Inspiração que não resolve problema do desemprego

Reforma trabalhista da Espanha, que Temer se baseou para propor alterações na CLT, precarizou relações do mercado e criou desigualdades no país europeu

A Reforma Trabalhista da Espanha precarizou as relações de trabalho, reduziu minimamente o desemprego e fez aumentar a desigualdade social naquele país. Esse foi o modelo que serviu de “inspiração”, segundo o próprio presidente Michel Temer, para alterar as leis que regulamentam as relações de trabalho no Brasil.

Por conta disso, na avaliação de setores como o Ministério Público do Trabalho, Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (Anfip) e Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Sindifisco Nacional), a Reforma Trabalhista não deve diminuir o desemprego no país, que já atinge 14,2 milhões de pessoas, segundo o IBGE, e muito menos melhorar as relações trabalhistas.

“Tendo como base a Reforma Trabalhista da Espanha, as mudanças nas relações de trabalho no Brasil aprovadas pela Câmara dos Deputados não leva em consideração as realidades distintas de cada país”, adverte o procurador do MPT, João Carlos Teixeira.

Durante visita do primeiro-ministro Mariano Rajoy ao Brasil, Temer apresentou as políticas aplicadas por seu convidado como modelo a seguirMarcos Corrêa / PR

O procurador alerta sobre as diferenças, segundo ele, primordiais, entre os modelos. “Na Europa as empresas não podem demitir o trabalhador de forma imotivada, lá vigora a Convenção 158 da OIT, que limita o poder de contestar do empregador de romper o contrato de trabalho. Nesse cenário, o ambiente da negociação coletiva é mais equilibrado para sindicatos europeus”, aponta.

“As mudanças trazidas, tanto lá quanto aqui, abrem espaço para a contratação de trabalhadores sob a forma de contratos precários sem a proteção social e garantias conferidas no contrato de emprego típico”, afirma.

Teixeira avalia que “no Brasil está se abrindo a possibilidade de contratar trabalhadores como autônomos ou microempreendedores individuais, que passam a trabalhar de forma contínua e não eventual, a serviço do contratante, sem a configuração da relação de emprego”. “É a legalização da fraude trabalhista (art. 442-B proposto no PL)”, diz.

Para Claudio Damasceno, do Sindifisco, as mudanças vão impactar violentamente a Previdência. “Aumento de desemprego leva à queda no recolhimento da contribuição. A mudança no contrato de trabalho, tal como a contratação de pessoa jurídica, desobrigará o patrão a contribuir pelo empregado. E o empregado pode deixar de contribuir com INSS para não sofrer reduções no vencimento líquido”, alerta.

Mas nem tudo está perdido, segundo Vilson Romero, da Anfip: “Enquanto não for aprovada a lei no Senado e sancionada pelo governo, há espaço para pressão parlamentar”, aponta.

Objetivo do governo espanhol foi o de flexibilizar as contrações

A reforma espanhola teve como objetivo flexibilizar o mercado de trabalho e diminuir o desemprego, que já alcançava 23% da população economicamente ativa em 2012. Outro ponto foi reforçar a contratação de menores 25 anos. A taxa de desemprego juvenil chegou a 48% naquele período.

Para mudar esse quadro, o governo reduziu os pagamentos de trabalhadores fixos que fossem demitidos sem justa causa. Antes, os empregados recebiam 45 dias de salário por ano trabalhado e passaram a receber 33.

Além disso, a indenização passou de 42 salários para 24. Foi criado contrato para pequenas e médias empresas com menos de 50 empregados, que deduz em 3 mil euros pela contratação de um primeiro trabalhador com menos de 30 anos.

Visita oficial cercada de elogios

Durante visita do primeiro-ministro da Espanha, Mariano Rajoy ao Brasil, em 25 de abril, Michel Temer citou a “semelhança” nas dificuldades que os dois países enfrentam e defendeu as políticas aplicadas por seu convidado como modelo a seguir por aqui.

Temer se mostrou satisfeito por ouvir de Rajoy o relato das reformas feitas por seu governo em 2012 nas questões trabalhista e da Previdência — exatamente as mesmas que ele planeja agora para o Brasil — e como, apesar dos “protestos e greves”, essas se mostraram necessárias para que “a Espanha pudesse renascer”.

Rajoy cumprimentou seu anfitrião pelas medidas econômicas que está promovendo e lhe aconselhou a perseverar na busca pela segurança jurídica, a previsibilidade e a sustentabilidade orçamentária porque, “a médio prazo, a seriedade na gestão dos assuntos públicos é sempre recompensada”.

O primeiro-ministro frisou que as empresas espanholas demonstraram sua tendência a permanecer no Brasil até mesmo nos anos mais difíceis e que os “planos muito ambiciosos” do governo Temer deixam margem para que a já importante presença espanhola aumente ainda mais no país.

Anteriormente, o presidente brasileiro pediu aos investidores espanhóis que aproveitassem a oportunidade que se abre com seu programa de privatizações e concessões em setores como o de energia e infraestrutura do transporte, como portos, aeroportos, ferrovias e estradas.

Fonte: O Dia

Miguel Rossetto: A Destruição Trabalhista

 

Rogério Marinho propõe a destruição de direitos trabalhistas conquistados em décadas de luta social e democráticaRogério Marinho propõe a destruição de direitos trabalhistas conquistados em décadas de luta social e democrática

É um texto desequilibrado e inaceitável. Não é possível esquecer que no capitalismo, quem detém os meios de produção é quem contrata o trabalhador, é ele quem tem o mando de contratar e de subordinar; não é o trabalhador que contrata o capital. É justamente esta relação que cria as enormes desigualdades nas relações de trabalho e que ao longo da história foram sendo compensadas pelos sindicatos e pelo Estado, por meio de leis, fiscalização e pela Justiça do Trabalho.  É aqui que o governo golpista e relator operam. Profundos na destruição de direitos, estratégicos no enfraquecimento dos sindicatos e cuidadosos em quase proibir o acesso de trabalhadores desrespeitados à Justiça do Trabalho.  Mais que um substitutivo, um verdadeiro plano de ataque aos trabalhadores, elaborado com detalhamento e perversa dissimulação.

A partir da inacreditável convicção de que seria a legislação trabalhista a responsável pelo desemprego por oprimir o capital de tal forma que impediria novos investimentos, o relator concentra sua artilharia em desmontar o direito do trabalho. Nada mais que justificativas ideológicas para ampliar a exploração. Em momentos de crise econômica, o capital busca preservar sua remuneração se apropriando da renda do trabalho e da renda pública. Trata-se de um ataque sem precedentes ao direito coletivo e às relações coletivas de trabalho.

A relação individual do trabalhador com a empresa passa a ser preponderante frente aos acordos coletivos e à própria lei. Os contratos temporários, por meses ou horas, como também o trabalho intermitente, serão disseminados para a maioria dos trabalhadores. Sabe-se que nestes tipos de contratação, o empregado perde as férias, a gestante sua estabilidade e outros direitos próprios da relação de trabalho sem prazo. Este trabalhador não terá mais acesso ao seguro-desemprego. A terceirização total é o objeto último, no qual o aluguel de trabalhadores passa a ser a regra das relações contratuais, impossibilitando a identidade comum dos que trabalham em um mesmo local e fragilizando a organização sindical. O que se busca aqui é impor e aprofundar um segundo ciclo de redução salarial para além da crise que enfrentamos nos últimos anos.

A jornada de trabalho passa a ser definida preponderantemente de forma individual prevalecendo sobre a convenção e os acordos coletivos. Fica destruída a jornada de oito horas diárias e 44 semanais. As exceções viram a regra. Do trabalho intermitente, ao trabalho em casa (sem controle da jornada), do banco de horas estendido, às férias repartidas em até três vezes, o que se busca é um trabalhador disponível 24 horas por dia, ao menor custo. Pagamento de horas-extras fará parte do passado. O resultado desta reforma será uma enorme desorganização familiar e social dos trabalhadores brasileiros.

O projeto enfraquece os sindicatos quando os afasta das empresas e, ao mesmo tempo, afasta os trabalhadores do sindicato. Isto porque exclui os sindicatos de todo o processo de escolha e acompanhamento dos representantes dos empregados nas empresas, estimulando o conflito entre esta representação e os sindicatos por conta das competências apresentadas. Afasta os trabalhadores quando elimina a obrigatoriedade de rescisão contratual no sindicato para aqueles com mais de um ano de empresa, obrigatoriedade esta que permite a correta orientação sobre a qualidade da rescisão e dos valores e direitos devidos, corrigindo eventuais erros e evitando a judicialização destes processos.

Sobre o fim da contribuição sindical, são evidentes os problemas de representatividade provocados pela sua obrigatoriedade associada à unicidade sindical, mas a eliminação será um desastre sem adequada transição que permita a reorganização do financiamento sindical. É neste cenário que o projeto permite que as leis nacionais do trabalho, base comum para os trabalhadores em todos os estados e regiões do país, possam ser eliminadas por negociação sindical. Evidente que aqui se trata de rebaixar este piso comum, de destruir a lei e fortalecer a posição do capital, ao transformar um direito numa possibilidade. Esta intenção fica clara quando o projeto diz com firmeza que a ultra-atividade dos acordos coletivos, não poderá ser negociada. É a partir da legislação que devem ser estimuladas negociações setoriais, por categorias, que acompanhem as especificidades das diversas atividades econômicas, sem prejuízo aos trabalhadores.

A ninguém interessa a judicialização das relações de trabalho, mas o relator aborda este tema de forma completamente equivocada.  Propõe resolver a questão criando grandes dificuldades, praticamente proibindo o acesso do trabalhador à Justiça, quando o que interessa é evitar o descumprimento das leis durante a vigência da relação de trabalho. O relator inventa a sucumbência recíproca no âmbito da Justiça do Trabalho. Isto significa que se o trabalhador eventualmente tiver decisão desfavorável estabelecida por um juiz ele terá que pagar as custas processuais, perícias e honorários advocatícios. Aqui, aumenta o risco do trabalhador e diminui o risco do fraudador, aquele que desrespeita a lei. Portanto, estimula a ilegalidade frente às diferenças econômicas entre o empregador e o empregado. Uma Justiça do Trabalho forte, com acesso garantido é fator de estímulo e proteção das leis.

Escandaloso é que o mesmo projeto que procura impedir o acesso à justiça pelos trabalhadores reduza pela metade as multas ao empregador que não assina a carteira de trabalho do empregado, fraudando assim as leis trabalhistas, o FGTS e a Previdência. Outra “novidade” proposta pelo relator, como valor da livre negociação, é que agora as mulheres grávidas poderão trabalhar em local insalubre. Abusa da ideia da insegurança jurídica das empresas frente à legislação e silencia diante da enorme insegurança do trabalhador diante da possibilidade de demissão a qualquer momento, sem nenhuma justificativa.

Nada autoriza a responsabilizar as leis trabalhistas pelo desemprego nos país. Com esta mesma legislação, nos últimos 13 anos, foram criados mais de 20 milhões de empregos com carteira assinada no Brasil. Em 2014 a taxa de desemprego foi 4,8% (a menor da história). Como falar em rigidez nas relações trabalhistas, quando a rotatividade no mercado de trabalho brasileiro chega a quase 50% ao ano.

A economia adotada é a variável determinante, é ela que gera emprego ou produzi desemprego. Por conta da atual política econômica, desastrosa, o país vive hoje sua pior recessão econômica, 8% de queda na economia nos últimos dois anos, quase três milhões de empregos destruídos e um desemprego de 13,5 milhões de brasileiros. Diante desta situação e das mudanças produtivas estruturais que afetam o mercado de trabalho, era de se esperar que as instituições públicas se dedicassem a proteger, a cuidar dos que perdem, dos que são excluídos socialmente por esta situação. Entretanto, o atual governo busca destruir os sistemas de proteção social e desorganizar as relações de trabalho, desregulamentando este mercado e retirando o Estado da garantia do cumprimento das leis que sobraram. Estas novas e modernas relações colocam o indivíduo só, com sua insegurança e desespero diante do capital.

Não temos a necessidade de repetir os erros de outros países que destruíram suas legislações trabalhistas, reduziram salários, estimularam empregos precários, temporários, frágeis e não conseguiram aumentar o seu nível de emprego, tampouco a eficiência de sua economia. Concentraram renda e riqueza, aumentaram a desigualdade social e a violência. Para uma sociedade equilibrada e justa, uma riqueza distribuída. Para uma economia eficiente, investimentos permanentes e empregos de longa duração, qualificados e produtivos.

Ao término da leitura da proposta do relator, este verdadeiro plano de ataque aos trabalhadores, a lembrança é a tragédia de Canudos, Bahia, no final século XIX.  Em nome do zeitgeist, ou do “espírito do tempo” acolhido pelas elites da época, 25 mil brasileiros miseráveis foram assassinados em função de um anunciado compromisso com o Brasil.  Hoje,  mais uma vez esse ódio das elites, esta violência irracional contra os pobres, os que trabalham, aparece nas destruidoras reformas trabalhista e da Previdência. Essa mesma elite sempre ciosa em cumprir com seu destino de destruir qualquer possibilidade de transformar o Brasil em uma nação de iguais. É preciso parar com esta insanidade, recusar essa proposta e reabrir um amplo diálogo envolvendo as centrais sindicais, os empresários, parlamentares para atualizar, sim, e não, destruir o que construímos ao longo de anos de convívio democrático.

*Miguel Rossetto é ex-ministro do Trabalho e Previdência Social e ex-vice governador do Rio Grande do Sul

Fonte: Portal Vermelho

Em 22/3/17,  a Câmara dos Deputados aprovou o texto-base do projeto de lei que autoriza a terceirização  para qualquer tipo de atividade. O projeto seguirá agora para sanção presidencial.

O professor de direito do trabalho Gleibe Pretti participará às 13h30 desta quarta-feira (23) de um programa ao vivo do G1 para responder às perguntas dos internautas sobre o projeto de lei da terceirização. Para mandar sua pergunta é só escrever no campo de comentários no fim desta reportagem.

Enviada ao Congresso pelo governo Fernando Henrique Cardoso em 1998, a proposta já havia sido aprovada pela Câmara e, ao passar pelo Senado, sofreu alterações. De volta à Câmara, o texto aguardava desde 2002 pela análise final dos deputados.

Em 2015, a Câmara aprovou outro projetocom o mesmo teor, durante a gestão do ex-presidente da Casa Eduardo Cunha (PMDB-RJ). O texto foi enviado para análise do Senado, mas ainda não foi votado.

 

Veja abaixo perguntas e respostas sobre a terceirização

 

 

O que é?

 

Na terceirização, uma empresa prestadora de serviços é contratada por outra empresa para realizar serviços determinados e específicos. A prestadora de serviços emprega e paga o trabalho realizado pelos funcionários. Não há vínculo empregatício entre a empresa contratante e os trabalhadores das empresas prestadoras de serviços.

 

Como é hoje?

 

Hoje, não há legislação específica sobre terceirização. No entanto, existe um conjunto de decisões da Justiça – chamado de súmula – que serve como referência. Nesse caso, essa súmula determina que a terceirização no Brasil só é permitida nas atividades-meio, também chamadas de atividades secundárias das empresas.

Auxiliares de limpeza e técnicos de informática, por exemplo, trabalham em empresas de diversos ramos. Por isso, suas ocupações podem ser consideradas como atividades-meio, ou seja, não são as vagas principais da empresa.

 

Como deverá ficar?

 

Se a lei for sancionada pelo presidente Michel Temer, haverá permissão para terceirização de qualquer atividade.

Uma escola, por exemplo, poderá contratar de uma empresa terceirizada tanto faxineiros e porteiros (atividades-meio) quanto professores, que são essenciais para dar aulas (atividades-fim).

 

Quem vai contratar os funcionários e pagar os salários?

 

O trabalhador será funcionário da empresa terceirizada que o contratou. Ela que fará a seleção e que pagará o salário. Por exemplo, uma fábrica de doces contrata uma empresa terceirizada que presta serviço de limpeza. Os auxiliares de limpeza, nesse caso, serão funcionários da empresa terceirizada, que os contratou, não da fábrica de doces.

 

Existe algum vínculo de emprego entre a empresa que contratou os serviços da terceirizada e os funcionários da terceirizada?

 

O projeto aprovado pela Câmara não prevê vínculo de emprego entre a empresa que contratou o serviço terceirizado e os trabalhadores que prestam serviço. Por exemplo, um garçom terceirizado não terá vínculo de emprego com o restaurante onde trabalha. Seu vínculo será com a empresa terceirizada que o contratou para prestar esse tipo de serviço.

 

Caso os trabalhadores terceirizados fiquem sem receber e procurem a Justiça, qual das empresas vai ter que pagar?

 

O texto aprovado prevê que a empresa que contratou o funcionário é responsável pelo pagamento. O processo corre na Justiça do Trabalho como qualquer outro. No entanto, se a terceirizada for condenada pela Justiça a pagar e não tiver mais dinheiro nem bens, a empresa que contratou seus serviços será acionada.

 

E as contribuições previdenciárias?

 

De acordo com texto aprovado, as contribuições ao INSS deverão seguir uma regra já determinada em lei. A empresa que contrata a terceirizada recolhe 11% do salário dos funcionários. Depois, ela desconta do valor a pagar à empresa de terceirização contratada.

 

Como ficam as condições de trabalho dos terceirizados?

 

É facultativo garantir aos terceirizados o mesmo atendimento médico e ambulatorial destinado aos empregados da contratante, assim como o acesso ao refeitório. Já as mesmas condições de segurança são obrigatórias.

 

Há alguma mudança para os trabalhadores temporários?

 

Nesta quarta-feira, também foi aprovada ampliação do tempo em que o trabalhador temporário pode ficar na mesma empresa. De três meses, o prazo foi ampliado para seis meses. Além desse prazo inicial, poderá haver uma prorrogação por mais 90 dias.

Na prática, a extensão do prazo de contratação de trabalhador temporário para nove meses já estava valendo por meio de portaria do governo de 2014. No entanto, após a sanção desse projeto de lei aprovado na quarta-feira pela Câmara, o novo prazo vira lei.

 

Qual é a avaliação que fazem da aprovação da terceirização?

 

Críticos da proposta enxergam na possibilidade de terceirização da atividade-fim uma abertura generalizada que precarizará uma modalidade de trabalho já fragilizada.

Favoráveis ao texto, no entanto, afirmam que a regulamentação trará segurança jurídica e terá resultados na geração de emprego, razão pela qual o tema ganhou o interesse do Palácio do Planalto.

Fonte: G1

Justiça do Trabalho de São Paulo marca data para fechar: 1º de agosto

 

Como se vê pela imagem (abaixo), o motivo do fechamento é o sufocamento orçamentário draconiano a que vêm sendo submetidos os tribunais trabalhistas de todo o país desde o início do ano. Entre os juízes, há apreensão de que este evento desencadeie outras paralisações pelo país, culminando num estado de descumprimento das leis do trabalho.

Felizmente, a decisão não é final: mesmo diante do despacho, a posição deve ser validada pelo plenário de juízes, que está rachado quanto ao assunto. Como o documento especifica, o problema não é meramente econômico, mas também político, pois não há ao menos sinalização de providências por parte do Governo Federal.

Desde que a nova Lei do Orçamento Anual foi aprovada em fevereiro, reduzindo em 70% as verbas destinadas à Justiça do Trabalho, cada TRT tem adotado uma medida diferente de resistência. O de São Paulo, no entanto, decidiu não economizar nada, apostando todas as fichas em uma eventual mudança de postura do governo.

A própria desembargadora Silvia Regina Devonald, presidente do TRT de São Paulo, admitiu isso em entrevista: “[Esse corte] vai inviabilizar a Justiça do Trabalho. A partir de julho, se não vier dinheiro, vamos ter um problema seriíssimo de manutenção nos fóruns”, disse ao ConJur, meses atrás. Apesar de arriscada, a decisão meramente acelerou o inevitável – independente de estratégias regionais, a inviabilização da Justiça do Trabalho em todo o país é um projeto pensado pelo relator do orçamento, deputado federal Ricardo Barros (PP-PR).

 

“Decisão do STF chancela o esfacelamento da Justiça do Trabalho”

O votos proferidos pelo STF na recente decisão acerca da inconstitucionalidade da lei orçamentária que promoveu corte de 50% dos gastos previstos e de 90% dos investimentos para a Justiça do Trabalho durante o ano de 2016 revela uma das faces de um projeto politico cada vez mais claro: acabar com a proteção especializada aos direitos sociais trabalhistas.

Por Valdete Souto Severo*

 

 

 

Apesar de a história insistentemente nos revelar a necessidade de proteção aos direitos sociais, dentre os quais estão os direitos trabalhistas, como condição de possibilidade da própria forma capital, o liberalismo insiste em atacar todas as medidas de intervenção protetiva, retornando sempre ao mesmo discurso econômico, cujas premissas sequer se sustentam.

Tais premissas fundamentam-se especialmente em duas afirmações. Uma delas, de que há necessidade de enxugar o Estado, reduzindo estruturas, como a da Justiça do Trabalho, para economizar. Afinal de contas, não é novidade que o Estado está economicamente falido. O outro argumento é a necessidade de fugir da intervenção estatal, privilegiando a solução extrajudicial dos conflitos entre capital e trabalho. Ambos argumentos mentirosos.

A redução da estrutura e das condições de funcionamento da Justiça do Trabalho provocará (e já vem provocando) maior demora na tramitação das demandas, que não param de chegar (registra-se o aumento em 30% do número de ações ajuizadas este ano, em relação ao mesmo período no ano passado).

Isso significa o colapso da resposta estatal às agressões sistemáticas a direitos trabalhistas beneficiando grandes empregadores (clientes contumazes dessa justiça especializada) em detrimento não apenas dos direitos dos trabalhadores, mas da própria concorrência saudável com os pequenos e médios empreendedores.

Em Porto Alegre, audiências já estão sendo designadas para outubro de 2017. Essa falência provocada pelo corte no orçamento da Justiça do Trabalho não evitará a despedida sem pagamento das verbas resilitórias, a prática de assédio estrutural, o não pagamento de jornadas extraordinárias, no mais das vezes praticadas de forma ordinária. Ao contrário, fará com que o desrespeito a esses direitos dos quais depende a subsistência física de quem trabalha seja estimulada. E com isso, facilitará a ação predatória de grandes empresas, inclusive na supressão da concorrência, pela possibilidade de praticar dumping social.

A consequência será (e já está sendo) a inviabilidade de pequenos e médios empreendimentos, que não tem condições de competir nessa lógica predatória. E quando falirem, esses empregadores recorrerão ao Estado, que criou mecanismos de ajuda como a absurda recuperação judicial. Os empregados, por sua vez, terão de recorrer ao seguro-desemprego, a fim de sobreviver nos meses em que estiverem sem trabalho. Não haverá, portanto, enxugamento da máquina estatal. Haverá, como já está ocorrendo, uma procura ainda maior por soluções que o mercado não pode nem tem interesse em dar, e que são vitais para que não haja caos.

A suposta necessidade de estimular a autocomposição, como um modo de promover a “maturidade” dos agentes sociais dessa relação (trabalhadores e tomadores de trabalho) revela-se como um argumento ainda mais perverso. O Estado se constitui, especialmente através da Justiça do Trabalho, como o único e último reduto de realização, mesmo que tardia e parcial, dos direitos sociais.

É sabido que a democracia traz consigo o ônus da necessidade de estruturas ágeis e capazes de promover o retorno à ordem jurídica democraticamente instaurada. Ou seja, viver em um Estado Democrático de Direito significa ter direitos e deveres, mas também contar com uma estrutura forte que os faça valer, sempre que violados. Do contrário, a própria democracia revela-se como uma farsa.

Elegemos nossos representantes, aprovamos as normas jurídicas e concordamos em conceder ao Estado o monopólio da jurisdição. Em contrapartida, podemos (e devemos) exigir do Estado que garanta a realização dessa ordem de coisas, que aja quando nossos direitos forem violados. Enquanto escrevo, é impossível evitar a sensação de estar fortalecendo um engodo. Impossível deixar de perceber o quanto essas ideias de democracia, pelas quais lutamos de forma tão árdua e que defendemos (e temos mesmo que defender) com entusiasmo, são fantasias na realidade atual.

Nosso problema, porém, na urgência desse momento histórico em que até o STF se divorcia da Constituição para, com argumentos econômicos ou dissociados da realidade, ajudar a boicotar a Justiça do Trabalho, contribuindo de modo decisivo para o seu colapso iminente, é mais singelo.

A retórica constitucional vale mesmo enquanto discurso. E constitui-se como um discurso que nos interessa, que precisa nos interessar. Um discurso que serve à consolidação de uma realidade menos cruel. E que por isso se qualifica como projeto, como proposta de convivência humana, como o mínimo tolerável: o mínimo de desigualdade, de miséria, de exploração.

A Justiça do Trabalho é o ambiente em que as normas fundamentais de proteção ao trabalho encontram espaço para serem exigidas, para serem respeitadas. Suprimir esse espaço – é disso que se trata e é essa a consequência do corte de orçamento chancelado pelo STF – é retirar dos trabalhadores a possibilidade de exercício de sua cidadania, de exigência do respeito às normas constitucionais.

O resultado mais imediato é o retorno à barbárie, algo que já vivenciamos como sociedade, há bem pouco tempo atrás. O voto do Ministro Celso de Mello, uma aula de democracia e respeito à Constituição, e que provocou inclusive a alteração no voto da Ministra Rosa Weber, reconhece o perigoso terreno em que estamos pisando e as consequências sociais, talvez insuperáveis, desse caminho de desmanche dos direitos sociais e, pois, das possibilidades de vida minimamente digna sob a lógica do capital.

E por mais que pareça sedutor àqueles que como eu apostam nas possibilidades de superação do sistema, investir no caos para instigar a revolta, fato é que a luta pela superação das condições de exploração e miséria pode e deve ser feita, como dizia Marx, também através dos aparelhos do próprio capital, dentre os quais o Poder Judiciário trabalhista tem importância fundamental, seja para evitar a barbárie, seja para promover condições de vida que permitam reconhecer e lutar por mudanças.

*Valdete Souto Severo é juíza do trabalho na 4ª Região, Master em Diritto del Lavoro e della Previdenza Sociale presso la Universidad Europeia di Roma/IT, mestre em Direitos Fundamentais pela PUC/RS, doutora em Direito do Trabalho pela USP, autora de diversas obras jurídicas, professora e diretora da FEMARGS – Fundação Escola da Magistratura do Trabalho/RS.

Temer estrangula a Justiça do Trabalho e ela pode parar em pouco tempo

 

 

O Tribunal Regional do Trabalho da 22ª Região, no Piauí, realizou um ato público em defesa da Justiça do Trabalho, dos direitos trabalhistas e das conquistas sociais e econômicas em seu próprio auditório.

Por Renato Bazan, no Portal CTB

Não era uma manifestação dentro do tribunal, simplesmente, mas organizada pelo próprio tribunal, em que magistrados, servidores, entidades sindicais, advogados e procuradores tentaram chamar atenção para o último badalar do relógio antes que a Justiça do Trabalho entre em colapso. Protestos assim têm se tornado cada vez mais comuns pelo Brasil. Além do ato público no Piauí, trabalhadores do judiciário do Acre, Rondônia, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Pará, Amapá, São Paulo e Santa Catarina já participam de manifestações com tom crescente de preocupação. Eles contam com apoios que vão desde órgãos oficiais, como o Ministério Público e a OAB, até grupos da sociedade civil organizada, primariamente sindicais.

A causa dessa mobilização, que também está sendo realizada desde o início de 2016, é o sufoco orçamentário imposto pelo deputado federal Ricardo Barros (PP-PR), atual ministro da Saúde, sobre as instâncias jurídicas favoráveis aos trabalhadores. No final de 2015, ele conseguiu assumir a relatoria da Lei Orçamentária Anual (LOA), e fez uma dupla chantagem com a presidenta Dilma Rousseff: para evitar um corte de R$ 10 bilhões no Bolsa Família, Barros faria “sacrifícios” em outras áreas, incluindo a Justiça Federal. Com a caneta na mão, cortou quase exclusivamente recursos do Trabalho.

“Justo nesse momento em que vêm aumentando os processos trabalhistas, os cortes orçamentários foram muito grandes. Na cifra de 90% para investimento permanente, 30% de custeio, podendo chegar a 50% ou 70% no caso do Processo Judicial Eletrônico”, explicou o desembargador Francisco Marques de Lima, que está coordenando o movimento de denúncia no Piauí.

Quem vive o dia-a-dia dos tribunais sente na pele o que isso significa. À CTB, um servidor público que preferiu não se identificar nos deu a dimensão do drama: “Estamos sem energia para o ar condicionado, estamos com parte da segurança desativada. Os juízes estão sem dinheiro para contratar estagiários, comprometendo a eficiência de todo o tribunal, e agora estamos fechando mais cedo porque não podemos pagar turnos extras para os funcionários”. Ele diz, no entanto, que a tragédia não é acidental, mas um ato voluntário de retribuição: “Esse Barros, quando era deputado, chegou a dizer que a Justiça do Trabalho fazia mal para a economia do país. Tem vídeo disso, dele falando que ‘tem alergia à Justiça’. Extraoficialmente, todo mundo aqui sabe que isso foi uma resposta ao fato de ele mesmo ser réu em várias ações trabalhistas”, explicou.

O povo contra o tempo

Diante de um corte tão dramático de recursos, cada TRT tem adotado uma medida diferente de resistência. Em Minas Gerais, optou-se por cortes que mantenham a funcionalidade no mínimo. Em outros estados, a falta de dinheiro já ameaça funcionários e custos de manutenção. Em São Paulo, curiosamente, o Tribunal decidiu não economizar nada, apostando todas as fichas em uma eventual mudança de postura do Governo Federal. Se nada for feito, têm até o fim de julho antes de acabarem com todo o orçamento disponível. “[Esse corte] vai inviabilizar a Justiça do Trabalho. A partir de julho, se não vier dinheiro, vamos ter um problema seriíssimo de manutenção nos fóruns”, disse ao ConJur a desembargadora Silvia Regina Devonald, presidente do TRT de São Paulo. “Os argumentos que [o ministro Barros] cita não só são preconceituosos, como totalmente despidos de qualquer conhecimento do que é a Justiça do Trabalho”, adicionou.

O movimento de resistência argumenta que, independente de estratégias regionais, o que se desenha no horizonte é uma luta que ultrapassa em muito a questão orçamentária – trata-se, no fundo, de uma disputa contra a própria existência da Justiça do Trabalho, que já foi ameaçada em ocasiões anteriores por conluios entre empresários e políticos conservadores. “Está sendo construído um discurso como se os direitos sociais fossem um peso para o Brasil. Todos sabem que não é. São os direitos sociais que desenvolvem o Brasil. E a árvore dos direitos sociais tem como tronco o direito do trabalho. Ao atingir a Justiça do Trabalho, eles estão atingindo na verdade todos as conquistas sociais dos brasileiros”, frisou Francisco Lima.

São evidentes os paralelos entre o sufocamento orçamentário imposto por Barros e as propostas mais recentes do governo interino de Michel Temer, que apontam no sentido de restringir direitos pela via legislativa. Desde o início de seu governo temporário, Temer recuperou três pautas muito graves, contrárias à Consolidação das Leis do Trabalho: a universalização da terceirização (PL 4330/04), a legalização de contratos que violam parâmetros mínimos da CLT (PL 4962/16) e a reforma da Previdência, que afasta e dificulta quaisquer formas de aposentadoria. Considerando a posição de destaque que Ricardo Barros exerce na cúpula de Temer, é improvável que haja quaisquer reações em defesa dos direitos ameaçados.

Muitos tribunais já consideram a possibilidade de parar as atividades no segundo semestre, por não terem condições de pagar as contas. Com mais de R$ 880 milhões em cortes, a precarização dos serviços e o sucateamento dos equipamentos tornará inviável sequer o protocolamento de novos processos, inclusive pela Internet. Este último caso oferece um agravante: sem a possibilidade de manter a rede do Processo Judicial Eletrônico, o custo geral dos TRTs aumentaria substancialmente, já que a ferramenta virtual reduz os custos e o tempo de tramitação processual. Considerando que o corte na área de tecnologia ultrapassa 80%, parece inevitável que haja uma retomada dos autos físicos e manuais.

Isso causa também um efeito cascata sobre as regiões menos populosas do país: a Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho do Pará (Amatra-PA) alertou recentemente que a região amazônica, pela extensão territorial e necessidade de deslocar juízes e servidores para locais distantes, tornará impossível o atendimento aos municípios do interior, diante da redução drástica de recursos. Todo o funcionamento da Justiça será paralisado, prejudicando sindicatos e trabalhadores justamente na região com maior incidência de trabalho escravo.

Violência institucional

“Na verdade, isso é uma espécie de punição à Justiça do Trabalho por ser célere, por distribuir riquezas, pelo grande volume de ações. O relator do orçamento pensou em diminuir o número de ações na Justiça do Trabalho diminuindo o orçamento, mas é o contrário. Em um momento de crise como esse, as ações aumentam, então precisamos ter condições de atender essa demanda”, explica o desembargador Francisco Cruz, presidente do TRT de Rondônia e Acre.

Mas é justamente na intenção de sabotar esse processo que o ministro Barros, então relator da LOA, manifestou a intenção de acorrentar os juízes do trabalho. Pior: antes de sabotar o funcionamento dos TRTs, tentou fazer com que os próprios juízes propusessem alterações nas leis trabalhistas para que restringissem a atuação dos tribunais. A intenção era evitar o impacto negativo sobre a imagem dos parlamentares, já às voltas com o processo fraudulento de impeachment e a Operação Lava Jato. Quando as associações negaram resposta, ainda em fevereiro, o então relator do orçamento da União foi direto: “Como a Justiça do Trabalho não tem se mostrado cooperativa, vamos apresentar um corte mais significativo para que eles reflitam um pouco”. Na semana seguinte, 70% do dinheiro havia sumido.

Este corte não faz sentido, na ponta do lápis. Só o tribunal de São Paulo, em um único ano, arrecadou mais de R$ 12 bilhões em multas e tarifas, operando a um custo de R$ 2 bilhões – um retorno de R$ 6 para cada real investido, na prática. “É aqui, na execução dos créditos trabalhistas, que a gente arrecada para a Previdência e a Receita Federal, e isso vai ser um corte na alimentação deles”, apontou Lívio Enescu, presidente da Associação dos Advogados Trabalhistas do Estado de São Paulo.

Nem mesmo o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) manteve-se calado diante de tamanha estupidez. Provocados pela Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), publicaram, em dezembro de 2015, nota conjunta na qual deixavam claro a impropriedade de tratamento dado à Justiça do Trabalho. Escreveram: “É princípio basilar da democracia que os Poderes devem agir com independência e harmonia, não havendo precedente, na história da República, da utilização explícita da relatoria do orçamento para abertamente constranger outro Poder”.

A nota não surtiu efeito. Dois meses depois dessa agressão, a Câmara dos Deputados instituía o seu golpe parlamentar também sobre o poder Executivo

Crise não pode ser pretexto para eliminar direitos, dizem juízes

 

 

Entre as preocupações da Anamatra, que representa pelo menos 4 mil juízes do Trabalho, está a regulamentação da terceirização na atividade-fim das empresas, o que pode levar a desigualdade de salários, favorecimento de jornada sem pagamento regular de horas-extras e baixo ou nenhum investimento em saúde e segurança laboral, apenas para dar alguns exemplos.

“O projeto de regulamentação de terceirização que hoje avança no Parlamento (PLC nº 30/2015), bem como toda e qualquer proposta legislativa que vier a ser apresentada nesses moldes, não representará a equiparação de direitos entre contratados diretamente e terceirizados, como vem sendo divulgado; mas sim de ampliação da desigualdade hoje já vivida por mais de 12 milhões de trabalhadores contratados de forma indireta”, alerta o presidente da associação, Germano Siqueira.

Outra preocupação é a possibilidade de empregadores e empregados negociarem diretamente um acordo de trabalho, em detrimento da legislação trabalhista, uma matéria que também tramite no Congresso. Essa alternativa representa uma efetiva precarização de direitos, diz Siqueira. “O que está se deliberando é pela formalização do desequilíbrio entre o capital e o trabalho e o enfraquecimento do tecido de proteção social dos trabalhadores.”

O presidente da Anamatra criticou a posição do novo presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), Ives Gandra Filho, que afirmou que a justiça trabalhista precisa ser menos “paternalista” para ajudar a tirar o país da crise. Segundo o presidente do TST, está na hora de o governo flexibilizar a legislação trabalhista e permitir que empresas e sindicatos possam fazer acordos fora da CLT, desde que os direitos básicos sejam garantidos.

Para Siqueira, o discurso é “falacioso e oportunista”. Segundo a entidade, a posição do magistrado, nesse cenário, firma-se em dados oficiais do Tribunal Superior do Trabalho (TST) que demostram que, de 2005 a 2014 (sem considerar os precatórios), a Justiça do Trabalho pagou em todo o Brasil, principalmente em execução, mas também por acordos, a soma de R$ 125 bilhões aos credores, valores correspondentes a direitos não respeitados no curso do contrato de trabalho e que foram restabelecidos e voltaram a circular de forma descentralizada no mercado consumidor.

O presidente informa também que o custo econômico direto do trabalho no Brasil é dos menores em comparação com vários outros países. Tomando por base o salário mínimo, o mercado de trabalho brasileiro registra um salário-hora da ordem de R$4,00 (reais), enquanto, por exemplo, nos EUA paga-se pela mesma hora mínima o equivalente a R$23,31; na Alemanha R$ 25,16; na Espanha R$17,50; e, em Portugal, R$15,40.

“Não há nenhum indicativo convincente de que empresas ‘quebrem’ por conta do modelo trabalhista brasileiro ou de que a economia tenha encolhido por conta da formalização do trabalho nos limites da CLT. Também é falso o discurso da baixa produtividade atribuindo-se essa ‘fatura’ à existência de um mercado de trabalho regulado”, informa Siqueira.

Na avaliação do presidente da Anamatra, produtividade não é sinônimo de redução de custos de pessoal, mas, fundamentalmente, de investimento em educação básica, capacitação profissional, rotinas de produção e tecnologia. “A Anamatra não se opõe a reformar direitos sociais e trabalhistas, mas que isso seja feito conforme prevê a Constituição Federal, que preconiza que todo e qualquer direito aplicado ao trabalhador deve ser no sentido de melhorar a sua condição social”, finaliza o magistrado.

Fonte: Portal Vermelho, com Anamatra

Sem dinheiro, tribunais do trabalho adotam medidas para não fechar

TRTs mudam horário de atendimento, suspendem serviços e cortam gastos.
Governo liberou verba extra; para TST, isso deve assegurar funcionamento.

Vitor Matos e Gustavo GarciaDo G1, em Brasília

Um corte no orçamento deste ano de 90% no investimento e de 30% no custeio, segundo o Tribunal Superior do Trabalho (TST), obrigou tribunais regionais e varas da Justiça Trabalhista em todo o país a adotarem medidas emergenciais de contenção de gastos para evitar o fechamento. Mesmo assim, essas medidas afetaram o funcionamento desses órgãos e fizeram aumentar o número de processos à espera de julgamento.

 
CRISE NOS TRTs
Tribunais cortam gastos para não fechar.

Entre essas medidas, estão dispensa de estagiários; alteração do horário de abertura e fechamento dos prédios; desligamento forçado de equipamentos de informática e telefonia a partir de determinado horário; supressão de contratos de serviços terceirizados; revisão de contratos de segurança; e redução de despesas com serviços postais, consumo de energia e material de uso administrativo (veja ao final desta reportagem a situação de TRTs que estão entre os que enfrentam maior dificuldade financeira).

No caso da Justiça Trabalhista de Mato Grosso, por exemplo, uma das atingidas pelo corte orçamentário da União, todas as varas itinerantes do estado foram suspensas e também as viagens de juízes para substituir os que estão de folga ou férias. Em São Paulo e Goiás, os TRTs afirmam que o desafio é conseguir funcionar até o fim do ano.

Governo destaca liberação de verba
Procurada pelo G1 para comentar o assunto, a Casa Civil da Presidência da República destacou a publicação de uma MP que liberou R$ 353 milhões para a Justiça do Trabalho, com o aval do Tribunal de Contas da União (TCU). A MP foi publicada na última quinta-feira (14) no “Diário Oficial da União”, como crédito extraordinário para pagamento de despesas correntes da Justiça do Trabalho.

O Ministério do Planejamento informou, por meio da assessoria, que o governo federal “tem colaborado intensamente” com a Justiça do Trabalho. “Um dos resultados desta colaboração foi a edição da Medida Provisória n° 740, que liberou R$ 353,7 milhões em crédito extraordinário para o pagamento de despesas correntes e recompôs o valor que foi cortado no Congresso Nacional neste orçamento.”

De acordo com a assessoria, em 2017, “mesmo considerando que a situação orçamentária será bastante restritiva para todos Poderes e órgãos públicos, o governo federal continuará a colaborar com a Justiça do Trabalho para garantir a provisão dos recursos necessários para manter o funcionamento dos serviços de forma satisfatória”.

O presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), Ives Gandra Martins Filho, considera que a quantia deve ser suficiente para assegurar o funcionamento dos tribunais até o fim do ano, mas prevê as mesmas dificuldades para 2017 se o orçamento não for reajustado; para alguns TRTs, o dinheiro da MP não será suficiente (leia mais abaixo).

Desemprego influencia
De acordo com o TST,  a situação da Justiça do Trabalho foi agravada pelo crescimento do desemprego, o que elevou também a quantidade de novas ações na Justiça Trabalhista. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a taxa de desemprego tem sido crescente, e o Brasil acumula mais de 11 milhões de desempregados.

Por esse motivo, o número de novos processos nas varas do trabalho (primeira instância) aumentou 7,9% de janeiro a abril de 2016 na comparação com o mesmo período de 2015. Passou de 839.658 para 905.670, de acordo com informações do TST.

Nesse mesmo período, a quantidade de processos que aguardam conclusão na fila das varas trabalhistas aumentou 10,5%. Nos TRTs (Tribunais Regionais do Trabalho), segunda instância da Justiça Trabalhista, a fila de processos pendentes aumentou 6% em 2016, informou o TST.

Evitar o fechamento
As medidas para economizar gastos na Justiça Trabalhista, nos casos mais críticos, tiveram o objetivo de evitar o fechamento dos órgãos e manter o atendimento ao público.

Segundo o presidente do TST e do Conselho Superior da Justiça do Trabalho, ministro Ives Gandra Martins Filho, um dos principais impactos do corte orçamentário foi na manutenção do sistema de informática. Quase 100% dos processos da Justiça Trabalhista são eletrônicos. Por isso, há a necessidade de que o sistema seja revisado periodicamente, mas a frequência diminuiu.

“Quando houve o corte de 90% do gasto de custeio com o PJE [processo de justiça eletrônico], isso é praticamente parar com a Justiça do Trabalho. Como é que a Justiça do Trabalho está funcionando se precisa de contrato de manutenção e investimento? Em área de informática, se não há investimento, a manutenção vai parando. O que está acontecendo? Os tribunais estão funcionando mais lentos, alguns param. São Paulo parou. Parou um bom tempo. Rio Grande do Sul estava com o mesmo problema. Quer dizer, não investir em informática ou não ter manutenção em informática é pedir para parar”, disse o presidente do TST ao G1.

Segundo ele, o trabalhador é prejudicado porque os processos passam a levar mais tempo para tramitar.

“Se não é possível funcionar todos os dias, um dia pelo menos tem que parar por causa das contingências. Aí, em termos de gastos com custeio, o que acaba acontecendo? Primeiro, não se consegue receber todas as ações e, segundo, não se consegue solucionar rápido. Uma audiência que poderia ser marcada daqui a três meses vai ser marcada para daqui a um ano. E aí o trabalhador que precisa daquilo, que tem caráter alimentar, que é o seu salário, vai ficar todo esse tempo desempregado e sem uma fonte de custeio dele mesmo”, explicou o ministro.

Servidores
A Associação Nacional dos Servidores da Justiça do Trabalho (Anajustra) acrescentou que a precariedade das condições de varas e TRTs prejudica também o rendimento dos próprios funcionários.

Segundo a entidade, a Justiça do Trabalho foi “obrigada a empregar procedimentos drásticos  que afetam diretamente a prestação jurisdicional”.

“Estamos vivendo o pior dos mundos, com um aumento expressivo do número de ações, a redução significativa dos recursos orçamentários, a diminuição do número de servidores que estão se aposentando e não estão sendo repostos e a exigência de produtividade e cumprimento de metas absurdas que têm provocado efeitos nefastos na saúde do servidor, com o aumento de doenças além de sofrimentos de ordem mental e emocional”, afirmou Áureo Pedroso, diretor de Relações Institucionais da Anajustra.

Dinheiro da MP
Os R$ 353,7 milhões previstos na medida provisória como crédito extraordinário para pagamento de despesas correntes da Justiça do Trabalho serão distribuídos entre os TRTs levando em conta aqueles que estão em situação mais crítica, segundo Ives Gandra Martins Filho.

Na avaliação do ministro, o dinheiro deverá ser o suficiente para que os tribunais permaneçam funcionando até o fim do ano. As quantias que serão repassadas para cada tribunal, segundo Ives Gandra Filho, será definida pelo Conselho Superior da Justiça do Trabalho.

“O que nós estamos tentando fazer agora é um levantamento da real necessidade de cada tribunal, se dá para voltar à plena normalidade ou não e se esse dinheiro [da MP] é suficiente. Me parece que sim. À primeira vista, me parece que sim, tanto que nós estamos fazendo os acertos. Então, não é para nenhum tribunal ficar apavorado, nenhum tribunal achar que ‘no nosso caso nós não vamos ter dinheiro”, disse o presidente.

2017
Ele afirmou, no entanto, que se não houver um aumento no orçamento para a Justiça Trabalhista em 2017, a situação deverá se repetir no ano que vem.

O governo federal pretende fixar teto para os gastos públicos, reajustando o orçamento de cada área acrescentado somente o índice da inflação do período. Para Ives Gandra Filho, é necessário um orçamento maior que o estabelecido pelo teto para a Justiça Trabalhista.

“Agora, minha preocupação fundamental é com o orçamento 2017. Se não conseguirmos reverter ou abrir uma exceção para a Justiça do Trabalho – e é importante que o governo saiba, que o Congresso saiba –, nós vamos ter ano que vem o mesmo problema. Não é justo com a sociedade que se deixe um monte de trabalhadores aí sem poder ter acesso à Justiça, com o perigo de fechamento da Justiça do Trabalho por falta de previsão no orçamento do ano que vem, que pode ser feita e deve ser feita agora”, argumentou o ministro.

Segundo a Anajustra, o dinheiro da MP dá mais condições para os tribunais funcionarem, mas não é suficiente para resolver as carências dos órgãos.

“Os R$ 353 milhões para a Justiça do Trabalho aliviam a situação dos tribunais do trabalho no custeio das suas atividades. Porém, não resolvem o problema, pois o corte feito pela Lei Orçamentária de 2016 na proposta original da Justiça Trabalhista foi de mais de R$ 844 milhões”, afirmou a entidade.

Tribunais Regionais do Trabalho
Confira abaixo os problemas de alguns dos tribunais regionais do trabalho em razão das restrições orçamentárias.

Mato Grosso
Segundo o TRT-MT, o órgão recebeu R$ 17 milhões dos R$ 30 milhões inicialmente previstos para este ano.

Para pagar as despesas, o tribunal reduziu em 50% do contrato de serviços terceirizados, como limpeza e segurança do edifício-sede, em Cuiabá, e dos 29 fóruns trabalhistas no interior do estado.

Todos os estagiários foram dispensados, o horário de funcionamento foi limitado, e o tribunal passou a adotar medidas para economizar energia, como desligar o ar-condicionado.

Depois o TRT-MT teve que suspender todas as varas itinerantes do estado. Essas varas são um mecanismo pelo qual o juiz e um servidor se deslocam até municípios sem varas do trabalho a fim de realizar audiências. Também foram suspensas as viagens dos juízes para substituir magistrados em férias e licenças.

O tribunal informou ainda que o sistema de armazenamento dos processos eletrônicos opera na capacidade limite e não há previsão de solução para o problema.

“Num esforço de guerra, suspendemos as varas itinerantes e só deslocamos nossos juízes substitutos para as varas cujos titulares estão em férias ou licenças em casos muitos excepcionais. O resultado é o adiamento de audiências e maior prazo para os processos serem solucionados”, explicou a presidente do TRT-MT, desembargadora Beatriz Theodoro.

São Paulo
O TRT-2, da região de São Paulo, afirmou que vem adotando desde o início do ano medidas “a fim de se evitar o máximo a inviabilização do funcionamento de suas unidades”.

O tribunal reduziu horário de funcionamento de aparelhos de ar-condicionado e elevadores e também reduziu o número de servidores terceirizados. Ainda foram suspensas as horas-extras e o trabalho aos sábados.

“Com a edição da medida provisória 740/2016, no último dia 13, espera-se que o TRT-2 consiga se manter até o final do ano, evitando-se assim que novas medidas sejam tomadas, em especial aquelas que possam atingir o público externo”, afirmou o tribunal.

Para Lynira Sardinha, diretora do Sindicato dos Trabalhadores do Judiciário de São Paulo (Sintrajud), o TRT-2 chegou a cogitar fechamento a partir de setembro.

“Como eles [TRTs] têm autonomia administrativa, cada um foi pensando em como fazer as suas economias. Uma parte deles percebeu que em setembro alguns já fechariam as portas, como o TRT da 2ª região, que é o maior TRT do país, com o maior número de ações”, afirmou Sardinha.

Goiás
O Tribunal Regional do Trabalho de Goiás (TRT-GO) anunciou na semana passada o corte de despesas e demissões para manter o funcionamento do órgão até o final de setembro.

Segundo o presidente do órgão, o desembargador Aldon Taglialegna, o tribunal tem uma dívida de R$ 11 milhões e corre o risco de fechar as portas.

Em nota, o TRT-GO informou que o dinheiro inicialmente previsto para o tribunal na medida provisória não será suficiente. O órgão depende de um remanejamento dos recursos.

“Infelizmente, o Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região (GO) vai receber apenas R$ 960.497,00 desse crédito [da medida provisória], o que é insuficiente para arcar com as despesas de custeio do tribunal até o fim do ano. Com esses recursos, o tribunal ganha um fôlego suficiente para se manter por aproximadamente mais 15 dias, garantindo seu funcionamento até meados do mês de outubro deste ano. Por isso, a últimas medidas de contenção de despesas adotadas pelo tribunal no início da semana serão mantidas”, afirmou o TRT-GO.

Rio de Janeiro
O TRT-RJ sofreu um corte de 32% nas despesas de custeio para o ano de 2016, o que representa R$ 24,5 milhões.

Para economizar, uma série de medidas foram adotadas pelo tribunal: modificação do horário de atendimento ao público, com o objetivo de economizar energia (passou das 10h às 17h para 9h30 a 16h30), para aproveitar a luz do dia; redução de despesas com serviços postais; novos limites para a concessão de diárias e adicional de deslocamento a magistrados e servidores; ações para a redução de despesas com aquisição de material de consumo; e o corte de um estagiário por vara do trabalho.

O TRT-RJ recebeu um crédito extraordinário de R$ 2.942.449,00 por meio da medida provisória. Ainda assim, o órgão afirmou que, com esse dinheiro, tem orçamento para continuar operando apenas até o mês de novembro.

A desembargadora Maria das Graças Cabral Viegas Paranhos, presidente do tribunal, disse que vai com o Conselho Superior da Justiça do Trabalho uma nova recomposição no orçamento.

“Acredito que não vamos ter de fechar o tribunal antes da hora. Todos estamos enfrentando essa fase com coragem. É importante não desanimar, pois é na crise que nos reinventamos”, afirmou a desembargadora, por meio de nota da assessoria de imprensa.

Rio Grande do Sul
O TRT do Rio Grande do Sul afirmou que precisou economizar nos contratos de terceirizados, como vigilância e limpeza, e reduziu alguns horários. Também teve que dispensar os estagiários.

O tribunal informou que também ficou impossibilitado de nomear novos servidores para o lugar daqueles que tinham se aposentado.

Sem a MP, o TRT-RS argumenta que teria dinheiro para operar até agosto. Com os R$ 29 milhões que vai receber com a medida provisória, o tribunal entende que conseguirá chegar até o fim do ano, mas afirma que se desenha uma situação igual para 2017.

“Neste momento de crise, com as demissões aumentando, estamos tendo uma demanda maior e, paradoxalmente, temos menos pessoal. O país está em recessão. Com mais demissões, são mais reclamações trabalhistas. Então, nossa jurisdição está menos célere e menos efetiva pela falta de recursos e pessoal”, afirmou o TRT do Rio Grande do Sul.

Fonte: G1