Por Oliveira Fidelis Filho
Para Sigmund Freud, considerado o pai da Psicanálise, existem dois motivos que impulsionam o ser humano na busca da felicidade. A primeira delas visa evitar a dor e o desprazer, a segunda é experimentar fortes sensações de prazer.
Quanto ao casamento, fica cada vez mais claro que além de não oferecer proteção contra o desprazer, causa inúmeras frustrações, ressentimentos e neuroses e gera cada vez menos ingredientes de “fortes sensações de prazer.
Para nós, formatados herdeiros da cultura judaico-cristã que ainda vêem no sofrimento uma virtude, um sacrifício necessário para a expiação, viver prazerosamente não é assim tão importante. Afinal, para o cristianismo, sofrer é preciso. Será?
O fato é que somos “forçados” a nos submeter a padrões sociais estabelecidos e sacramentados, que geram e cristalizam crenças e valores com o poder de nos fazer prisioneiros de “zonas de conforto” cada vez mais insatisfatórias.
Para muitos é mais fácil viver amaldiçoando o “cativeiro” do que exercitar liberdade responsável. É mais cômodo assumir o papel de vítima do que reescrever o roteiro da própria história. Assim, a grande maioria prefere permanecer fiel a falidos padrões, mesmo que isso signifique um insano prolongamento de sofrimento, a escolher enfrentar os conflitos oriundos de uma construção existencial, alternativa, desvinculada e autônoma.
De todas as espécies, a humana é provavelmente uma das que mais facilmente se deixa domar além de se autodomesticar. Lembro,
quando criança, de meu pai dizendo: “se o cavalo soubesse da força que tem não se deixaria domar”. O problema é que a espécie humana também desconhece sua força, seu direito a liberdade, autonomia, pois com facilidade submete-se aos mais variados condicionamentos.
Não obstante os recorrentes argumentos sociais e religiosos objetivando glorificar e perpetuar o “sagrado matrimônio”, nos moldes tradicionalmente aceitos, o fato é que, segundo dados do Censo Demográfico de 2010, há cada vez menos gente dividindo o mesmo teto. São mais 6,9 milhões de
“famílias uni pessoais”, como diz o jargão do IBGE. Em números absolutos, São Paulo é o estado com maior número de pessoas nessa condição e Santa Catarina é o estado com maior percentual de mulheres morando sozinhas. Nos últimos 20 anos, triplicou o número de brasileiros que vivem sem companhia. A família tradicional, com pai, mãe e filhos, está cada vez mais rara no Brasil. A estimativa é que até 2016 chegue a 12 milhões de indivíduos morando sozinhos.
É obvio que tal tendência resulta da conjunção de vários fatores; entretanto, diante das transformações, oportunidades e desafios da sociedade atual, a vida a dois, numa relação estável, torna-se cada vez mais difícil de ser suportada. Até bem pouco tempo, quem não se casasse estava predestinado a uma vida infeliz, além de tornar-se alvo de discriminação que atingia homens e mulheres. No caso das mulheres, a situação era ainda mais grave, pois lhes faltava possibilidade de auto-sustentação. Para a mulher, não casar e não ter filhos era, ainda, sinal de maldição. Em uma sociedade onde a maioria das pessoas permanecia casada por toda a vida, estes “desajustados” desgarrados eram vistos, em vários sentidos, como uma ameaça aos casais.
Atualmente, os que vivem sozinhos gozam de respeito social e são até alvos de inveja da maioria dos casados que, por temerem novas formas de viver, suportam o casamento que lhes restringe a liberdade e lhes impõe incontáveis sacrifícios. Não há dúvida, de que a qualidade de vida das
pessoas solteiras atualmente é bem melhor do que a que observamos na maioria dos casados.
O casamento continua sendo um jogo de interesses, uma insana busca de suprimento de carências pessoais. Transfere-se para o
parceiro a responsabilidade de ser feliz em si mesmo. Busca-se o casamento, a união estável, crendo que as carências de aconchego, de segurança, de
felicidade ou garantia contra a solidão podem ou devem ser supridas pelo outro. O que o casamento proporciona hoje, com raríssimas exceções, é um modo de vida repressivo e insatisfatório. Não são poucos – homens e mulheres – a experienciar a mais amarga solidão: aquela que se tem na companhia de alguém.
Há muito que o casamento deixou de significar um vínculo divino, uma aliança entre duas famílias ou uma união econômica, situações que durante muito tempo justificaram sua existência. Longe de se tornar uma fonte de abastecimento espiritual, emocional, mental e relacional transformou-se em um deposito de frustrações, disputa, ódio, agressividade, desrespeito, ressentimentos e mágoa.
Admitamos ou não, a família tem se tornado cada vez menos necessária para a sobrevivência da espécie. No casamento e na família vivemos
sob a força de necessidades, crenças e valores que, na prática, não mais existem. Há muito deixamos de ser uma sociedade rural e agrícola na qual seu modelo e valores faziam sentido e eram realmente relevantes. Hoje a realidade é urbana. A necessidade de segurança buscada nos clãs e nas famílias numerosas há muito deixou de existir.
Quanto aos filhos, as cidades não constituem ambientes saudáveis para a criação de filhos e nem deles os casais precisam, pois longe de trazer benefícios – como na realidade rural – trazem ansiedade, preocupação, gastos e muito aborrecimentos. Investe-se pesado na criação dos filhos para entregá-los prontos para o mercado do trabalho, sem qualquer esperança de retorno para os respectivos pais. Nem mesmo a garantia de serem dignamente cuidados pelos filhos na velhice existe.
O casamento, a união estável, pode ser uma grande aventura sim para quem já aprendeu a se aventurar sozinho. Para quem possui auto-estima elevada, para quem desenvolveu e preencheu sua individualidade na individuação. Para quem sabe que a realização, a felicidade é algo que trazemos dentro de nós e que jamais deve ser buscada em alguém fora de nós. O casamento pode ser interessante se aprendermos a dialogar com nossos sentimentos e pensamentos a ponto de desenvolver um conhecimento profundo de nós mesmos, o que nos leva a compreender o parceiro(a).
Um casamento, uma união estável, uma vida em comum para ser satisfatória precisa ser buscada por prazer e não por necessidade. Os direitos de cada pessoa precisam estar garantidos: direito de independência financeira, de locomoção, de querer ficar só, direito de opinião, de ter outros anseios sexuais, de cultivar amigos em separado, direito de falar de si e direito de se calar.
O casamento é necessário? Se você não tem necessidade, não se sente carente, sente-se completo e feliz em si mesmo, pode ser até uma boa idéia…
Fonte: Site Vidanova
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