Policial teria dito para Amarildo: ‘É, Boi, acabou. Você perdeu’
Fantástico teve acesso com exclusividade a detalhes da reconstituição do caso, feita pela Polícia Civil.
O que aconteceu com Amarildo? Levado por traficantes, como dizia a polícia, ou torturado e assassinado pela própria PM? Agora, a investigação chega ao fim e a verdade finalmente vem à tona.
A pergunta “cadê Amarildo?”, que ecoou por todo o Brasil, começa a ser respondida.
O Fantástico teve acesso a toda a investigação do caso. E o que a polícia descobriu derruba a versão que os policiais militares vinham contando.
“Meia-noite e pouca, o Anderson e a Beatriz vieram aqui e me falaram: ‘tia, madrinha, os policias levou meu pai e não trouxeram meu pai até agora, vamo lá’”, conta a irmã do Amarildo, Eunice.
Eunice foi, como mostram imagens inéditas do circuito de segurança. Ela é irmã do ajudante de pedreiro Amarildo de Souza, o pai de Anderson, Beatriz e mais quatro filhos.
“À meia-noite e pouca, o Anderson e a Beatriz vieram aqui e me falaram. ‘Tia, madrinha, os policiais levaram o meu pai e não trouxeram meu pai até agora e vamos lá”, lembra Maria Eunice Dias, irmã de Amarildo.
Eunice foi, como mostram as imagens inéditas do circuito de segurança. Ela é irmã do ajudante de pedreiro Amarildo de Souza, o pai de Anderson, Beatriz e mais quatro filhos.
À meia-noite do dia 15 de julho, eles buscavam notícias na Unidade de Polícia Pacificadora da Rocinha. A família sabia apenas que Amarildo tinha sido levado para averiguação algumas horas antes.
“A saga do Amarildo começa no dia 14 de julho de 2013, às 18 horas, um minuto e sete segundos”, revela a delegada Elen Souto.
Segundo as investigações, foi quando o soldado Douglas Vital, um dos policiais militares comandados pelo major Edson Santos, recebeu de um informante o aviso de que Amarildo estava em um bar.
O ajudante de pedreiro era suspeito de saber onde ficava um esconderijo de armas de traficantes da Rocinha.
Oito PMs seguiram para o bar, como mostram outras câmeras de segurança. O Fantástico teve acesso com exclusividade a detalhes da reconstituição do caso, feita pela Polícia Civil.
“Nós constatamos que, no momento da abordagem no bar, o único abordado foi o Amarildo. Quando o soldado Douglas Vital se refere ao Amarildo, ele o chama pelo apelido. E diz o seguinte: ‘Boi, documento!’”, conta a delegada.
Mais tarde, quando o desaparecimento passou a ser investigado, os PMs alegaram ter confundido Amarildo com um traficante chamado Guinho. Mas, além de conhecer Amarildo até pelo apelido, os policiais da UPP já tinham feito quatro consultas sobre ele no Portal de Segurança do Estado.
Na reconstituição, a Divisão de Homicídios descobriu que o soldado Vital simulou um telefonema para a UPP para averiguar se havia algum mandado de prisão contra Amarildo.
Alegando não ter conseguido fazer a ligação, Vital levou o ajudante de pedreiro ao Centro de Controle.
“Nenhum cidadão pode entrar no Centro de Comando e Controle, porque é um lugar de inteligência, onde estão os policiais da sala de monitoramento. Se não conseguiu resolver a averiguação do cidadão, o caminho é a delegacia de polícia”, explica a delegada.
Em depoimento, uma moradora disse ter visto um dos policiais bater no ombro de Amarildo e dizer: “É, Boi, acabou. Você perdeu”.
Uma escuta telefônica feita com autorização da Justiça mostra uma conversa entre o major Edson e o soldado Vital, já depois de o caso ficar nacionalmente conhecido. Segundo os investigadores, eles tentavam combinar uma linha de defesa. No jargão policial, “sarquear” significa averiguar antecedentes criminais.
Major Edson: Cara, em nenhum momento tu falou que desceu lá pra buscar o. Com a intenção de buscar ele, não, né? Tu disse que tava patrulhando, viu, e resolveu levar pra sarquear, não é isso?
Soldado Vital: Não foi nem sarque, major. Fui checar umas informações.
“E eles sabiam que estavam sendo ouvidos e começaram a organizar o se que falava. Eles montaram um verdadeiro teatrinho para tentar distorcer a prova”, diz o promotor Homero Freitas.
Amarildo nunca mais apareceu. Até agora, a única imagem conhecida dessa história era a da saída dele do Centro de Controle. A reconstituição mostrou também o que aconteceu depois daquela cena.
Amarildo foi levado para a base da UPP, onde estava o major Edson Santos. A versão apresentada pelos PMs é que Amarildo tinha sido liberado após a averiguação. Segundo os policiais, ele foi embora por uma escadaria em frente à unidade. As duas câmeras que poderiam registrar a saída de Amarildo estavam quebradas. Mas as investigações revelaram a existência de uma outra câmera. Essa estava funcionando, e não mostrou a passagem de Amarildo.
“Nenhum dos indiciados se recordava de que havia uma câmera que registraria a saída do Amarildo da escadaria”, conta a delegada.
Uma outra escuta comprovou, segundo a polícia, o depoimento de uma mulher que disse ter recebido suborno do major Edson Santos, para afirmar que Amarildo tinha sido morto por traficantes. O telefonema seria o acerto do pagamento.
Major Edson: Eu tô com o dinheiro aqui, já. Terça-feira de manhã, eu chego cedo e te dou aí.
Testemunha: Tá bom, meu filho.
Mas afinal: O que aconteceu com Amarildo?
“Ele fica dentro da sede, dentro do ambiente da UPP para que os policiais arranquem de Amarildo informações sobre o suposto paiol de armas e drogas. Há um forte indício de que Amarildo teria sido torturado no parque ecológico”, aponta o delegado Rivaldo Barbosa.
O parque fica ao lado da sede da UPP. “Todos nós queremos policiais pra nos proteger, não pra criar essa violência que está acontecendo de levar e tirar a vida”, desabafa a irmã do Amarildo.
De acordo com o inquérito, de março e julho deste ano, outras 22 pessoas foram torturadas por PMs na Rocinha, mas sobreviveram e fizeram denúncias. Amarildo não resistiu.
A história do ajudante de pedreiro levou dez PMs à prisão na sexta-feira (4). Eles serão julgados pelos crimes de tortura seguida de morte e ocultação de cadáver.
Antes de ser preso, o major Edson Santos desmarcou uma entrevista que daria ao Fantástico.
“Não esperava isso acontecer na minha família. Já é difícil a gente saber disso na família de outra pessoa, imagine na nossa, fica difícil pra gente. Difícil pros filhos, difícil pra esposa, difícil pros irmãos”, diz a irmã de Amarildo
Fonte: Fantástico
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Fonte: Youtube
A presidenta Dilma Rousseff sanciona nesta sexta-feira o Projeto de Lei Complementar 11/2013, que cria o Sistema Nacional de Prevenção e Combate à Tortura, com o objetivo de enfrentar o crime em delegacias e outros locais onde pessoas são detidas sob custódia do Poder Público. O sistema será formado por conselhos de comunidades, conselhos penitenciários estaduais, corregedorias e ouvidorias de polícia.
“Temos que admitir tristemente que a tortura não ficou restrita ao período da ditadura militar. Ela permanece ocorrendo como prática dentro das delegacias, dos presídios, das estruturas do Estado. O sistema é uma nova possibilidade de o Brasil ter um mecanismo real para chegar nas instituições e verificar, ter peritos com autonomia para dizer o que acontece com o corpo das pessoas, como ele está marcado pela tortura, ou as próprias condições em que as pessoas vivem”, avaliou a ministra da Secretaria de Direitos Humanos, Maria do Rosário.
Além do Sistema Nacional, a lei prevê a criação do Comitê Nacional de Prevenção e Combate à Tortura, que, segundo Maria do Rosário, será composto por organizações da sociedade civil que lutam contra a tortura.
Além disso, um grupo de peritos federais poderá atuar em penitenciárias, presídios, instituições de longa permanência de idosos, abrigos de crianças e adolescentes, entre outras, para verificar eventuais situações de tortura. “Eles visitarão estes lugares, identificando as situações de tortura e buscando que sejam responsabilizados os agentes da tortura no Brasil”, acrescentou a ministra.
A ministra da Secretaria de Direitos Humanos, Maria do Rosário, apontou a Polícia Militar do Rio de Janeiro como principal suspeita no caso do desaparecimento do pedreiro Amarildo Souza, morador da favela Rocinha que sumiu em 14 de julho, após ter sido levado para uma averiguação por policiais militares da Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) da comunidade. Na avaliação da ministra, as autoridades policiais têm responsabilidade sobre o desaparecimento.
“A primeira suspeição que todos nós devemos ter é de responsabilidade pública também nesse desaparecimento”, afirmou a ministra.
“O inquérito sobre o desaparecimento deve ser feito com a hipótese clara, concreta de que seja uma responsabilidade dos agentes públicos, do abuso de autoridade, da violência policial”, disse em outro momento.
A ministra, no entanto, não condenou as instalações das UPPs nas comunidades para o enfrentamento ao tráfico de drogas. “Não podemos jogar fora as experiências que nós temos tido de pacificação, mas agora devemos ler essa situação como aquela condição em que as comunidades precisam estar livres das ações do tráfico e do crime e poderem confiar plenamente na sua política”, avaliou a ministra.
Fonte: Yahoo
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Fonte: Youtube
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