36 anos, conseguiu um estágio em uma empresa de Göttingen. Para quem já trabalhou em uma multinacional americana, em Damasco, o salário de € 550 por mês é bastante singelo. Mas levando em consideração a guerra civil e a fuga para a Europa, Rayan está satisfeita. Depois de seis meses, terá a chance de conseguir um emprego com salário de € 2 mil a € 3 mil por mês e com isso a chance de buscar as duas filhas, que deixou com seus pais em Damasco.

— As dificuldades foram enormes, mas tive sorte em conseguir o estágio, o que abre a porta para um emprego e a chance de ficar para sempre na Alemanha — diz Rayan.

Para Kerim Öge, diretor de um abrigo de refugiados em Berlim, os recém-chegados sofrem sobretudo com a separação das famílias. Mas a situação é melhor hoje porque o governo criou novas leis que apostam na integração. Sobretudo sírios e iraquianos, que têm um nível alto de educação, são vistos como esperança para a economia alemã.

Antes proibidos de trabalhar, eles têm agora a chance de ser contratados depois de três meses, caso o empregador comprove que a vaga não pode ser ocupada por um alemão, e depois de um ano independentemente de qualquer critério. Öge, da empresa Gierso, que cuida do abrigo e da integração de mil refugiados para a prefeitura de Berlim, recebe em média duas consultas por semana de empresas.

Mas quem se hospeda no abrigo da Avenida Goerz já passou pelo pior: as fases iniciais depois da chegada, que ficaram ainda mais críticas após a explosão do número de refugiados. Soleiman Turkmeni, sírio de 30 anos, esperava mais da Europa. O ex-estudante de literatura da Universidade de Damasco está em Berlim há 11 meses, mas ainda não conseguiu superar o principal obstáculo, o idioma.

A família investiu tudo o que tinha na viagem de Soleiman, primeiro para a Turquia, depois para Grécia, Albânia, Sérvia, Hungria e Áustria. O plano era que ele conseguisse emprego e mandasse buscar a mãe e a irmã.

— A única coisa que consegui foi conhecer outros sírios, com os quais jogo futebol — conta, numa mistura de inglês e alemão.

Para o cientista político sírio Ferhad Ibrahim, que chegou à Alemanha há anos como refugiado político, a melhor chance para possibilitar uma situação de proveito para os dois lados é facilitar a integração.

— Ficar parado sem fazer nada é o pior para eles e para o Estado alemão — disse.

Abdullah Talib, de 23 anos, chegou há dois meses do Iraque. Ele trabalhava com informática em Bagdá. Com Yusuf Faraj e Abu Adib, praticamente da mesma idade, quer abrir uma empresa em Berlim. Antes, os três terão que superar a fase de transição de um ano.

— Comparando com o que vivemos no Iraque, a vida em Berlim é um paraíso — disse.

 Fonte: O Globo

Desesperados com pobreza, refugiados sírios retornam à zona de guerra

O número de sírios retornando ao seu país natal está cada vez maior, assim como as dificuldades enfrentadas sob a condição de deslocado

Crianças brincam no campo de refugiados de Zaatari, na Jordânia
Refugiados brincam no campo de refugiados de Zaatari, na Jordânia(Thomas Koehler/Getty Images)

A Organização das Nações Unidas reportou um aumento no número de refugiados sírios que decidiram retornar para seu país após uma jornada mal sucedida como deslocados. Em julho, a média diária de retorno de sírios à terra natal foi de 66; em agosto, esse número praticamente dobrou, chegando a 129. Atualmente, cerca de 100 sírios voltam ao país diariamente, de acordo com a emissora britânica BBC.

A Jordânia registra a presença de 600.000 refugiados sírios atualmente, a maioria vivendo em áreas urbanas. Segundo a ONU, 86% deles vivem abaixo do nível da pobreza, e o governo jordaniano não permite que a maior parte deles trabalhe de forma legal e não oferece serviços públicos de saúde.

Para piorar, 229.000 deslocados vivendo fora de campos de refugiados no país tiveram seus auxílios totalmente cortados pelo Programa Mundial de Alimentos (PMA) da ONU no início de setembro devido à falta de doações internacionais, de acordo com a BBC. Diante das péssimas condições de vida e sem poder arcar com os custos de uma viagem para a Europa, muitas famílias têm de decidir entre continuar lutando por seu sustento na Jordânia ou retornar para uma zona de guerra.

 

É o caso da família de Abu Ahmed, que terá que se dividir. O sírio decidiu ficar na Jordânia com sua mãe idosa, enquanto a esposa leva as duas filhas pequenas do casal – uma delas recém-nascida – de volta para Damasco. “É uma vida difícil aqui. Minha filha bebê está muito doente e eu não posso pagar o tratamento. Na Síria, o serviço estará disponível”, contou Abu à BBC. Sua esposa lembra que a viagem até a Jordânia foi uma “tortura”. Ela segue as notícias sobre os conflitos e está ciente dos riscos de voltar. “Nós não estamos felizes em voltar, mas a situação aqui está muito ruim aqui”.

Para deixar a Jordânia em direção à Síria, os refugiados precisam se registrar para pegar um ônibus na região de embarque do campo de refugiados de Zaatari, localizado a 10 quilômetros de Mafraq, noroeste do país. Muitos recebem aconselhamento da ACNUR, a agência de refugiados da ONU. “A primeira coisa que dizemos para eles é que não existe lugar seguro na Síria, na perspectiva do ACNUR”, afirma Omar, um dos agentes de proteção do órgão, à BBC. “A segunda é que eles não poderão retornar à Jordânia. É uma passagem só de ida”.

O Exército Livre da Síria também se preocupa com a segurança dos refugiados que retornarem a Síria, e afirma não possuir todas as armas necessárias para proteger as pessoas contra os cada vez mais frequentes ataques russos. Segundo o Major Issam al-Reis, porta-voz do exército, os bombardeios acabarão com a vida de muitos civis. “Nós aconselhamos nossos refugiados a não voltarem para a Síria agora, pois a situação ficará mais perigosa”, disse à BBC. Ainda assim, cada vez mais famílias estão preferindo voltar para um conflito que não mostra sinais de que chegará ao fim em vez de enfrentar a miséria e fome da Jordânia.

Fonte: Veja